domingo, 30 de outubro de 2016

A Rainha Vermelha, Capítulo 2

Capítulo 2


Duas semanas. Esse foi o tempo que se passou desde a última operação em que ela esteve presente. Metade de um mês havia se passado e, agora, a Rainha Vermelha parecia entediada. Mas aquilo viria a mudar. Mais rápido do que poderia imaginar.
Sentada em seu escritório, a Rainha estava separada da movimentação de seu bando por uma simples porta. Seus homens e mulheres tendiam a não decepcionar a chefe. Alguns se preparavam para missões, checando seus armamentos e rezando para quem bem entendessem. Outros voltavam de seus trabalhos, estacionando carros e caminhões no estacionamento, descarregando as novas mercadorias e os pagamentos pelos serviços prestados à sociedade, prosseguindo para o bar ou para a enfermaria. Às vezes para os dois. A ordem não parecia importar muito.
Compra e venda de armas. Compra e venda de drogas. Proteção para os que pagassem. Conflitos contra a polícia que mais agia como uma milícia que saia para caçar bruxas. Era disso do que a Máfia da Rainha Vermelha vivia. Era assim que sobreviviam a cada dia.
Não havia outro jeito. Ela não acreditava que havia um lugar melhor para se viver. Fugir daquelas terras cinzentas e sem leis era um sonho para muitos. Mas não era possível. Entrar nas grandes cidades não era permitido. Mesmo que alguém escalasse os muros, não conseguiria se misturar ao povo de lá. A podridão de lá era diferente. Era disfarçada, ignorada, completamente omitida em alguns casos. Era pior do que havia do lado de fora. E a Rainha sabia disso como ninguém. Não pretendia colocar os pés dela de novo naquele lugar imundo.
Uma batida leve na porta. Um momento de hesitação. Outras duas vieram rapidamente. Aquilo foi o suficiente para trazer a Rainha de volta à realidade, escapando de seu transe induzido pelo tédio da papelada em sua mesa.
Alexander se levantou. O gigante estava num canto, quieto, dormindo com seu sono leve. A Rainha às vezes não se lembrava da presença de seu guardião silencioso. Ela calmamente acompanhou o andar pesado do amigo até a porta do escritório. Abruptamente, ele abriu a porta.
A mulher do lado de fora foi surpreendida. Mesmo os mais antigos membros do bando se assustavam, mesmo um pouco, quando Alexander aparecia de repente diante deles.
Tem alguém fora do esconderijo querendo entrar... A mulher avisou. Um policial. Sozinho. Parece ter uns cinquenta e poucos anos. Disse que te conhecia pessoalmente. Um tal de...
Martin. A Rainha presumiu. Mande ele vir.
Aí estava um homem que ela não via fazia tempos. Mas ela tinha certeza que, eventualmente, acabariam se vendo de novo.
Poucos instantes se passaram e lá estava ele, no que era considerado o coração da base da máfia, cercado por curiosos que murmuravam o quão insano ele deveria ser.
Cabelos grisalhos. Barba rala também grisalha. Olhar sério. Expressão mal-humorada.  Um metro e noventa de altura. Porte físico de um lutador. Uniforme azul-marinho. Distintivo no peito. Não parecia se importar com os mafiosos que o escoltaram até o lugar, nem mesmo com as armas apontadas para ele.
Espero que não esteja se sentindo desconfortável. A Rainha esboçou um sorriso. Eles são meio desconfiados com sua gente, então não leve pro pessoal.
É bom que eles estejam mesmo. Martin retrucou.
Acha que você tá na posição de se fazer de forte? Um mafioso magricela indagou, rindo, cutucando a nuca do policial com seu revólver. Hein?
Então, tudo aconteceu muito rápido. Um braço de Martin envolveu o pescoço do mafioso, sufocando-o, enquanto o revólver, agora na mão do policial, apontava para uma têmpora do magrelo.
Aquilo foi o suficiente para fazer os demais membros da gangue erguerem suas armas, mirando em todas as partes do corpo do visitante.
Todos estão bem agitados pelo visto... A Rainha comentou, contemplando os rostos aflitos de seus homens e mulheres. Alexander estava calmo do seu lado,observando a cena, esperando uma ordem para entrar em ação.   Para mim, parece que estão exagerando um pouco...
Peça pros seus capangas abaixarem as armas. Martin ordenou, empurrando a cabeça do refém com a ponta da arma. Agora.
Isso vai depender do que você veio fazer aqui. Ela coçou o queixo. Aliás... Como me achou? Estou curiosa.
História pra outro dia. Respondeu rispidamente. História antiga, diga-se de passagem. Só não vi motivos pra vir até aqui. Não até agora pelo menos.
Não pensou em vir aqui antes? Tomar um chá, talvez?
Sabia que você estaria bem. Ele respondeu sério. É uma Ambrose afinal de contas. Uma guerreira. Mas...
Mas...? Ela ergueu uma sobrancelha. Mas o quê?
