quinta-feira, 31 de março de 2016

Anúncio 22

Uma nova ideia está no forno. Teaser em breve.
O quê...?
Só isso? Isso é tudo o que eu tenho a falar...?
Hmm...
É, acho que sim.
...
Ah!
Próximo capítulo do The Godsbane vai fechar o, digamos, arco de acontecimentos. Sim, deixei um grande cliffhanger no final. Não me desculparei por isso. Muahahahahaha!
Ok, parei.
Fim do anúncio.
Até mais!

domingo, 27 de março de 2016

The Godsbane, Capítulo 11

Capítulo 11


Em meio ao caos, Elise parecia incapaz de ouvir qualquer coisa. Sua audição estava normal, porém, a sua concentração não estava. Sua mente parecia ter sido quebrada com as palavras do Ancião.
Após tanto esforço, ela morreria? A sacerdotisa gostaria de se livrar daqueles que a seguravam. Com um brado imponente ela desafiaria Ishmael. Mesmo se fosse morrer, daria o seu melhor na luta. Era melhor do que ser executada como uma pessoa qualquer, como alguém que tivesse fugido da luta.
Porém, Elise não tinha mais forças.
Vozes confusas soavam a sua volta. Arcanos estavam amedrontados. Seus amigos tentavam chegar ao seu socorro sem sucesso. Valentina era arrastada para longe dali. Então, passos pesados soaram a sua frente.
Elise voltou seu olhar para o homem. Ele era alto, usava vestes cinzentas e tinha um machado gigantesco feito de ferro negro em mãos. O capuz escondia o rosto quase por completo, fazendo-o parecer um assassino, não um mago. Pelo barulho dos passos, o sujeito trajava uma armadura por debaixo dos tecidos negros. A princípio, pensou que não se tratasse de um Arcano. Porém, logo entendeu.
Não me parece muito com um Sábio... Elise caçoou.
Ela se referia aos Arcanos pertencentes a uma casta que poucos tinham estima. Trajando túnicas cinzentas, aqueles magos megalomaníacos se isolavam do resto do templo. Considerando-se superiores em relação aos demais sacerdotes, os Sábios não eram mais o mesmo de antigamente. Agora, eram tão poderosos quanto sádicos. Sua adoração ao oculto beirava ao uso das magias negras. Seus experimentos eram do conhecimento de poucos, sendo aprovados completamente pelo Ancião que garantia que suas ações eram benéficas para o templo.
Como eram pouco vistos, Elise demorou a entender que os homens que haviam surgido no salão eram os tais Sábios. Os Arcanos que a seguravam também usavam as mesmas vestes cinzentas. Ela não demoraria a descobrir que eles passavam de servos de Ishmael, cães sedentos de sangue e sem apreço a vida humana.
Somos capazes de muito mais do que simples experimentos. O Sábio com o machado afirmou, brandindo a arma com firmeza. Somos muito mais fortes que vocês, capazes de lutar tão bem corpo-a-corpo quanto um guerreiro. Infelizmente, você não vivera para nos ver lutar. Ele riu. É uma pena.
O Arcano andou até a esquerda de Elise. Os outros Sábios a forçaram contra o chão, deixando sua nuca exposta. Ela respirou fundo.
A lâmina fria do machado de aproximou lentamente de sua nuca. Elise tremeu. Um calafrio percorreu toda a sua espinha. Sua respiração se tornou mais acelerada. Seu coração palpitava mais rápido. Ela fechou os olhos. A gigantesca arma foi levantada. O executor tinha calma. O tempo parecia não passar. Com ambas as mãos na arma, o Arcano sorriu por debaixo da máscara. Ishmael observava pacientemente, apreciando o momento.
Adeus. Disse o Sábio sem emoção alguma.
Um movimento rápido. Um som distinto. Lentamente, sangue veio ao chão. Uma morte confirmada diante dos olhos de todos.
O gigantesco machado atingiu o solo, causando um estrondo. Em seguida, o corpo do Sábio caiu. Um buraco estava em seu peito, bem em seu coração.
O olhar de todos se voltou para a arma do Sandrealmer. Um fino fio de fumaça saia da ponta de sua pistola. Uma expressão séria estava em seu rosto enquanto ele mudava seu alvo, apontando agora para Ishmael em seu trono.
Você é o próximo. Disse Viktor rispidamente.
Nenhuma voz podia ser ouvida no instante seguinte. Todos pareciam atordoados com o som do disparo seguido da ameaça lançada pelo Sandrealmer. Por um instante, o tempo parecia haver parado. Então, a gargalhada maníaca do Ancião quebrou o silêncio.
Você tem coragem... Ishmael admitiu com um sorriso no rosto. Mas não há nada que vocês possam fazer contra um exército. Seu olhar julgou cautelosamente o trio composto por Viktor, Lumia e Dreadraven. Um Sandrealmer... Mais uma sacerdotisa traidora... Seus lábios pareceram se retorcer após a última afirmação. E... Ele pareceu surpreso. Seus olhos se arregalaram enquanto o velho se inclinava para frente. Ora, ora... O que temos aqui...?
Dreadraven não hesitou. Viktor e Lumia não puderam o impedir. Suas vozes nem mesmo pareciam capazes de saírem de suas gargantas. Com um passo a frente e um olhar compenetrado para o rosto do oponente, o doutor desafiou o Ancião.
Hm... Os olhos de Ishmael se cerraram. Ele parecia farejar o ar. Seu nariz apontava na direção de Dreadraven. Esse cheiro... Essa essência... Seus olhos se abriram. Essas trevas... Ele disse pausadamente. Que criatura vil... Será mesmo humano...?
Eu poderia lhe perguntar o mesmo. Dreadraven retrucou.
O Ancião sorriu. Aquela situação era divertida para ele. Afinal, o caos era iminente.
Você está prestes a começar um banho de sangue... Ele disse quase não contendo a emoção.
Fico triste em saber que isso te agrada. Dreadraven disse com firmeza. Então... Tão rápido quanto um relâmpago atravessando os céus, um sabre embainhado surgiu nas mãos do doutor que assumiu uma postura de combate. Vou fazer com que você nunca mais possa sorrir.
Ótimo... O Ancião se levantou prontamente de seu trono e abriu os braços para o inimigo, pronto para recebê-lo. Venha! Mostre-me o seu pior, ser maldito!
Então, Dreadraven desapareceu. Sua forma se extinguiu em sombras. Era como se seu corpo fosse feito de fumaça e, de repente, um vendaval tivesse o soprado para longe.
Não havia uma pessoa que não estivesse surpresa naquele salão. Porém, todos ficaram ainda mais espantados quando o doutor ressurgiu.
Tão rápido quanto quando desapareceu, Dreadraven surgiu. Elise pôde ver claramente o amigo bem diante de seus olhos. Sua lâmina decapitou um dos Sábios que a seguravam contra o chão. Enquanto a cabeça encapuzada rolava pelo chão, o doutor preparou seu segundo ataque. Não houve como o Arcano aturdido reagir. Antes que suas mãos pudessem se levantar, a ponta do sabre de seu inimigo havia atingindo seu pescoço, transpassando sua garganta e sua nuca.
Consegue andar? Ele perguntou para Elise.
A sacerdotisa estava em um estado de torpor. Seu aliado havia acabado de salvar a sua vida como se não fosse nada. Era muito mais poderoso do que ela havia previsto. Uma ameaça considerável se não estivessem do mesmo lado.
Hm... Elise limpou a garganta. Sim... Respondeu com certo atraso. Consigo...
Ótimo. Então vá até os outros. Agora.
Ela assentiu. A sacerdotisa sabia que Dreadraven não teve a intenção se soar tão seco, porém, ele não pôde evitar em uma situação como aquela. Certamente o doutor não tinha mais paciência e, se não se apressasse, ficaria com a guarda baixa contra Ishmael e seus seguidores.
Aos tropeços, Elise seguiu até seus aliados. Os Arcanos em seu caminho pareciam desviar da sacerdotisa, quase com medo de tocá-la. 
Um mau pressentimento, entretanto, assombrava a jovem maga. Elise tinha a impressão que não chegaria até Viktor e Lumia. Isso, porém, não a impediu de seguir em frente.
Lentamente, palmas lentas soaram pelo local. Elas vinham de um único homem.
Nada mal... Admitiu o Ancião.
Mais uma vez, Ishmael gargalhou. Uma risada pertencente a um homem louco, sádico, sedento por sangue. Um riso que teria demorado muito mais se não tivesse sido interrompido.
Um grito de dor ecoou pelo salão. O olhar de todos se voltou, então, para um Sábio que caia de joelhos no chão. Do abdômen aberto do homem, sangue começou a escorrer. Após um segundo, ele havia caído já quase sem vida.
Parece que eu tenho a atenção de todos... Murmurou a Lady Lockhart. A cristalina espada azul em suas mãos agora estava manchada de vermelho. Então, tenho algumas coisas que eu gostaria de dizer...
Ela ofegava. Estava cansada após o duelo com Elise, é claro. Porém, um momento de distração de seu captor foi tudo o que Valentina precisava. O momento era o mais propício imaginável naquela situação. Livre, agora, a Arcana sabia o que tinha que fazer.
Ishamael! Valentina bradou. Era como se suas energias houvessem voltado por alguns instantes. Eu não esperava que as coisas fossem chegar a esse ponto, mas as suas tendências nefastas nos fizeram chegar aqui. Aqui e agora, num dos lugares que deveriam ser os mais sagrados de Windlands, num templo onde a paz deveria ser semeada e, a justiça, seguida com rigor... Um banho de sangue vai, de fato, acontecer. Ela respirou fundo e, então, deu um passo a frente. Seus olhos não mais se concentravam na figura do Ancião. Quem não quiser se envolver mais com isso, fuja. Agora, nesse exato momento. Eu não os julgarei. Muito menos permitirei que outros os julguem. Porém... Para os que ficarem aqui, vocês serão divididos em dois grupos... Haverão aqueles que ficarão ao lado de Ishmael, seja por apoiá-lo ou por temê-lo... E haverão aqueles que ficaram contra ele, do lado da chamada traidora, do lado dos forasteiros... Que também é o meu lado.
Uma agitação começou no salão. O que começaram com murmúrios logo se tornou um caos de vozes, um debate acalorado entre aliados que estavam prestes a matar uns aos outros.
Enfim... A voz de Ishmael soou alta, silenciando as demais. Valentina... Seu olhar se voltou para o da mageknight.  Você finalmente arrumou coragem para me desafiar... Já era hora. Ele sorriu. Faremos como você deseja... Nos dividiremos em dois lados e nos digladiaremos, tingindo todo esse salão de vermelho!
A mensagem foi entendida por todos. Rapidamente, os Arcanos foram se dividindo.
Alguns saíram às pressas do salão. Esses poucos não foram impedidos.
O restante se dividiu em dois grupos. Ao norte do salão, estava o Ancião e aqueles que o seguiam. Ao sul, Valentina mantinha seus olhos fixos no adversário enquanto seus aliados seguiam para trás dela.
Elise! Exclamou Lumia.