Uma nova tropa da Inquisição está vindo para perto daqui. Amanhã mesmo eles chegam. E o comandante deles é um sujeito asqueroso...
Qual deles não é? A Rainha riu. Não ouço nada de novo. O que mais vai me dizer? Que ele mata qualquer um que fique no caminho dele? Que ele se acha melhor que todo mundo? Que ele pisa nos cadáveres das criancinhas que ele mata por diversão?
Que tal se eu contar que o nome dele é Gideon Allard?
O ar pareceu se tornar mais denso. O tempo pareceu desacelerar.
A Rainha engoliu em seco enquanto seu rosto empalidecia.
Gideon... Allard... Ela repetiu o nome pausadamente.
Más memórias. Seria um eufemismo dizer isso. Aquele nome trazia à tona lembranças que a Rainha queria esquecer. Era um lembrete do quão repugnante o mundo realmente poderia ser, do quanto ela podia ser impotente, do porquê ela abandonou a antiga vida. Era algo que ela queria fugir. Algo que queria não ter que enfrentar. Algo que ela desejava ter deixado para trás. Algo que não afetaria mais a sua vida, não mais do que já tinha afetado.
Você pode pensar que ele está atrás do Maldito aí. Martin apontou para Alexander sem se intimidar pelo gigante. Você pode até pensar que ele está atrás do seu bando. Mas você estaria apenas se enganando. Você sabe que ele vai vir atrás de você, que ele vai vir te torturar um pouco mais, que ele vai se divertir um pouco mais... E que ele tem apoio o suficiente para enfrentar seus homens e mulheres numa guerra. Então... Ele bufou. Ataque-o antes que ele te ataque. Mate-o antes que ele te mate. Faça o que você não pôde fazer antes... Faça o que eu tive medo de fazer antes...
Um momento de silêncio pareceu tomar conta do lugar. Muitos dos mafiosos já haviam abaixado suas armas. Eles olhavam perplexos para sua líder que, pela primeira vez diante de sua gangue, parecia sentir medo.
A Rainha respirou fundo. Levou uma mão até um dos bolsos do terno. Então, expirou mais tranquila. Ela achou o que tinha que achar.
Não se preocupe. A Rainha exibiu um sorriso confiante. Eu vou lutar. Então, olhou para o resto do salão, para seus fiéis soldados. Nós vamos lutar. E vamos ganhar. Afinal, um Ambrose e seus guerreiros não perdem uma batalha, não é...?
Hm... Martin esboçou o que parecia ser um sorriso. Pais sempre se preocupam, Sophia...
Outro nome que evocava memórias. Desta vez, memórias mais agradáveis, nostálgicas. Um sorriso discreto, porém genuíno, surgiu em seu rosto. As lembranças de uma era que se foi e que não voltaria, mas que a Rainha preferia não esquecer.
O clima tenso parecia, então, ter se dissipado, mesmo que por poucos momentos. Uma nova tempestade estava a caminho afinal. Uma nova batalha viria.
Não vou tomar mais o tempo de vocês... Martin murmurou. Vocês têm muito o que fazer. Têm que se preparar... E eu tenho que voltar pro meu posto... Fazer o meu trabalho... Ajudar a tomar conta de sua avó...
Vó Agnes... A Rainha disse o nome com certo gosto. Então, o sorriso sumiu de seu rosto. Como ela está...?
Bem... Martin não sabia mentir. Ela... Está bem.
Ah... Ok...
Não se preocupe com ela. Só... Tente visitá-la algum dia. Se possível. Ela está morando numa cidadezinha perto da Capital. Não é difícil chegar lá.
Vou tentar.
Ótimo. Agora... O policial enfim soltou seu escudo humano e devolveu a arma para o magrelo. Preciso que alguém destranque a porta lá de cima para eu sair, ok?
O mafioso assentiu, ainda um pouco trêmulo.
Com uma última tentativa de um sorriso, Martin se despediu de sua filha, desejando com todas as suas forças poder a ver, pelo menos, mais uma vez. Mas sabia que aquilo podia não acontecer.
Quando as portas do elevador se fecharam e o policial não podia mais ser visto, os mafiosos voltaram seu olhar, uma vez mais, para sua chefe. Agora, a Rainha Vermelha parecia diferente, mesmo que alguns poucos minutos tivessem passado. E ninguém sabia dizer se isso era bom ou ruim.
Gente... Calmamente, a Rainha tirou um cigarro de um bolso e um isqueiro do outro. Eu não preciso repetir nada do que foi dito aqui. Ela acendeu um cigarro e deu a primeira tragada, soltando a fumaça poucos instantes depois. Preparem-se para amanhã... Por que eu não vou me acalmar. Não vou me acalmar até ensurdecer os soldados da Inquisição com o grito do comandante deles... Não vou me acalmar até pintar uma trilha daqui até a Capital com o sangue de cada um daqueles vermes... Não vou me acalmar até eu queimar os corpos deles até que todos virarem cinzas... A mafiosa bateu na ponta do cigarro, derrubando um pouco das cinzas no chão. Entenderam...?
E mais uma vez, os soldados saudaram sua capitã, a incontestável Rainha Vermelha.