Após um abraço apertado, as amigas conseguiram respirar aliviadas. Era a calmaria antes da tempestade, porém, elas não desperdiçariam um momento de paz, não importava o quão breve fosse.
Você tem que sair. Disse Lumia. Ela estava tão agitada quanto estava preocupada com a amiga. Agora... Antes que o Ancião perca a paciência e...
Eu vou lutar. Elise afirmou determinada.
O quê...? Mas... Você tem que se recuperar...
Eu não posso abandonar vocês agora. E tenho um pouco de energia de sobra, igual a Valentina... Além do mais, não posso fugir. Isso é tudo culpa minha, não é mesmo?
Não... É claro que...
É verdade... Concordou Viktor, interrompendo a aliada. Você, minha cara Elise, foi o estopim de uma revolução... Nada mal...
Ele sorriu para Elise que, imediatamente, retribuiu o gesto.
Aliás, boa luta agora pouco. Ele elogiou. Ainda sobraram alguns raios?
Acho que sim. A sacerdotisa suspirou. Vamos ver na hora.
Elise... Murmurou Lumia.
As amigas se entreolharam. Lumia fitava a miga com olhos trites, preocupados. É claro que Elise não poderia usar todo o seu potencial. Não era certo que fosse sobreviver à luta. Porém, a sacerdotisa tinha que tentar. Se ela havia começado aquela revolução, ela também a terminaria.
Não se preocupe. A determinação de Elise estava expressa em seu olhar. Tudo vai dar certo no final.
A sacerdotisa não havia dito nenhum argumento forte, entretanto, a maneira que ela disse serviu para acalmar Lumia, mesmo que só um pouco.
Bem... O Sandrealmer esboçou um sorriso. Acho que não podemos mais fugir agora... Disse ele enquanto recarregava sua arma. É uma pena.
De repente, veio o silêncio quase absoluto.
A cena parecia haver se congelado. Lumia, Elise e Viktor estavam no meio de um mar de Arcanos. A frente deles, Valentina e Dreadraven murmuravam algo um para o outro. Com as armas sacadas, eles analisavam as forças inimigas. A maioria dos Arcanos comuns estava do lado deles. Porém, como era de se esperar, todos os Sábios estavam ao lado de Ishmael. Eles tinham a vantagem numérica, mas seria o suficiente para prevalecer sobre a força combinada dos adversários?
Eu mal posso acreditar que você realmente deixou que alguns fugissem... Admitiu Valentina. Seu olhar estava vidrado no adversário.
Não veja como um ato de misericórdia. O Ancião retrucou. Os que fugiram eram os que mais tinham medo. Esse medo será espalhado a partir deles para os outros. Quanto mais medo sentirem, mais cegamente me obedecerão...
Você me enoja...
Ishmael não disse mais nenhuma palavra. Com uma rapidez assombrosa, invocou e arremessou uma bola de fogo contra um Arcano adversário. Seu alvo não era ninguém em especial, apenas um mago amedrontado que parecia desatento. As chamas brancas queimaram sua pele enquanto ele dava seus últimos gritos. As pessoas ao entorno dele se assustaram. Sabiam, também, que não podiam ajudar contra um feitiço do Ancião. Ninguém era forte o suficiente.
Em pouco mais do que cinco segundos, o mago havia sido carbonizado. As chamas haviam devorado sua carne e suas roupas sem dificuldade, deixando apenas seu esqueleto frágil e enegrecido para trás.
E agora...? Ishmael sorriu. Sente ainda mais nojo?
A resposta da Lady Lockhart veio com um brado. Era como o som de uma corneta anunciando o início da guerra.
Valentina queria avançar com toda a sua força contra Ishmael. Superar seus feitiços, mostrar que era, agora, a Arcana mais poderosa. Queria humilhar o oponente, fazer com que ele sentisse medo, que se arrependesse de tudo o que houvesse feito antes de ceifar sua vida. Entretanto, não seria tão fácil. Um batalhão de magos estava no meio do caminho. Cansada do jeito que estava, ela teria que esperar aquele muro ruir, derrubando tijolo por tijolo junto de seus aliados.
Entretanto, alguém não teria que esperar a barreira humana vir abaixo.
O tempo pareceu passar lentamente. Valentina viu o rastro fino de sombras serpenteando pelo ar. Antes mesmo que ela pudesse lançar um raio ou, então, atacar um inimigo com sua espada, Dreadraven havia chego até o Ancião.
Seu sabre negro desferiu um ataque capaz de vencer qualquer duelo de esgrimistas: rápido o suficiente para evitar uma reação de um ser humano normal. Porém, com aquele sorriso maníaco no rosto, era claro que Ishmael não era normal.
Uma barreira branca se formou em volta do Ancião. O domo de luz aguentou o impacto do golpe sem problemas.
Dreadraven não desistiria tão fácil. Rapidamente, ele se deslocava para diferentes pontos da barreira, desferindo ataques de todos os ângulos, com os pés firmes no solo ou mesmo em pleno ar. Porém, nada parecia adiantar.
Ishmael, que parecia se divertir a princípio, logo ficou entediado. Com um movimento de sua mão, seu domo de luz se desfez, explodindo e arremessando o doutor para o alto. Com a guarda baixa, Dreadraven nada pôde fazer contra o raio ofuscante que veio em seguida.
A corrente elétrica percorreu todo o seu corpo, da ponta dos dedos dos pés aos das mãos, fazendo-o convulsionar por um segundo, paralisando-o no instante seguinte.
Entretanto, ele não gritou. Era quase como se ele não tivesse sentido dor. O murmúrio irritado que ele emitiu por debaixo da máscara foi causado pela frustração: de não ter conseguido desviar do golpe e, principalmente, por ter subestimado Ishmael.
Caindo bem em frente a um Sábio, Dreadraven percebeu que deveria mudar a sua estratégia. Ele agachou, desviando do golpe da clava do inimigo, e contra-atacou com seu sabre, rasgando a garganta do Arcano. Talvez fosse melhor ele se unir aos outros, enfraquecendo as forças inimigas antes de derrotar o adversário mais poderoso. Ele apostaria na força de seus números.
No meio do caos, Valentina lutava com o que restava de suas energias. Variando entre magias de fogo, relâmpago e golpes de espada, ela derrubava seus inimigos um a um. Porém, era exatamente isso que a frustrava. Sob condições normais, ela estaria derrubando dois, três, talvez mais adversários por vez. Um único feitiço bastaria. A Lady Lockhart, com o suor escorrendo pelo rosto e seus passos ficando cada vez mais lentos, temia cometer algum erro estúpido do qual ela não poderia se redimir.
No meio de tantos raios e bolas de fogo colidindo, Viktor conseguia sobreviver. Qualquer adversário que fosse descuidado ao ponto de se aproximar demais dele estaria morto. Seus golpes de espada eram mais que o suficiente. Quando conseguia tempo, derrubava um Sábio com um único disparo bem dado e, então, corria para recarregar sua arma. Os cristais que havia conseguido com Gustav também eram bem úteis. Qualquer feitiço originado delas, de ventanias jatos concentrados de água, era bem mais poderoso dos que os dos Arcanos que enfrentava. Entretanto, tentava economizá-las. Afinal, o Sandrealmer ainda pretendia guardar algumas para mais tarde.
Lumia e Zephyr lutavam lado a lado como antes. Juntamente com os outros Arcanos, eles se digladiavam, lançando chamas e criando barreiras incansavelmente. De pouco em pouco, eles conseguiam diminuir o contingente inimigo.
Elise parecia observar a situação com o tempo em um estado de torpor, quase se arrependendo de ter permanecido no salão. Ela havia sido deixada para trás quando o caos começou. Sem conseguir correr após o brado de Valentina, a sacerdotisa parecia analisar o campo de batalha, procurando por algo que não estava ali.
Enquanto os dois exércitos iam se enfraquecendo, Elise percebeu a ausência de uma figura importante. Viktor, Dreadraven, Lumia e Valentina lutavam dando o seu melhor. Ishmael, porém, nada fazia. Foi então que ela percebeu.
O ser magro, alto e de túnica branca sorria. Seus olhos brilhavam como chamas intensas mesmo do outro lado do salão. Em suas mãos, raios pareciam se concentrar enquanto se moviam desordenadamente. Estes, porém, não eram brancos como os de um Arcano: vermelhos intensos como sangue eles brilhavam, magia negra sem dúvida.
Protejam-se! Elise berrou.
Foi tudo o que ela pôde fazer. Porém, não foi o suficiente. No meio do caos do campo de batalha, suas palavras não foram ouvidas.
A sacerdotisa ergueu uma barreira de luz à própria volta. Era o que ela podia fazer com a força que remanescente.
Então, uma tempestade começou.
Um segundo depois ela já havia cessado. Porém, os danos já haviam sido causados.
Raios escarlates voaram pela sala. Tudo o que se movia havia sido acertado. Ishmael não poupou ninguém, nem mesmo seus subordinados.
Corpos haviam sido arremessados contra as paredes, quebrando pedras e ossos igualmente. Alguns Arcanos tinham o corpo em chamas, começando a espalhar o cheiro de carniça queimada pelo ar. No chão, era difícil saber quem estava inconsciente ou simplesmente morto.
Com sua barreira destruída, Elise caiu de joelhos. Seu corpo estava ileso, porém, o mesmo não podia ser dito sobre seu espírito. Suas esperanças haviam acabado de ser despedaçadas. Queria poder fugir dali. Queria estar junto de Lily e de seus amigos de novo. Queria poder respirar aliviada e sorrir.
A risada maníaca de Ishmael soou, trazendo Elise de volta a realidade. Seus olhos encontraram os do Ancião.
Acabou. Ele anunciou.
Andando lentamente por entre um mar de corpos, Ishmael gargalhava.
Foi interessante. O Arcano continuou a falar. Eu me perguntava se eu teria força para isso... Acabar com a vida todos se fosse preciso... Ou se eu simplesmente achasse que valeria a pena. Ele abriu um largo sorriso e parou de andar, ficando a pouco mais de um metro da sacerdotisa. Obrigado por isso, traidora...
Elise não conseguiu dizer mais nada. Não esboçou nenhuma reação. Afinal, o que poderia fazer? Não tinha mais forças para nada. Mesmo que tivesse, nunca poderia enfrentar Ishmael de igual para igual. Agora, nem mesmo conseguia olhar o carrasco nos olhos e aceitar a morte com dignidade.
Não se preocupe. Disse o Ancião friamente. Logo mandarei sua amada para junto de você...
Nesse instante, Elise olhou para cima, bem nos olhos de Ishmael. Ele estava pura e simplesmente feliz, satisfeito com toda a situação, ansioso para poder fazer aquilo de novo.
Com as mãos envoltas por raios escarlates, o Ancião gargalhou uma última vez para Elise.
Adeus...