Perfeito...

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Poema 1 - Parte 3

Vi que outros dois moravam naquele lugar
Sempre agitados, sempre correndo
Com a garotinha pareciam não muito se importar
Sempre triste, sempre sofrendo

Logo eu chegaria ao esclarecimento
Sobre o motivo do silêncio da pequena
Vi que uma vida sem voz era um tormento
Algo miserável, digno de pena

Porém, não demorei para mudar minha opinião
Sobre o que eu sentia em relação à criança
Afinal, percebi que a via como uma aberração
Assim como fazia toda a maldita vizinhança

A imagem de anjo logo se desfazia
Quando descobriam sobre seu defeito
O inocente sorriso da pequena sumia
Ao se ver como um ser tão imperfeito

Acho que foi por isso que ela se apegou a mim
A garota via como eu a olhava
Via além de meus olhos vis cor de carmim
E algo bom creio que ela achava

E antes mesmo que eu pudesse perceber
Guardião da garota eu me tornei
Uma fiel sombra que a seguia sem entender
Como a uma presa eu me apeguei

Mais forte a cada dia
Mais confiante, mais cheia de vida
Era assim que eu a via
Uma vencedora, não mais vencida

Me perguntei se era influência minha
Tudo aquilo que acontecia
Transformar uma plebeia em rainha
Seu destino eu tecia?