sexta-feira, 25 de março de 2016

Capítulo 50

Suffering
Sofrimento

Tristan derrubou sua espada e caiu de joelhos enquanto cobria os ouvidos. O guerreiro ficou desorientado pelo grito da deusa.
“Maldita! Eu...não consigo ouvir mais nada!”.
Após alguns segundos, Tristan conseguiu se levantar. A escuridão o envolvia novamente.
“O quê...?”.
Aos poucos, os sons de gemidos e sussurros voltaram. A voz da deusa ecoava pela caverna, apesar de não soar nitidamente.
“Isso...é uma espécie de jogo para ela...?”.
Tristan pegou sua espada de volta e respirou fundo.
Muito bem... O guerreiro das Trevas murmurou e apontou sua espada para a escuridão a sua frente. Vamos brincar.
Apesar de um pouco relutante, Tristan voltou a vagar pela escuridão da caverna. Os sussurros e gemidos, aos poucos, pareciam se transformar em risadas. Cada vez mais histérica a Deusa da Tristeza ria. O riso foi se tornando cada vez mais maníaco e perturbador. A atmosfera foi se tornando mais fria pouco a pouco.
“Isso...isso tudo faz parte do poder dela...? Mas como?”.
De repente, um flash de luz vermelho brilhou poucos metros a frente de Tristan. A intensidade fora bem mais fraca do que da última vez. As risadas cessaram em um único instante. Uma pequena câmara da caverna agora estava iluminada por uma luz vermelho-sangue. Sem hesitar, Tristan andou em frente. Sua aura escarlate pulsava e se misturava ao local. A Deusa da Tristeza não estava lá.
“Apareça...”.
Tristan estava, agora, no centro da câmara. Absolutamente nenhum som podia ser ouvido, a não ser a própria respiração do guerreiro.
Apareça... Tristan murmurou.
A respiração do guerreiro se tornou mais pesada. As paredes e o teto da câmara pareciam se aproximar gradualmente de Tristan.
Apareça. O guerreiro ordenou.
Uma risada soou atrás de Tristan.
“Atrás, hein?”.
O guerreiro das Trevas trincou os dentes e apertou firmemente o cabo da espada em sua mão. Em uma fração de segundos, Tristan se virou para trás e desferiu um corte horizontal. O golpe acertou o vazio. Os olhos de Tristan se arregalaram. Novamente, ele derrubou a espada e caiu de joelhos.
Não... O guerreiro das Trevas suspirou. Não...por favor...isso não...
A imagem da mãe de Tristan estava à frente dele. A figura tremeluzia, parecendo ser feita de fumaça. Os olhos da mulher eram buracos escuros como o da Deusa da Tristeza. Uma espada estava cravada na barriga dela. Sangue escorria da ferida. A expressão de dor estava estampada no rosto da mulher. Com dificuldade, ela estendeu a mão direita para Tristan.
Meu filho... A voz da mulher o chamou.
Sem hesitar, Tristan esticou a mão direita para a imagem da mãe. De repente, uma risada grave soou atrás dela. Em um instante, a imagem do Demônio que havia matado a mãe de Tristan se materializou atrás dela.
Mãe! O guerreiro gritou com todas as forças. Atrás de...!
Antes que Tristan pudesse terminar de falar, a mulher olhou para trás. Antes que ela pudesse reagir, o Demônio desferiu um ataque velozmente. Uma espada cortou o corpo da mulher na vertical. Exatamente como fumaça, a imagem da mulher se desfez.
Não! Tristan rugiu e socou o chão.
Novamente, você não pôde fazer nada para me impedir. O Demônio riu. Mais uma vez, você foi impotente.
Ao terminar de dizer essas palavras, a imagem do Demônio também se desfez. Entretanto, a risada grave dele continuou a ressoar pela caverna.
“Não...”.
Tristan segurou as lágrimas.
“Essa deusa...ela afunda suas vítimas na tristeza. Ela faz qualquer coisa para conseguir fazer isso. Sorrow me disse isso. Os meus piores medos e arrependimentos...os piores momentos da minha vida...”.
O guerreiro das Trevas se levantou e olhou para frente. Alguns pontos de luz cintilavam em meio à escuridão.
Alguém tão covarde assim nunca vai conseguir me derrubar. Tristan disse com a voz firme.
Como resposta, uma risada maníaca soou pela caverna.
“Ótimo...”.
Tristan trincou os dentes e seguiu em frente. Caminhando em direção aos pontos luminosos, sussurros começaram a soar mais alto em torno do guerreiro. Em poucos segundos, as vozes se tornaram nítidas.
Fraco... Uma voz feminina disse.
Imprestável... Uma voz masculina sussurrou.
Patético... Uma voz grave retumbou.
Mais vozes continuaram a insultar Tristan. Sem se importar, o guerreiro seguiu em frente. Entretanto, apesar de continuar caminhando em direção às luzes, Tristan não se aproximava delas.
“Droga...”.
Tristan parou de andar.
“Mais um truque barato...”.
As vozes começaram a ficar ainda mais altas. Aos poucos, elas se tornaram gritos perturbadores.
Parem! Tristan ordenou.
Antes que as vozes parassem por vontade própria, uma explosão de chamas negras surgiu vinda do guerreiro das Trevas. Com um coro de gritos estridentes, as vozes se silenciaram.
“Pronto...”.
De repente, um choro começou vindo juntamente de soluços.
“Mais o que agora...?”.
Venha... A voz da Deusa da Tristeza soou na orelha direita de Tristan.
Rapidamente, o guerreiro das Trevas se voltou na direção da voz. A risada da deusa soou vinda da mesma direção. Em um instante, um corredor surgiu iluminado por uma luz violeta. Tristan respirou fundo.
“Eu não desistir agora...”.
O guerreiro das Trevas entrou no corredor e seguiu em frente. De repente, um coro de choros e soluços começou. Ignorando os sons inquietantes, Tristan prosseguiu com passos firmes. Após alguns segundos, o guerreiro percebeu que uma fina camada de neblina estava se formando no chão.
“Da onde isso...?”.
Tristan olhou para frente. Graças a uma leve inclinação no terreno, o caminho a frente descia rumo ao desconhecido. A neblina e a escuridão eram as únicas coisas visíveis. Tristan bufou e seguiu em frente.
“Até quando isso...”.
Eu deveria...ter sido sincero com ela. Uma voz masculina disse em um tom melancólico. Mas agora...não há mais como.
O quê? Tristan parecia confuso.
“O que foi isso? Não...me pareceu como uma tentativa de me assustar...”.
Eu...nunca...quis...ser...uma...maga. Outra voz disse entre soluços. Mas...meus pais...nunca...me...ouviram.
“Isso são...os arrependimentos de outras pessoas...?”.
O meu filho...eu...eu... Uma voz grave disse tomada por emoção. Eu peço que você me desculpe. Eu não pude te proteger. Eu...sinto muito.
“Esses são...as vítimas da deusa...”.
Tristan apertou o passo. Mais vozes surgiam a cada segundo se lamentando por acontecimentos infelizes. O guerreiro não se importou. O lugar ficava mais frio à medida que ele avançava. A neblina já estava na altura de seus joelhos. Em poucos minutos, Tristan voltou à escuridão.
“Aquilo...terminou...”.
Tristan respirou aliviado. De repente, uma ventania gélida atingiu o guerreiro. Em um instante, a temperatura do local caiu bruscamente.
“Droga...”.
Tristan...meu filho. Uma voz masculina o chamou.
O guerreiro olhou para trás. Uma imagem de seu pai tremeluzia.
Filho... O homem sorriu. Você...
Não! Tristan rugiu. Você não vai fazer isso de novo comigo!
O guerreiro das Trevas correu em direção à escuridão, correndo da imagem.
“Não...essa deusa vai...”.
Por que está fugindo, filho? O homem perguntou.
A imagem do pai de Tristan estava agora bem à frente do guerreiro das Trevas.
Você vai me abandonar...de novo? A figura indagou.
Sem responder nada, Tristan correu através da imagem do pai. O homem se desfez no mesmo instante. Sem hesitar, Tristan continuou correndo. O ar se tornava mais frio. A névoa já estava na altura de sua cintura. Os lamentos pareciam estar aumentando incessantemente.
Você só quer fugir de tudo, não é? Uma voz masculina familiar surgiu à esquerda de Tristan.
Era uma versão do Duque Wallace feito de fumaça. Uma aura luminosa envolvia o corpo do governante, iluminando a sua volta. O Duque corria na mesma velocidade de Tristan.
Você já fez isso uma vez. O Duque disse rispidamente. Tenho certeza que poderia fazer de novo.
Tristan trincou os dentes. Sem parar de correr, o guerreiro das Trevas cortou Wallace ao meio com sua espada. A figura do Duque se desfez em um único segundo. Tristan correu ainda mais rápido em meio a escuridão. As vozes ainda o atormentavam. O frio ainda o incomodava. A neblina já estava na altura de seus ombros. O caminho não parecia ter fim.
“Eu...já não estou mais aguentando...”.
Tristan? Desta fez, uma voz feminina familiar o chamou.
De repente, a névoa desapareceu. Tristan se viu em uma nova câmara. Uma luz amarela iluminava o local. O frio havia passado. Tristan conseguia respirar mais facilmente agora.
Tristan? A voz chamou novamente. Meu amor...é você?
“Não pode ser...”.
Tristan se voltou lentamente para trás. Isolde estava bem a sua frente agora.
“Você...não...”.
A imagem de Isolde, diferentemente das outras, não tremeluzia. A antiga amada de Tristan parecia sólida e viva.
Eu não acredito... Lágrimas começaram a escorrer do rosto de Isolde. É você mesmo?
Eu...eu... Tristan balbuciou. Isolde...eu...
Isolde correu até Tristan e, antes que ele pudesse reagir, ela o abraçou.
“Isolde...”
Tristan abraçou de volta a mulher.
“Algo dentro de mim não quer acreditar, mas...essa é Isolde. O rosto, os cabelos, o aroma, o calor...”
Tristan fechou os olhos.
Isolde... O guerreiro sussurrou no ouvido dela. Eu nunca vou me separar de você de novo...
Tristan... Ela suspirou. Meu amor...abra os seus olhos.
O guerreiro sorriu. Sem questionar, Tristan obedeceu. Em uma fração de segundos, seu sorriso desapareceu. Ele estava de volta nas ruínas da cidade de White Plains. O corpo morto de Isolde jazia a sua frente.
“Isso...foi...de uma covardia sem igual...”.
Lágrimas brotaram dos cantos dos olhos de Tristan. O guerreiro caiu de joelhos e olhou para os céus.
Eu não agüento mais... Tristan murmurou.
O ar tornou-se mais frio. Risadas maníacas surgiram de todos os cantos.
É o fim... O guerreiro bufou.
Com um movimento rápido, Tristan se levantou, virou-se para trás e desferiu um ataque horizontal com sua espada. O golpe atingiu a barriga da Deusa da Tristeza. Ela olhou para Tristan com medo estampado no rosto.
Como... A deusa disse com a voz fraca. Como você...?
Você não é só fraca, deusa. Tristan disse com a voz fria que não usava há muito tempo. Você também é uma covarde. Você não só se afundou nas próprias mágoas, mas como levou outros a esse mesmo fim. Você não só desistiu de viver, como você também arruinou a vida de inocentes. Você é simplesmente patética. Você é asquerosa. Se você não dá valor à vida, eu não me importo, desde que você não prejudique os outros. Eu garantirei que você não arraste mais ninguém com você, por que eu darei um fim a sua existência patética.
Em uma fração de segundos, Tristan cravou sua espada na clavícula da deusa. No mesmo instante, a paisagem mudou. Eles estavam de volta à caverna. Tristan respirou aliviado e tirou a lâmina do corpo da deusa. O guerreiro das Trevas olhou para o corpo da adversária no chão. O rosto dela havia mudado.
“Justo quando eu achava que ela não podia ser mais patética...”.
O rosto da deusa estava inchado. Sua pele era pálida e estava completamente enrugada. As dezenas de cicatrizes persistiam. Havia dúzias de sardas em suas bochechas. O nariz parecia quase afundado no rosto. As orelhas eram largas. O cabelo castanho era longo e sem brilho, completamente desgrenhado.
“Com uma aparência tão triste, não me admira o seu comportamento...”.
Tristan deu de costas para o cadáver da deusa que jazia na poça de seu próprio sangue. Ele caminhou calmamente para fora da caverna que, agora, tinha poucos metros de extensão.
“Foram como várias Ilusões...”.
O guerreiro invocou sua poção e a tomou sem pressa.
“Foi tudo falso, mas, mesmo assim...foi muito problemático”.
Tristan respirou aliviado e sorriu quando viu uma silhueta familiar se aproximando.
Sorrow. O guerreiro das Trevas o chamou.
Após dar mais alguns passos, o homem caiu.

Sorrow! 

domingo, 20 de março de 2016

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Então, gente...
Sobre o The Godsbane, esbocei um mapa de Darkland, que vai ser o segundo continente principal na trama. Não, nada muito bem feito, mas já me ajuda a ter umas ideias mais bem organizadas pra história.
Quanto ao resto, sobre outros projetos.., Aí as dúvidas aparecem.
Eu queria muito escrever algo de terror, mas não tenho ideias muito concretas ainda, então acho que isso vai ficar meio de lado. Por ora.
As outras duas ideias, muito mais viáveis no momento, são infanto-juvenis. Uma mais fantasiosa e outra mais distópica (ambos temas que parecem fazer bastante sucesso atualmente, principalmente o segundo). Faltam uns vários detalhes, mas com a base, já posso escrever uns rascunhos. Só não sei por qual começar...
Quem quiser opinar, não se acanhe.
Por hoje, é só.

quinta-feira, 17 de março de 2016

Anúncio 20

Então, é...
O capítulo 11 do The Godsbane ta demorando pra sair. Já sabia que iria demorar, mas nem tanto. Não pretendo ficar dando desculpas ou  ficar fazendo previsões de quando eu vou  ter tempo para escrever. Logo, achei melhor fazer uma espécie de prévia, falar rapidamente sobre o que está por vir, sabe?
Pois bem. Já adianto que devo fazer uma pequena pausa depois desse próximo capítulo do The Godsbane. Vou tentar focar o meu raro tempo de escrita para outros projetos. Projetos pequenos. Projetos grandes. Projetos novos. Projetos paralelos. Projetos velhos. Quem sabe? O futuro é incerto, ainda mais com a minha organização.
Centenas de ideias parecem chegar até mim. Muitas vêm e vão, algumas ficam, outras se juntam, misturam-se sem forma e correm sem rumo aparente. Incrivelmente, essas últimas parecem ser as que dão mais certo.
Ainda não falei muito sobre o que estar por vir, não é? É.
Quanto aos "projetos paralelos", bem... Quem está lendo The Godsbane deve saber que o mundo não se limita a um único continente, não é? Um outro já foi citado. Outros dois, ainda não. Sim. Outros dois. Dois. Vão ser quatro ao todo. É. Muita coisa. Muita coisa que eu vou tentar dar rumo quando possível.
Consegui atiçar a curiosidade de alguns? Espero que sim. Esse foi o objetivo desse post.
Até mais!