domingo, 23 de outubro de 2016

A Rainha Vermelha, Capítulo 1

Capítulo 1


A noite rugia. Nenhuma alma sábia parecia disposta a se aventurar sob aquela tempestade. Os ventos sopravam forte, uivando, gelando o ar e a terra. Os raios pareciam ser os únicos capazes de iluminar o céu negro, mesmo que por pouco tempo. Os trovões, impiedosos, pareciam fazer com que o próprio chão tremesse de medo. A chuva caia pesada, torrencial, silenciando até mesmo o som dos roncos dos motores que deixavam a cidade.
Por uma estrada rochosa agora coberta de lama, quatro veículos avançavam pelo temporal. Três carros blindados e um caminhão. Todos tão negros quanto a escuridão que os cercavam. Os ofuscantes faróis amarelos pareciam ser os únicos indicadores de suas presenças.
Meia hora se passou. Os veículos pararam. Seu destino era óbvio. Fora um velho armazém, nada havia naquele pedaço de rocha sem vida.
Prontamente, os homens saíram dos carros. Apenas dos carros. O motorista do caminhão permaneceu quieto, atento ao que ocorria.
Eram quinze no total.
Treze eram os típicos capangas. Brutos, com a cara fechada, armados com rifles e escopetas. As roupas escuras eram esfarrapadas, surradas. Certamente não os protegeriam da chuva. Seriam ainda menos úteis contra balas. Nenhum deles parecia ter algum tipo de treinamento formal. Eram do tipo de mercenários que poderiam ser facilmente descartados após o uso.
Os outros dois eram os chefes. Parceiros de longa data, apesar de haver certa rivalidade entre a dupla. Os cabelos eram bem arrumados. As barbas, bem feitas. Os sorrisos esbanjavam autoconfiança. Os ternos, um cinza e outro branco, estavam impecáveis. É claro que dois capangas viriam com guarda-chuvas para manter os chefes a salvo das perigosas gotas de chuva. Não me surpreenderia se aquilo fizesse parte do contrato.
Com passos rápidos, os homens se dirigiram até a porta. Dois deles vinham um pouco atrás, carregando pesadas maletas prateadas. As batidas fortes e impacientes no portão de aço vieram seguidas de sua identificação. Os compradores se surpreenderam ao perceber que as portas estavam destrancadas.
Com certa hesitação, eles entraram.
Dentro do armazém, pouco era visível. As luzes brancas eram fracas, incapazes de dissipar as sombras. Alguns caixotes de madeira estavam espalhados pelos cantos, muitos cobertos por lonas brancas. Porém, os olhos de nenhum dos homens se focavam naquilo. Algo no centro da sala era bem mais tentador.
Longos cabelos ruivos. Pele alva como marfim. Olhos cor de mel. Lábios doces e delicados. Um sorriso perfeito. Aquela mulher poderia seduzir qualquer um daqueles homens grosseiros, fazê-los se ajoelhar diante de seus pés e obedecer cada um de seus comandos. Poderia fazer um atacar outro, fazê-los de fantoches para seu divertimento. Quando se entediasse, ela os descartaria como bem entendesse.
Porém, não o faria.
Não era assim que a Rainha Vermelha trabalhava. De fato, certos dias ela parecia detestar sua aparência.
Terno preto para esconder as curvas do corpo. Rabo de cavalo para prender o cabelo. Uma expressão séria que fazia seu sorriso angelical desaparecer por completo. E, mesmo assim, seu profissionalismo era questionado. Não ser levada a sério a tirava do sério.
A Rainha tirou um isqueiro prateado do bolso esquerdo. Do direito, veio um maço. Ela retirou um e guardou os demais. Com calma, levou o cigarro à boca e o acendeu.
Então... Ela começou a falar enquanto tragava a fumaça. Sua voz era monótona, sem emoção.   Trouxeram o dinheiro?
Ora... O homem de terno branco sorriu. Não é uma recepção muito calorosa essa sua, não acha, Rainha Vermelha? Seu tom de voz era acolhedor, um tanto quanto sedutor. Por que não se aproxima, minha cara...? Ele deu um passo a frente. Ou prefere que eu me aproxime...?
Nem um nem outro... A mulher soprou parte da fumaça cinzenta. É verdade. É uma recepção fria. Mas não vai mudar. Eu gosto das coisas assim. São negócios, não é mesmo? Eu apertaria a sua mão, mas você me parece daquele tipo de cara que não vai se contentar só com isso...