segunda-feira, 14 de março de 2016

Capítulo 49

Sorrow
Tristeza

No dia seguinte...
“Então...esse é o lugar...”.
Tristan chegou a um vilarejo que era atravessado por uma estrada de terra em meio a um conjunto de colinas. Nuvens escuras cobriam o céu fazendo com que o dia se assemelhasse à noite. As colinas verde-musgo pareciam não ter vida. As flores, outrora vivas e perfumadas, estavam agora estavam morrendo e se decompondo, fazendo com o aroma no ar fosse uma mistura de um leve perfume doce com um odor pútrido. Uma camada densa de névoa cobria as canelas de Tristan. O ar gélido do local deixava o ambiente ainda mais desconfortável. As casas do local estavam em um estado deplorável. A madeira das paredes estava envelhecida, quase se quebrando, cheias de rachaduras. Muitas já haviam sido abandonadas. Poucos sons eram ouvidos do vilarejo. Os moradores andavam cabisbaixos e praticamente não falavam. Apenas alguns murmúrios e sussurros eram emitidos pelas pessoas. Enquanto Tristan caminhava pela cidade, alguns moradores levantavam ligeiramente a cabeça e o fitavam. Por uma fração de segundos, o olhar de alguns deles brilhavam com uma faísca de esperança, antes de voltarem a se tornar vazios.
“Eu não esperava que a situação aqui estivesse tão crítica...”.
De repente, um homem que estava sentado em frente a uma casa abandonada se levantou e caminhou lentamente até Tristan.
Você... O homem disse com a voz fraca. Você veio nos ajudar?
A figura que estava parada a frente de Tristan era, no mínimo, peculiar. O homem trajava o peitoral, a bota esquerda e a manopla direita de uma armadura de ferro levemente enferrujada. Por baixo dela, ele vestia roupas simples feitas de algodão. A camisa de mangas compridas era branca. A calça, verde. Os sapatos de couro, pretos. O olhar no rosto do homem era de desespero. A pele era extremamente branca. O cabelo castanho estava era desgrenhado. Os olhos negros eram quase opacos. O rosto era fino, quase mal nutrido, cheio de cicatrizes. Os lábios estavam rachados e o nariz era levemente pontiagudo.
Eu tentarei, pelo menos. Tristan respondeu não muito animado.
Eu...lhe agradeço. O homem esboçou um sorriso. Eu...me chamo Sorrow. Eu sou o único guarda da cidade que sobreviveu o ataque da deusa.
E como você conseguiu?
Nem eu sei ao certo... Sorrow suspirou. Um dia, alguns dos moradores ouviram o som de uma mulher choramingando. Porém, nós não tínhamos certeza de onde vinha. O som desaparecia muito rapidamente... Ele respirou fundo. Entretanto, o problema foi se agravando. Com o passar dos dias, o choro se tornava mais alto e prolongado. Algumas pessoas ficaram assustadas, em especial, as crianças. O homem começou a caminhar vagarosamente em direção a uma parede de rochas cinzentas. Tristan o acompanhava na mesma velocidade. Naquela época...nós não tínhamos como saber. Alguns de nós ficaram um tanto quanto animados com esse problema. Esse vilarejo...era um lugar tranqüilo, mas cheio de vida. Nós vivíamos vidas simples como camponeses, cuidando de plantações, gado e, eventualmente, comércio. Nossa ligação com os ideais do Lorde Nidhogg sempre foram fracas. Nós apenas ajudávamos como podiam os mercenários e assassinos deles que precisavam de uma cama e uma refeição. Poucos de nós tinha contato com esse mundo de matança de vocês. Logo, algumas pessoas com espírito aventureiro ficaram realmente animadas com o mistério. Sorrow chegou à parede e encostou suas costas. Eu...fazia parte do grupo. Eu era um dos que queriam desvendar o mistério. Eu que convenci outras pessoas a me seguir. Eu que...levei metade dos guardas da cidade comigo. Eu...e mais alguns amigos... Ele respirou fundo. E, também, o meu irmão. Ele...era tão novo...tão... Lágrimas brotaram do canto dos olhos de Sorrow. Ele só tinha dez anos de vida. Ele...tinha tanto ainda para viver. As lágrimas agora escorriam pelo rosto do homem. Eu...deveria ter protegido ele. Eu era o irmão mais velho dele. Eu era um guarda da cidade. Eu era um guerreiro. Eu...eu...deveria ter protegido ele. Eu fui...um inútil E é isso o que sou agora. Um inútil. Apenas a sombra de um homem.
Eu...sinto muito. Tristan pousou sua mão esquerda no ombro direito de Sorrow. Eu sei como é perder alguém importante... A voz do guerreiro das Trevas era calma e tranquilizadora. Mas...eu preciso de toda a informação que você puder me fornecer sobre a Deusa da Tristeza. Por favor.
Você...não entende. Essa minha dor...ninguém pode entender. Esse lugar...tudo o que já aconteceu aqui... Sorrow enxugou as lágrimas do rosto com a mão esquerda. Tudo isso me assombra...mas, também me prende a esse lugar.
Como assim?
Eu disse. Você não tem como entender.
Você poderia tentar me explicar.
Eu não posso. Eu não consigo.
Você...recusa a minha ajuda, então?
Sorrow bufou e olhou para baixo. Após alguns segundos, ele olhou diretamente para os olhos de Tristan.
Eu não sei o que ela fez exatamente... Sorrow admitiu. Ela...entrou na nossa mente...invadiu o nosso corpo...corrompeu a nossa alma. Eu realmente não sei e nem quero saber. A única que sei é que o resultado foi...devastador...horrendo...torturante.
Você viu algo, então?
Sim...
O que você viu?
Sorrow respirou fundo.
Os meus maiores medos...os meus maiores arrependimentos...os piores momentos da minha vida. O homem murmurou. Tudo isso...em questão de segundos. Parecia uma eternidade, mas, quando sai do covil daquele monstro...o sol ainda estava no céu. Quando retornei ao vilarejo, disseram-me que haviam se passado apenas alguns poucos minutos. Ele cerrou os punhos. Mas...por mais abalado que eu fiquei com aquele instante de terror...bem, apenas digamos que aquilo não foi nada comparado ao que estava por vir.
Os outros... Disse Tristan. Os outros que estavam com você. O que aconteceu com eles?
Ah...foi exatamente esse o começo do meu desespero. Naquele momento, os pesadelos pararam de me assustar. O terror aconteceu bem ali na minha frente...e era real. Eu poderia ter morrido...como os outros.
Eles...acabaram se matando?
Sim...todos eles. Todos eles se suicidaram...bem na minha frente. Inclusive o meu irmão...
Eu...sinto muito.
Tente imaginar essa cena. Seus companheiros, amigos e até um membro de sua família...alguém que você amava profundamente...simplesmente sacando espadas, adagas e machados e se matando. O sangue jorrou pelas paredes da caverna. O chão ficou vermelho. Eles rasgaram as próprias gargantas com adagas...atravessaram os próprios peitos e barrigas com espadas...golpearam as próprias faces com machados...
A expressão no rosto de Tristan se retorceu.
Nem você, ser das Trevas consegue se manter frio diante de algo assim... Sorrow murmurou.
Não mesmo... Tristan concordou. Eu já havia lhe dito. Eu já perdi entes queridos.
É verdade. Ele coçou o queixo. Quem, exatamente?
Ah...já perdi vários amigos, mas...nada que se compare a dor de perder um pai, uma mãe e até uma mulher que eu jurava ser o amor da minha vida.
Entendo. Então...talvez você entenda a minha dor.
Eu creio que sim.
Mas...eu temo que eu sinto algo que você não sente.
O que seria?
Culpa.
Culpa...pela morte de seu irmão...e pelos outros que foram junto com você?
Sim...mas não só por causa deles.
Como assim?
Depois daquele dia...o choro da deusa se tornou ainda mais alto e assustador. Com o tempo...pareciam mais gritos de desespero. E...com o passar de mais alguns dias, eu tive certeza disso. Os gritos...começaram a enlouquecer os moradores. Muitos já estavam imersos em um mar de tristeza. Aqueles que morreram naquele dia...eram entes queridos de muitos dos moradores. Os meus pais...ficaram devastados com a perda do meu irmão. Ele respirou fundo. Infelizmente, os guardas restantes, juntamente com alguns dos moradores que queriam vingança pelos parentes e amigos mortos, resolveram voltar ao lugar. Dessa vez...não houve sobreviventes. Pelo menos, não creio que ninguém retornou para cá, pelo menos. Ninguém mais ousou entrar naquele lugar.
E foi nessa época que as forças das Trevas vieram para tentar resolver o problema?
Sim...mas foi tudo em vão. Contra essa deusa...números não têm força. Ela consegue atacar todos os que entram em sua caverna ao mesmo tempo. Ele trincou os dentes. Uma única pessoa. Uma única pessoa pode resolver esse problema, mas...ela tem que ser forte. Não só fisicamente, mas, também, mentalmente.
Eu darei o meu melhor então. Eu matarei a Deusa da Tristeza. Isso é uma promessa.
Sorrow esboçou um sorriso.
Eu sinceramente espero que você consiga. O homem estendeu a mão para Tristan.
O guerreiro das Trevas apertou a mão de Sorrow e sorriu.
Obrigado. Tristan agradeceu. Não só pelas informações, mas também pela confiança.
Ora...alguém neste lugar tem que ter esperança em alguma coisa. Sorrow olhou em volta com o olhar cheio de pesar. Você...sabe quanto tempo se passou desde que eu entrei naquela caverna?
Desculpe-me, eu não sei.
Então...tente adivinhar. Olhe para este lugar. Olhe para as pessoas. Olhe para mim. Pense em tudo o que eu te contei. Quanto tempo você acredita que se passou?
Ah...alguns anos...talvez cinco.
Sorrow conseguiu rir. A risada, apesar de fraca, animou um pouco o local.
“Ah...ótimo. Alguém conseguiu mostrar um sinal de felicidade neste lugar, mas...por quê?”.
Você deve estar intrigado pela minha reação, não é? Sorrow indagou.
Sim... Tristan respondeu. Eu...acredito que a minha resposta não estava correta.
Exatamente.
Bem...se forem mais de cinco anos, eu creio que Nidhogg ignorou este problema por tempo demais.
Na verdade, ele respondeu o nosso chamado rapidamente. Ele até te enviou sem muita delonga.
Ah...entendo. Então...quanto tempo se passou?
Um mês.
O quê!? Tristan indagou com um grito. O rosto do guerreiro das Trevas tinha uma expressão de tanto medo tanto surpresa estampada.
É exatamente o que você ouviu.
Não...não pode ser. Como?
Bem...com os gritos de desespero, tragédias vieram. Foi como...se o próprio lugar se tornasse triste...e incentivasse a tristeza.
Então...o próprio poder da deusa fez com que tudo ficasse desse jeito? O céu? Os animais? As flores? O próprio ar?
Sim. Sorrow suspirou. E, com isso, vieram os suicídios daqueles que nem foram para a caverna. O lugar em si se tornou uma atmosfera propícia para isso.
E vocês não conseguem sair daqui?
Não. É como se a própria energia e vontade de viver deixassem os nossos corpos. A única vontade que nos resta é...bem, de tirar as nossas próprias vidas.
Entendo. Bem, nesse caso, você é bem forte por resistir a essa vontade.
Ah...creio que sim. Eu e os outros sobreviventes...somos bem fortes, hein? Ele esboçou um sorriso. Então os outros foram fracos...
Eles foram induzidos a se matarem. A culpa é da Deusa da Tristeza.
Mesmo assim...eles foram fracos. Não há como negar. Eles não conseguiram buscar forças uns dos outros. Eles perderam a esperança. Sorrow suspirou. Eu sinceramente não sei como eu ainda estou de pé. Meu irmão se matou diante de meus olhos. Meu pai morreu na segunda expedição à caverna. Minha mãe se matou pela perda dos dois e, também, de outros.
Ah...eu...
Não precisa dizer nada. Eu sei que você não é frio. Você se sensibilizou com tudo o que aconteceu comigo e com este vilarejo. Eu sei disso. Ele respirou fundo. Você...
Antes que Sorrow pudesse continuar a falar, um som agudo se espalhou pelo local. Gritos violentos de uma mulher pareciam vir de todas as direções. Os moradores do vilarejo tampavam os ouvidos com as mãos, encolhiam-se sentados e tentavam não chorar.
“Droga...então, esse é o poder da Deusa da Tristeza...”.
Tristan agüentava os gritos ainda de pé sem tapar os ouvidos, apesar da expressão de angústia no rosto.
Vá! Sorrow gritou. Sua voz soava fraca em meio aos gritos da deusa. Mate a Deusa da Tristeza! O homem caiu de joelhos. Por favor! Ele apontou na direção de um pequeno morro. Lá! A caverna fica lá!
Tristan assentiu com a cabeça. Em um instante, ele se transformou em trevas e seguiu rapidamente até o local. Conforme o guerreiro se aproximava do local, os gritos se tornavam mais altos e perturbadores, beirando o insuportável.
“Maldição...!”.
Tristan aterrissou na entrada da caverna. Os gritos pararam. Nenhum som podia ser ouvido de nenhum lugar. Tristan olhou para a escuridão a sua frente. Ele respirou fundo e entrou no lugar com sua espada em punho.
“Espero que este lugar não seja muito grande...”.
O interior da caverna era úmido. Dezenas de fungos e insetos mortos estavam pelo chão e paredes do local. Os ecos de cada passo de Tristan ressoavam pela caverna. Após alguns segundos dentro do lugar, alguns chiados e gemidos começaram a podiam ser ouvidos.
“Espero estar me aproximando...”.
Tristan apertou o punho da espada com força. Os gemidos se tornaram mais altos. Sussurros perturbadores começaram.
Mais perto... Uma voz feminina chamou. Venha...mais perto...
Tristan trincou os dentes. Ele estava imerso na escuridão da caverna, mas podia enxergar perfeitamente. De repente, um flash de luz surgiu.
Droga! O guerreiro gritou.
De repente, uma pequena câmara ficou iluminada a frente de Tristan. As paredes e o chão eram azulados. Bem a frente do guerreiro, uma mulher olhava para o chão. Ela usava um vestido longo que parecia ser feito de remendos de trapos cinzentos. O cabelo longo e liso era tão escuro quanto o de Tristan. De repente, ela levantou a cabeça em um movimento brusco. O rosto da mulher era azulado e cheio de cicatrizes. Os olhos eram simplesmente buracos escuros no rosto de onde escorria sangue. O sorriso maníaco exibia dentes tortos e amarelados.