O sorriso sumiu no rosto do homem. O parceiro dele deu um tapa de leve em seu ombro.
Não vai conseguir nada com essa daí. Advertiu o de terno cinza com sua voz rouca. Seu olhar se dirigiu à vendedora. É praticamente um homem com tetas essa tal de Rainha Vermelha...
O desgraçado sorriu, mostrando seus dentes amarelados para a mulher. Era óbvio que ele esperava algum tipo de reação. Mas nada veio. Não dela, pelo menos.
Era um mau pressentimento, pra dizer o mínimo. Algo parecia ter se agitado naquele armazém. Os olhos dos dois chefes e dos capangas menos estúpidos tentaram seguir os sons.
Alguém estava no andar de cima, nas passarelas de metal.
Por um momento... O sujeito de terno branco suspirou. Achei que você estivesse só aqui.
Não pensei que vocês fossem tão ingênuos... A Rainha soprou mais fumaça na direção dos compradores. Pra não dizer idiotas Ela bufou. Um toque leve do dedo fez com que as cinzas caíssem da ponta do cigarro. Se eu escolhi o local do encontro... É claro que eu viria preparada para ter que lidar com gente desagradável...
É claro, é claro... Agora foi a vez do sujeito de terno cinzento falar. Não podemos confiar em ninguém nesses dias... Concordou. Enfim... Vamos aos negócios, ok...? Ele esfregou uma palma da mão na outra. Onde está a mercadoria?
Nos caixotes. Ela respondeu. Em todos eles. Ao seu redor. Experimente se quiser.
Faz parte do trabalho...
O homem de terno cinza andou calmamente, com um sorriso no rosto, até uma das grandes caixas de madeira. Ele levantou a tampa pesada e a deixou de lado. Seus olhos pareciam brilhar ao ver a mercadoria.
Olha só... O homem sorriu satisfeito. Fazia tempo que eu não via tanto pó junto...
Ele levou uma mão até o bolso direito. De lá, tirou um estilete. Então, tirou um dos sacos do caixote. Com um corte rápido, fez uma pequena abertura. Seu indicador foi até o pó branco e, em seguida, para sua boca.
O homem de terno cinza se virou para a mulher. Sua boca formou um sorriso largo, satisfeito. A vendedora manteve sua expressão séria.
Ok... Ele se voltou animado para seus capangas. É da boa. Podem pagar à moça.
Os homens que carregavam as maletas prateadas as deixaram aos pés da Rainha. Ela olhou para elas sem muito entusiasmo, pressentindo algo errado.
Setenta e cinco mil. Anunciou o homem de terno cinza com o saco de cocaína ainda em mãos. Como prometido.
Ah... A mulher soprou fumaça inquieta. Como prometido. Repetiu. Não, não... Ela inclinou a cabeça para a esquerda. Não acho que tenha sido esse o trato...
Querida... Ele sorriu. Somos os melhores compradores que você terá na vida. Nunca que você conseguiria todo esse dinheiro de uma vez...
Parece que você está certo. Afinal, não tenho todo esse dinheiro. Não tenho os meus cem mil.
Olhe... O homem parecia irritado agora. Nós somos da capital. Da capital, sabe? Nós ditamos os preços, doçura. Se eu estou falando que setenta e cinco mil é o que isso vale...
Então você não vai levar toda a mercadoria. Ela retrucou.
O homem de terno cinza bufou. Estava prestes a perder a paciência. Ele havia dito a seu parceiro que conseguiria o desconto, que conseguiria convencer a compradora a se contentar com menos dinheiro. Porém, nunca em sua vida aquele desgraçado havia negociado com alguém como aquela mulher de terno.
Setenta e cinco por cento. Ela disse calma. Ou seja... Quinze dos vinte caixotes. Ou isso ou você volta da próxima vez com todo o dinheiro... Ou não volta mais.
Escuta aqui, sua vadia...!
O rugido veio em seguido. O brado chamou a atenção de todos. Então, um vulto gigantesco pulou do segundo andar.
Ele pousou, bem ao lado da Rainha, estremecendo o chão. Calma, a expressão do seu rosto não se alterou. Ela já havia se acostumado com o estilo de chegada de seu amigo querido.
O recém chegado tinha mais de dois metros de altura. Vestia uma jaqueta de couro surrada, calças pretas e coturnos velhos. Seu corpo musculoso, da cor da terra, era coberto por tatuagens que se espalhavam até mesmo por sua cabeça. Sua face mais parecia uma máscara negra com uma expressão de raiva, dentes à mostra como presas e olhos dourados no mínimo incomuns.