Que bom que você pôde vir. A Deusa da Tristeza disse antes de soltar mais um grito ensurdecedor.

quinta-feira, 10 de março de 2016

The Godsbane, Capítulo 11 (Teaser)

Capítulo 11


Em meio ao caos, Elise parecia incapaz de ouvir qualquer coisa. Sua audição estava normal, porém, a sua concentração não estava. Sua mente parecia ter sido quebrada com as palavras do Ancião.
Após tanto esforço, ela morreria? A sacerdotisa gostaria de se livrar daqueles que a seguravam. Com um brado imponente ela desafiaria Ishmael. Mesmo se fosse morrer, daria o seu melhor na luta. Era melhor do que ser executada como uma pessoa qualquer, como alguém que tivesse fugido da luta.
Porém, Elise não tinha mais forças.
Vozes confusas soavam a sua volta. Arcanos estavam amedrontados. Seus amigos tentavam chegar ao seu socorro sem sucesso. Valentina era arrastada para longe dali. Então, passos pesados soaram a sua frente.
Elise voltou seu olhar para o homem. Ele era alto, usava vestes cinzentas e tinha um machado gigantesco feito de ferro negro em mãos. O capuz escondia o rosto quase por completo, fazendo-o parecer um assassino, não um mago. Pelo barulho dos passos, o sujeito trajava uma armadura por debaixo dos tecidos negros. A princípio, pensou que não se tratasse de um Arcano. Porém, logo entendeu.
Não me parece muito com um Sábio... Elise caçoou.
Ela se referia aos Arcanos pertencentes a uma casta que poucos tinham estima. Trajando túnicas cinzentas, aqueles magos megalomaníacos se isolavam do resto do templo. Considerando-se superiores em relação aos demais sacerdotes, os Sábios não eram mais o mesmo de antigamente. Agora, eram tão poderosos quanto sádicos. Sua adoração ao oculto beirava ao uso das magias negras. Seus experimentos eram do conhecimento de poucos, sendo aprovados completamente pelo Ancião que garantia que suas ações eram benéficas para o templo.
Como eram pouco vistos, Elise demorou a entender que os homens que haviam surgido no salão eram os tais Sábios. Os Arcanos que a seguravam também usavam as mesmas vestes cinzentas. Ela não demoraria a descobrir que eles passavam de servos de Ishmael, cães sedentos de sangue e sem apreço a vida humana.
Somos capazes de muito mais do que simples experimentos. O Sábio com o machado afirmou, brandindo a arma com firmeza. Somos muito mais fortes que vocês, capazes de lutar tão bem corpo-a-corpo quanto um guerreiro. Infelizmente, você não vivera para nos ver lutar. Ele riu. É uma pena.
O Arcano andou até a esquerda de Elise. Os outros Sábios a forçaram contra o chão, deixando sua nuca exposta. Ela respirou fundo.
A lâmina fria do machado de aproximou lentamente de sua nuca. Elise tremeu. Um calafrio percorreu toda a sua espinha. Sua respiração se tornou mais acelerada. Seu coração palpitava mais rápido. Ela fechou os olhos. A gigantesca arma foi levantada. O executor tinha calma. O tempo parecia não passar. Com ambas as mãos na arma, o Arcano sorriu por debaixo da máscara. Ishmael observava pacientemente, apreciando o momento.
Adeus. Disse o Sábio sem emoção alguma.
Um movimento rápido. Um som distinto. Lentamente, sangue veio ao chão. Uma morte confirmada diante dos olhos de todos.
O gigantesco machado atingiu o solo, causando um estrondo. Em seguida, o corpo do Sábio caiu. Um buraco estava em seu peito, bem em seu coração.
O olhar de todos se voltou para a arma do Sandrealmer. Um fino fio de fumaça saia da ponta de sua pistola. Uma expressão séria estava em seu rosto enquanto ele mudava seu alvo, apontando agora para Ishmael em seu trono.

Você é o próximo. Disse Viktor rispidamente.

quarta-feira, 9 de março de 2016

Anúncio 19

Eu queria estar postando o próximo capítulo do The Godsbane, ou um conto novo até, mas não estou. É, infelizmente, vida de vestibulando é assim. O tempo livre acabou. Achei que conseguiria fazer tudo, estudar e escrever, mas o tempo é escasso e eventualidades persistem. Talvez eu só consiga fazer postagens de fins de semana, mas não quero parar de escrever. Sempre que possível, vou estar em frente ao meu note, escrevendo. Por ora, não pretendo sacrificar os meus estudos, e nem o meu sono. Até lá, peço que tenham paciência, leiam, ou releiam, algo antigo do blog, caso possível.
Até uma nova postagem.