A reação de todos os capangas, por mais assustados e trêmulos que estivessem, foi apontar suas armas para o gigante.
Então... O homem de terno branco limpou a garganta. Esse é o seu reforço?
Alexander, meu guarda-costas. A Rainha explicou. E um de meus amigos mais antigos e fieis... Ele sempre se irrita quando falam mal de mim. Eu não ligo, sabe? Ela cruzou os braços e olhou para o companheiro. Nunca fui muito de me deixar levar pela a opinião de gentinha que nem vocês... Mas aí o grandão aqui não leva tão na boa...
Adorável. O homem de terno cinza disse num tom sarcástico. Agora peça pro seu bichinho ficar quieto. Caso contrário, ele vai ficar cheio de buracos.
Pouco provável. A mulher discordou. Ele é bem forte, sabe...?
Você não consegue ficar com essa boca fechada!?
Poderia dizer o mesmo sobre você...
Olha aqui, sua vaca...!
Então, aquilo aconteceu.
O gigante correu sem hesitar, com passos largos e pesados, urrando como uma fera, até sua mão direita agarrar o rosto do homem de terno cinza.
Ele tentou pedir ajuda. Tentou se soltar de seu agressor. Sem sucesso. Seus gritos eram abafados pela mão do gigante. Os capangas pareciam ainda mais assustados. Suas mãos tremiam. Os dedos dançavam sem saber se apertavam ou não o gatilho. Era pouco que provável que acertassem o alvo, mesmo ele estando parado.
Não atirem! Pediu o homem de terno branco para seus homens. Por favor, não atirem!
É claro que ele estava preocupado. Aqueles brutamontes iriam acabar atirando em seu parceiro se apertassem os gatilhos. É provável que fizessem o mesmo erro mesmo em condições mais favoráveis, com menos tensão.
Com seus gritos abafados de dor, o homem do terno cinza estava perdendo as forças. Tremendo de medo e sentindo sua face sendo esmagada, ele acabou se ajoelhando. Não aguentava mais ficar de pé. Era como se suas pernas não conseguissem suportar mais seu peso. Se o gigante o soltasse, era provável que caísse inerte, impotente.
Sabe qual o problema? A Rainha perguntou e, então, soprou uma nuvem cinzenta para o alto. Digo, qual o problema de vocês? De todos vocês...?
O olhar de todos se dirigia à mulher agora. Ela não gostava de tanta atenção, porém, dessa vez seria diferente. Seria necessário. Seria bom.
Vocês, pessoas fracas... Começou a Rainha. E com isso não me refiro à fraqueza física necessariamente, mas com certeza me refiro à fraqueza mental de vocês, entendem...? O problema é... É que vocês não sabem respeitar. Aliás, é pior que isso. Vocês não querem respeitar. Vocês não conseguem simplesmente obedecer a uma regra, pesar seus prós e seus contras, decidir pela alternativa mais viável, enxergar que as regras estão aqui tantas vezes para ajudá-los... Não! É algo muito além de vocês... Algo que não entra na cabeça de vocês... Vocês têm que discordar, vocês têm que causar um tumulto apenas por quererem, apenas por poderem... Apenas por se acharem fortes... Mas vocês não são fortes. Ela disse pausadamente. Vocês não têm a capacidade de respeitar... Mas vocês têm a capacidade de fazer as coisas por outros motivos, sabe? De serem coagidos, de seguirem regras pelo medo, de aprenderem com os mais graves erros cometidos, de aprenderem com as dores mais marcantes, com os arrependimentos mais amargos... Um sorriso sinistro se formou em seus lábios. É por isso que não dá pra conversar com vocês... É por isso que é preciso ser bruto com a sua raça... Então...
Nesse instante, o gigante soltou o rosto do homem com o terno cinza. Ele respirou ofegante, ainda com as pernas bambas, parecendo que havia quase se afogado, sendo salvo no último instante.
Entretanto, o homem não pôde comemorar.
A mão do gigante agarrou sua mandíbula em seguida, junto com sua língua, puxando sua face aterrorizada na direção da Rainha.
É por isso que vocês têm que aprender com o medo. Ela continuou. Aprender com a dor... Nem que seja a dor dos outros...