domingo, 6 de março de 2016

The Godsbane, Capítulo 10

Capítulo 10


Os Arcanos do salão, que até alguns instantes atrás estavam sentados calmamente no grandioso mosaico do chão da sala, levantaram-se às pressas e se dirigiram para as paredes laterais, deixando um corredor livre para que Elise se aproximasse.
Venha! Disse Valentina com a voz firme. Vamos acabar logo com isso...
Você espera que eu me ajoelhe e espere você cortar minha cabeça!? Elise retrucou. Sua voz era tão imponente quanto a da adversária agora.
Os olhares de todos os presentes na sala, inclusive o de Ishmael, voltaram-se, arregalados, para a sacerdotisa. Murmúrios vieram em seguida.
Ah... Um sorriso discreto surgiu no rosto da mageknight. Pretende lutar?
Eu fiquei mais forte. Elise disse séria. Caso contrário, não teria vindo até aqui.
Mais forte... Valentina cruzou os braços. Certo... Vamos ver se não é só falatório...
Calmamente, ela começou a andar pelo corredor. Seus olhos estavam fixos em sua oponente.
Os espectadores, atentos, discutiam. Ninguém tinha coragem de enfrentar a Lady Lockhart. Aqueles que travavam confrontos contra os Arcanos não ousavam enfrentar a mageknight sem ter uma boa vantagem numérica. E, além disso, ela era nova para padrões de magos. Certamente se tornaria mais poderosa que o Ancião algum dia. Muitos já a respeitavam mais do que seu líder, Ishmael.
Você tem certeza...? Murmurou Lumia para Elise.
É a minha melhor chance de sair daqui com vida... A sacerdotisa respondeu. E com Lily... Seus olhos foram ao encontro dos de Viktor. Então... Vale a pena arriscar.
Não espere que o inimigo haja de maneira honrosa.  Avisou Dreadraven.
Não se preocupe. Elise sorriu.  Eu conheço a Lady Lockhart. Ela não faria nada do gênero...
Eu não estava falando dela... O doutor esclareceu.
A sacerdotisa não disse mais nada. Ela apenas olhou para onde o companheiro olhava. Ishmael, sentando em seu trono, olhava para Elise e seus amigos com uma expressão severa, certamente impaciente e intimidadora, em seu rosto velho. Ela se lembrava do que o Ancião era capaz quando irritado.
Você vai se sair bem. Disse Viktor, quebrando um pouco a tensão no ar. Seu tom de voz não era muito animado, porém, Elise sabia que o Sandrealmer não diria algo como aquilo sarcasticamente, não numa situação como aquela. Tenho certeza. Ele esboçou um sorriso.
Então, entre murmúrios dos Arcanos e desejos de boa sorte dos aliados, a sacerdotisa respirou fundo e andou com passos firmes até Valentina. A mageknight, por sua vez, aguardava sua adversária. Na mão direita, estava a sua espada. No rosto, uma expressão satisfeita.
Coragem você tem, garota. Ela disse quase alegre. Isso não dá pra negar...
Obrigada... Elise falou com um sorriso no rosto e, então, levantou os punhos cerrados que começaram a soltar faíscas brancas. Seu olhar estava mais determinado do que nunca.   Agora, vamos... Mestra.
Vamos! Valentina retribuiu o sorriso e, então, olhou para sua espada. Hm... Seu olhar se voltou para sua aprendiza. Espero não ter que usar isso... Disse séria, num tom mais baixo.
Espero o mesmo...
Com entusiasmo, a mageknight guardou a arma atrás da cintura e respirou fundo.
O que é isso? Protestou Ishmael. O Ancião soava irritado. Sua voz ecoou pelo salão. Não pretende matar a traidora? Não pretende seguir as minhas ordens!?
O lugar ficou em silêncio como se as vozes de todos fossem, de repente, roubadas.
Ishmael era, sem duvidas, um dos Arcanos mais poderosos de todos os tempos. Com a idade, veio a sapiência, inegável pelos seus aliados e inimigos igualmente. Seus conhecimentos foram aprofundados. Suas habilidades como feiticeiro, aperfeiçoadas. Guiado por sua fé inabalável, ele era o maior exemplo a ser seguido naquele templo.
Entretanto, com o passar do tempo, sua paciência se tornava cada vez mais escassa. O outrora pacífico Ishmael se transformou em alguém amargo. Seu jeito pacífico e solene foi substituído por um caráter belicoso, levemente sádico. Tendo em mente o seu poder, os acessos de fúria daquele velho homem podiam ser devastadores. Disso, muitos daquele salão já sabiam. Era como se o respeito houvesse sido substituído pelo medo.
Assim, o tirano reinava absoluto em seu trono.
Eu vou dar uma última luta para minha antiga aluna. Valentina respondeu inabalada. Uma maneira de redenção antes da morte, se assim preferir.
Uma morte digna para uma traidora? Ishmael riu com escárnio. Percebe o quão sem sentido seria propor isso? Percebe o quão estúpido seria de sua parte!?
Mais uma vez, o silêncio reinou no salão. E assim mesmo, sem dizer nada, a mageknight respondeu. Seu olhar para o Ancião transbordava com uma intenção assassina.
O quê...? Ishamel quase parecia preocupado.
Não se preocupe... Valentina disse pausadamente. Isso vai acabar rápido...
A Lady Lockhart, então, voltou-se para Elise.  Seu olhar se alterou, não mais ameaçador. Agora gentil, ela parecia convidar a sacerdotisa para um jogo.
Sem pressão, ok? Valentina disse num tom baixo para que o Ancião não pudesse ouvir. Não pretendo te matar, mas não espere que eu vá pegar leve.
Eu nunca esperaria isso. Elise sorriu.
Então, com uma ordem de Ishmael, vinte Arcanos fizeram um círculo ao redor das duas adversárias. Levantando as mãos, uma barreira começou a surgir na frente de cada um dos magos. Curvadas, as paredes de luz branca foram, aos poucos, unindo-se com as que estavam ao lado, fortalecendo-se e estendendo-se.
Em questão de segundos, a arena de Elise e Valentina estava pronta: sob um domo de luz, não havia para onde fugirem enquanto aqueles magos estivessem a postos.
Temos bastante espaço mais que o suficiente para lutarmos... Comentou a mageknight. Alguém ainda espera que isso vire uma luta de espadas... Ela bufou. Enfim... Vamos...
Rapidamente, o punho direito de Valentina foi envolto por chamas. Com um soco, o fogo foi lançado contra Elise. Surpresa, a sacerdotisa ergueu uma barreira de luz bem a sua frente, conseguindo bloquear o ataque sem muitas dificuldades.
Os Arcanos começaram a torcer. Com gritos, urros e punhos socando o ar, eles torciam pela Lady Lockhart. A preocupação de Viktor, Dreadraven e Lumia aumentava.
Está rápida, hein? A mageknight sorriu. Metade desses Arcanos frouxos não teriam levantado uma barreira a tempo...
Magia defensiva é a minha especialidade, lembra? Disse Elise enquanto mantinha sua defesa. Contra um ataque fraco desses, então, nem precisei de muito...
Fraco... Ela repetiu a palavra como se sentisse o gosto amargo dela. Pois bem... Vamos usar mais alguns desses... Veremos o quanto você aguenta...
Com essas palavras, Valentina socou o ar novamente. Uma, duas, três vezes. A cada golpe dado, uma nova bola de fogo era arremessada contra a barreira de sua oponente. A cada instante que se passava, os ataques ficavam mais rápidos, drenando a energia da fina parede de luz pouco a pouco.
Uma centena de bolas de fogo. Pelo menos, foi o que pareceu para Elise. Após a saraivada de ataques, sua barreira cedeu. Com uma expressão triunfante, Valentina lançou uma última esfera de chamas. Mais poderosas que qualquer uma das últimas, o cometa foi ao encontro de Elise.
Um passo rápido da direita. Foi tudo o que foi possível fazer em um intervalo tão curto de tempo. Felizmente, com isso, a sacerdotisa desviou do ataque de sua mestra. A explosão de labaredas acertou a barreira de luz que delimitava a arena, não causando danos a ninguém. O calor intenso das labaredas, porém, não permitiam que Elise baixasse sua guarda. Um movimento em falso, alguma reação tardia ou uma falta momentânea de foco e o seu fim estaria definido.
Nada mal. Admitiu Valentina que havia acabado de cruzar os braços. Sete a cada dez desses molengas a sua volta já teria virado churrasco... Até que...
A mageknight se calou.
Ela havia se agachado o mais rápido que pôde. Um raio branco passou logo acima de sua cabeça, arrepiando alguns fios de seu cabelo loiro.
Não sabia que íamos ficar conversando... Elise sorriu confiante.
Ora... Ela deu uma única risada. Raios, é...?
Os antebraços de Valentina foram envoltos por correntes elétricas brancas. Em seu rosto, uma expressão de alguém que estava feliz por estar lutando. Ela respirou fundo e, então, lançou um olhar desafiador para Elise.
A sacerdotisa não perdeu tempo. Rapidamente, ergueu uma barreira de luz.
Entretanto, ela não duraria.
Três ataques. Um raio após o outro eles vieram. Em um segundo a parede de luz cedeu.
Desprotegida, a sacerdotisa olhou sem reação o sorriso zombeteiro da Lady Lockhart.
Será que você consegue desviar de um desses também? A mestra desafiou a aluna.
 Elise não respondeu. Seus olhos estavam focados nos antebraços de Valentina.
Os raios pareciam se mover ainda mais inquietos. Tremendo freneticamente, pareciam fora do controle da maga, quase escapando de seus braços, escorregando pelos seus dedos, prestes a atacar o salão inteiro. A barreira de luz dos Arcanos serviria mais como uma proteção para eles mesmos do que uma arena para as duas.
A mageknight rugiu. Elise ergueu suas mãos. Uma barreira surgiu. O raio atingiu o teto do domo de luz, errando a sacerdotisa por questão de metros.
Muitos provavelmente diriam que Valentina errou o ataque. Inclusive, que foi intencional, a fim de poupar sua antiga aluna. Estes estariam certos e errados ao mesmo tempo: a trajetória do feitiço foi intencional, porém, ela não estava poupando Elise.
O raio ricocheteou contra o domo de luz, voltando rapidamente contra as costas da sacerdotisa.
Elise gritou de dor. Ela caiu de joelhos enquanto a eletricidade percorria seu corpo, espalhando a dor e fazendo músculos se contraírem fora de seu controle.
Dreadraven, Lumia e Viktor gritavam para a amiga se levantar. Os Arcanos riam, aplaudiam e torciam ainda mais alto pela Lady Lockhart, zombando da desafiante. Ishmael exibia um sorriso cruel, sem mostrar os dentes, enquanto ria baixo. Claramente, alguém aproveitava o sofrimento da sacerdotisa.
Droga... Elise tossiu.
Sua respiração estava, agora, ofegante. A visão, turva. Ela se sentia tonta, olhando para baixo, esperando que o mundo parasse de girar tão rápido.
Para a sua sorte, esses raios não são tão fortes. Informou Valentina.
Elise levantou os olhos na direção da mestra. Ela viu sua oponente parada, de braços cruzados, com uma expressão séria no rosto. Seu olhar voltou  para o chão em seguida.
Seria impossível matar alguém como você só com um desses. Valentina olhou rapidamente para as correntes elétricas que ainda percorriam seu braço direito. Então, suspirou. Você lutou bem... Não espero que você continue lutando. Ninguém espera...
Houve um momento de silêncio quase absoluto. Apenas a respiração arfante de Elise podia ser ouvida.
Vou acabar logo com isso... Valentina sacou sua espada sem muito entusiasmo. Ok?
Sem resposta.
Ok... A maegknight apontou a ponta de sua espada na direção do pescoço de sua antiga aluna. Desculpe-me...
Não... Elise disse com dificuldade. Não...
Valentina hesitou. Todos os espectadores ficaram apreensivos.
Não vou desistir... A sacerdotisa falou. Parecia haver determinação em sua voz fraca. Não posso desistir...
Elise, lentamente, começou a se levantar. A dificuldade era clara, porém, sua cabeça estava erguida. Uma vez de pé, ela encarou a mestra na mesma altura novamente.
E se eu não desistir... Ela sorriu para a adversária. Você vai  ter que continuar a lutando.
Olha só... Valentina pareceu surpresa por um segundo e, então, ficou contente, guardando sua espada. Continua me surpreendendo, garota... Continue assim, ok?
Elise assentiu. Sua mestra sorriu. O brilho nos olhos indicava que ela voltaria a lutar como se nada tivesse acontecido.
A mageknight estendeu as mãos. Uma saraivada de raios veio em seguida. Ricocheteando por todas as paredes da arena, os ataques iam contra Elise por qualquer ângulo imaginável.
A sacerdotisa, entretanto, estava preparada desta vez.
Sob um clarão de raios, ninguém mais conseguia ver Elise. Apenas quando Valentina cessou seus ataques foi possível ver o que fora feito pela sacerdotisa.
Nada mal... Admitiu a mestra ao olhar para aluna.
Sob um pequeno domo de luz, Elise sorria sem um arranhão no corpo. A magia ter drenado um pouco de suas forças, mas Valentina estava certamente mais cansada após a saraivada lançada por ela mesma.
Graças a Yamlight... Suspirou Lumia aliviada.
Viktor pensou em fazer algum comentário sobre o que salvou Elise foi ela mesma e não um suposto deus, porém, resolveu ficar quieto e sorrir pela amiga que ainda lutava.
Impressionante. Dreadraven elogiou. Porém... Elise terá que fazer muito mais do que defender para ganhar.
Lumia e Viktor trocaram olhares preocupados. Eles sabiam que Dreadraven falava a verdade. Atacar era, obviamente, obrigatório para vencer uma luta. Então, qual seria a estratégia de Elise? Cansar a oponente primeiro? Esperar o momento perfeito para contra-atacar? Mudar sua forma de lutar repentinamente, esperando pegar a adversária de surpresa?
Eles até poderiam discutir, mas não queriam. Não assistiam a uma luta qualquer sem motivo algum fora o entretenimento. O duelo que ocorria bem diante de seus olhos poderia terminar com a morte de uma amiga. O nervosismo estava quase incontrolável. Os dois se seguravam para não atrapalhar e algo pior acontecer. Afinal, todos podiam ser executados se Ishamel assim quisesse. Por ora, Viktor e Lumia ficariam quietos como Dreadraven, atentos ao combate.
Está fazendo algo sozinha que precisou de vinte Arcanos juntos... Comentou Valentina de braços cruzados. Numa escala menor, é claro... Porém... Parece tão resistente quanto essa a sua volta... Ela sorriu. Nada mal mesmo...
Porém...?  Indagou Elise.
Porém... Ela começou. Não vai durar por muito mais tempo.
A mageknight apontou para o domo de luz. Na ponta de seu indicador, uma chama começou a brilhar. Então, a atmosfera mudou.
O tempo parecia se arrastar vagarosamente. O ar estava se alterando pouco a pouco. Quente, denso, sufocante. Elise estava suando. A sacerdotisa teve a sensação que tudo a sua volta se transformaria em chamas.
Então, ela viu que seu pensamento não estava muito longe da verdade.
Na ponta do indicador de Valentina, Elise podia ver que pequenas brasas pareciam estar se convergindo, unindo-se num vórtice de pequenos pontos incandescentes rente a unha da adversária.
A sacerdotisa não tinha certeza do que estava por vir, porém, um mau pressentimento a avisou que sua defesa não seria suficiente.
Um tiro veio da ponta do indicador de Valentina. Um projétil de chamas concentrado zuniu. O som fez o ar tremer. Elise se agachou. O ataque passou por sua barreira, por cima de sua cabeça, atravessando o outro lado de seu domo, transpassando os limites da arena.
Elise olhou boquiaberta a destruição. Enquanto a sua defesa cedia, desfazendo-se como uma folha de papel sobre uma fogueira, ela viu o projétil atravessar o peito de um dos Arcanos que mantinha o grande domo. Enquanto ele caía sem vida, o tiro prosseguiu sua rota, levando mais seis magos que não foram rápidos o suficiente para desviarem, causando caos até mesmo depois de parar contra uma parede do salão.
Sem um dos Arcanos que mantinha a barreira, um buraco logo surgiu no domo, deixando o resto de sua composição instável. Elise poderia tentar fugir, ainda mais aproveitando aquele alarde. Porém, aquilo não salvaria Lily e, muito menos, provaria seu valor a sua mestra.
O tumulto e gritos, entretanto, logo tiveram fim.
Basta! Vociferou Ishmael. O duelo ainda não acabou! Voltem até onde estavam ou saiam deste salão imediatamente.
Como de esperado, as vozes se silenciaram.
Um Arcano assumiu o lugar do primeiro morto, restaurando o domo. Alguns magos deixaram o lugar para levar seus amigos atingidos até onde pudessem tentar curá-los em paz. Outros, porém, já sabiam que não conseguiriam salvar seus companheiros. Algumas cerimônias fúnebres já seriam providenciadas. Entretanto, houveram aqueles que deixaram o local apenas por não mais aguentarem o jeito do Ancião. Não havia alguém capaz de contrariá-lo ou enfrentá-lo, logo, afastar-se dele era a solução mais sensata.
Prossigam! Ishmael ordenou.
Elise e Valentina trocaram olhares. Ambas estavam cansadas daquele tirano. Porém, nada seria menos sábio do que enfrentarem o Ancião naquelas condições. Cansadas e sem um plano, nunca poderiam enfrentar o velho Arcano aliado ao seu exército de seguidores.
Bem... Valentina bufou e, então, exibiu um sorriso desafiador. Sinceramente, eu não vou aguentar lutar por mais cinco minutos... Então... Vou tentar acabar com isso logo... Certo?
Ela nem ao menos esperou uma resposta. Da sua mão direita, chamas irromperam. Controladas pela mageknight, elas foram tomando forma, alongando-se até formar uma espada de fogo.
Ah... Elise sorriu. Isso ainda faz parte da luta de magos?
Caro que sim. Valentina retribuiu o sorriso. Enquanto eu não sacar a minha espada de Azzurra, não estou quebrando nenhuma regra... Raios saíram da sua mão esquerda. Rapidamente, eles se moldaram no formato de uma segunda espada. Ou estou?
Elise riu. Foi uma risada baixa, porém, alegre.
Se ninguém é contra... Os punhos da sacerdotisa brilharam com uma luz branca. Pode vir, mestra.
Valentina não perdeu tempo. Com um urro, ela avançou contra a adversária.
Elise sabia que não podia permanecer mais imóvel. Suas barreiras cairiam rapidamente contra os ataques da mageknight e, quando caíssem, sua oponente estaria perto demais. Contra duas espadas a curta distância nada poderia ser feito. Não haveria como correr e, muito menos, como erguer mais uma parede de luz. O jeito seria tentar desviar dos ataques, usar defesas rápidas.
A espada de chamas veio pela direita. A de raios, pela esquerda. Ataques fortes e, principalmente, rápidos. Eles vinham contra o peito de Elise. Quase impulsivamente, a sacerdotisa colocou seus braços entre seu tórax e as armas.
Fogo e relâmpago se chocaram contra Elise. Explosões seguiram os golpes. Entretanto, nenhuma das espadas conseguiu atingir a sacerdotisa.
Valentina observou, legitimamente surpresa, dois broqueis de luz nos antebraços da adversária. Quase transparentes, os pequenos escudos arredondados se desfizeram perante seus olhos, desfazendo-se lentamente após absorverem o impacto dos ataques.
Infelizmente, eles não aguentam muito dano. Elise admitiu. Porém, consigo fazê-los sem muito esforço e me cansam muito menos do que as barreiras.
Isso é novidade... Valentina deu um passo para trás, cautelosa, ainda brandindo suas espadas. Nunca vi nada do tipo...
A mageknight respirou fundo enquanto olhava atentamente sua antiga aluna. Ela havia realmente ficado mais forte. Sua expressão determinada era prova mais que o suficiente agora. Chegou a desenvolver uma magia, ou aprender alguma muito rara, focada nesse confronto. Ela tinha certeza daquilo. Elise havia achado o melhor jeito de parar os golpes de sua espada num confronto direto. Nunca que aquela sacerdotisa iria se render. Com isso tudo em mente, Valentina apenas sorriu mais uma vez antes de voltar ao duelo.
Os ataques da mageknight pareciam inúteis agora. Um golpe era o suficiente para obliterar os escudos. Porém, Valentina não era rápida o suficiente. Um novo broquel surgia, no mesmo lugar, antes mesmo que ela pudesse pensar onde atacaria em seguida. Talvez a sacerdotisa pudesse se cansar, porém, a Lady Lockhart já estava ofegante. Seus golpes ficariam cada vez mais lentos. Um contra-ataque seria iminente.
Elise não mais fugia. Seus passos rápidos para as laterais apenas serviam para deixar sua oponente mais cansada. Seus bloqueios eram precisos. Era quase como se as espadas fossem até seus escudos. Não demoraria muito para que as energias de Valentina se extinguissem.
Entretanto, a paciência acabou antes.
Valentina atacou. Ambas as espadas golpearam ao mesmo tempo. O impacto de uma explosão lançou Elise para trás, roubando-a perder o equilíbrio.
Caída de joelhos, a sacerdotisa se sentiu fraca. Ela, então, levantou a cabeça e fitou sua mestra. Ofegante, porém, com um olhar determinado no rosto. A mageknight começou a andar para os lados, rondando seu alvo, como se procurasse o melhor ângulo para atacar.
Elise sabia o que viria a seguir.
Custosamente, a sacerdotisa se levantou. Ela endireitou as costas e respirou fundo. Ao olhar para sua oponente, ela recebeu um olhar severo.
Valentina não disse uma palavra. Apenas correu. Ambas as espadas em mãos. Elise apenas observava. De repente, a mageknight saltou. Suas armas apontavam para o alto. A sacerdotisa estendeu as mãos contra a oponente.
Um domo surgiu sobre Elise. As espadas de se chocaram contra sua defesa. Fogo e relâmpago rugiram. A sacerdotisa viu seu grande escudo rachar.
Com um estrondo, o domo veio abaixo. Então, tudo pareceu se mover lentamente.
Os cacos de luz caíram no chão como se fossem de uma taça quebrada. Valentina, exausta, aterrissou bem em frente à adversária, praticamente se ajoelhando. Ela podia ver os fragmentos da última defesa da oponente no chão. Em breve, eles iriam se desfazer como pó. Ela tentaria fazer com que a antiga aluna tivesse um fim menos drástico.
A sacerdotisa estava indefesa. A mageknight tinha duas espadas. Era o fim.
Valentina levantou a cabeça. Ela olharia sua adversária nos olhos antes de derrotá-la. Apenas um golpe era preciso para terminar aquela luta.
E assim foi.
Os olhos de Valentina encontraram a mão aberta de Elise. Raios emanavam dela. Antes que ela a mgeknight pudesse reagir, uma descarga elétrica atravessou seu crânio. Seu corpo caiu imóvel no chão branco da arena.
O silêncio reinou por alguns instantes. Então, murmúrios começaram. Todos estavam inquietos.
Os Arcanos desfizeram o domo de luz. Alguns se aproximaram da Lady Lockhart, ignorando Elise que estava ajoelhada a pouco menos de um metro de distância. No rosto da maga, viram um sorriso contente.
Nesse momento, Dreadraven, Lumia e Viktor tentavam atravessar um mar de magos curiosos para chegarem até a amiga.
Ela morreu? Indagou um.
Não pode ser. Outro disse incrédulo. Ela não morreria tão fácil... Não é?
Ela é durona, mas levou um raio da cabeça... Murmurou uma. Não é algo que se sobrevive com facilidade...
Então, os Arcanos que estavam envolta da Lady Lockhart se surpreenderam e, ao mesmo tempo, sentiram-se aliviados.  Valentina, no chão, ria suavemente.
Garota... Ela murmurou. Não esperava que você fosse pegar leve comigo.
Queria estar morta agora?  Indagou Elise, aproximando-se da mestra, num tom brincalhão.
Claro que não... Mas... Nossa... Valentina levantou o tronco com certa dificuldade e, então, olhou para os olhos da antiga aluna. Não imaginava que você fosse ficar tão forte... E tão rápido assim...
Talvez você só esteja ficando velha.
É bem provável.
Elise, então, sorriu e estendeu sua mão para Valentina. A Lady Lockhart retribuiu o sorriso e, com a ajuda daquela que a derrotou, levantou-se contente.
A atmosfera parecia mais leve, calma. Isso, porém, não duraria.
Uma mão puxou abruptamente Valentina para trás, fazendo-a cair de costas no chão.
Antes que Elise pudesse reagir, duas pessoas ao seu lado seguraram seus braços e a forçaram a se ajoelhar.
Os Arcanos foram saindo lentamente do campo de visão da sacerdotisa. Outras pessoas pareciam guiá-los para fora do caminho, ignorando protestos, usando a força bruta sem hesitar.
Então, os olhos de Elise encontraram a carranca de Ishmael.

Você lutou bem. Admitiu o Ancião. Mas isso não vai mudar a sua pena. Ele disse pausadamente. Você será executada.