Um movimento brusco. Um único movimento brusco. Foi o suficiente. O desgraçado de terno cinza sentiu sua mandíbula sendo puxada até se soltar se seu crânio. Sentiu também sua língua ser arrancada com um solavanco mais forte que o corte de uma faca. E, então, sentiu o sangue em sua boca, junta com uma explosão de dor. Tudo isso enquanto não ouvia, mas sim, lia nos lábios da Rainha uma zombaria na forma de um murmúrio gentil:
Agora você nunca mais vai conseguir usar essa boca imunda...
O homem de cinza veio abaixo. No mesmo instante, começou a se debater no chão, tentando gritar de dor sem poder articular palavra alguma. Seu sangue jorrava para todos os lados enquanto o pé do gigante em seu peito o impedia de fugir.
Não demorou para que o chão negro fosse tingido de vermelho. E a poça rubra se estendia.
Horrorizados, os homens tremiam. Eles não sabiam como reagir aquilo, a algo tão desumano.
Ah... Ah... O homem de branco tentava elaborar uma frase. Vocês...! Ele se voltou para os capangas. Atirem... Atirem nele! Atirem naquele monstro!
Os homens demoraram um instante para entender. Não eram soldados treinados afinal.
Quando começaram a atirar, porém, não cessaram até que as balas acabassem e o chão estivesse coberto com as cápsulas metálicas.
Durante o frenesi, nem mesmo perceberam que seus esforços haviam sido completamente em vão.
Centenas de projéteis haviam acertado o corpo do gigante, mas nenhum conseguiu causar mais do que alguns arranhões em sua pele. Nem mesmo os disparos contra a cabeça dele tiveram algum efeito. Apenas serviram para colocar alguns buracos nas roupas velhas. Apenas isso.
Essa aberração... O homem de branco disse tremendo. É um daqueles...? É uma daquelas coisas...?
O nome dele é Alexander... A Rainha sorriu. E ele é alguém que veio aqui te ensinar pelo medo a ser um bom garoto. Entendeu agora?
Então, ela assoviou. A ordem foi entendida.
Da escuridão acima dela, disparos vieram. Como uma chuva de metal, balas de pistolas, rifles e metralhadoras vieram. Um a um, os capangas caíam. Não mais do que dez segundos se passaram. Então, o homem de terno branco se viu em pé, sozinho, cercado por catorze corpos sem vida e mais sangue do que já havia visto em toda sua vida.
Espero que você não tenha achado que eu só tinha um amigo. A Rainha falou com serenidade. Se bem que... Só o Alex já bastava...
O homem olhou para ela. Quando percebeu, já era tarde demais. A mão do gigante já estava apertando sua nuca, forçando-o a se ajoelhar assim como seu parceiro havia feito.
Isso é o que faremos... A Rainha começou a dizer, olhando seu cliente de cima. Você vai deixar todo o dinheiro aqui... E não vai levar nada... Entendido?
Tremendo, ele assentiu.
Ela, então, tragou o cigarro e expeliu a fumaça no rosto do homem assustado. Ele fechou os olhos e tossiu.
É claro que você entendeu. A mulher esboçou um sorriso. Não respeitam. Sentem medo. Enfim entendem a mensagem. Tudo o que eu acabei de falar faz sentido... Não é?
A Rainha estendeu sua mão na direção do rosto de seu cliente, tocando o cigarro na testa do homem. O desgraçado gritou enquanto ela apagava a extremidade da haste, derrubando cinzas sobre o terno branco.
Bem, esse acabou sendo um dia bem lucrativo. Ela sorriu para Alexander. Então, voltou-se para o homem ajoelhado. Não hesite em me procurar para futuras transações comerciais, ok?
Após essas palavras, o gigante soltou o cliente assustado. Sem hesitar, o homem se levantou e, aos tropeços, correu para fora do armazém. Ele nem se importou com a grande marca redonda no meio da testa. Nem se preocupou em deixar os corpos dos capangas e do amigo para trás.
Tudo certo... A Rainha respirou fundo. Então, olhou para cima.  Valeu, gente! Ótimo trabalho em equipe!
Após essas palavras, seis pessoas pularam das passarelas de ferro. Eram três homens e três mulheres. Todos vestindo roupas blindadas. Todos fortemente armados. Todos saudando a Rainha Vermelha como sua capitã.

Vocês merecem uma salva de palmas. A Rainha sorriu. E alguns drinques. Por minha conta. Dinheiro não é problema hoje... Ela riu contente olhando para as maletas prateadas no chão. Agora, elas estavam manchadas com gotas rubras. Vamos, garotos e garotas. Temos uma tempestade para enfrentar...

sábado, 22 de outubro de 2016

Anúncio 38

Ok, tenho várias coisas pra falar. Vamos por partes.
Primeiramente, A Conflagração terminou, como alguns podem ter lido. Refiro-me ao último capítulo da história que me fez começar a escrever. Aliás, terminar, eu já tinha terminado. Faz tempo. Só não havia compartilhado tudo aqui. Agora, parece que uma era terminou. Mas foi bom. Aprendi bastante enquanto escrevia a história. Aprendi sobre os estilos que gosto de escrever, sobre o que gosto de expor em minhas histórias. sobre escrever em si. E amadureci muito. Quando releio passagens do romance, vejo o quanto eu era infantil, pelo menos, em relação ao eu de agora. Isso sem contar com o quanto melhorei minha escrita, tanto nas descrições, tanto nas falas das personagens. Sem dúvida essa foi uma experiência que me marcou. Uma experiência que vai me deixar marcado, positivamente é claro, pelo resto de minha vida.
Agora, quanto ao prêmio da Andross... É, eu não ganhei. Mas juro que não me senti mal, muito menos derrotado. Competi contra escritores mais velhos, mais experientes nesse ofício, mais maduros em vivência. E, mesmo assim, consegui me sobressair. Fiquei entre os cinco melhores de uma das coletâneas. Fiquei de igual para igual com aqueles que estavam presentes na premiação. Foi incrível. Outra experiência que não vai passar em branco.
Quanto ao que eu vou escrever agora... Bem...
Tenho noção que tenho uma bela (se é que podemos a chamar assim) história de terror para terminar. E ela está terminando. Aproximando-se rapidamente de seu fim... E não quero decepcionar meus leitores. Nem quero me decepcionar. Por isso eu irei apenas concluir esse conto quando eu tiver certeza que estou no clima certo para tal. Até lá... Peço que aguentem, que leiam outras coisas, outros textos aqui do blog...
Sobre o meu conto em forma de poema... Esse é outro que estou quase terminando. Juro. Devo ter postado só metade do que escrevi. Em breve ele se encerrará. Posso até mesmo postar mais algumas partes em breve. Então, fiquem atentos...
Agora... Não sei quantos de vocês se lembram do Teaser 1A, mas bem... Acho que sei como expandi-lo para uma outra história. Sim, outra. Diferente do que eu planejava anteriormente. Algo independente dos outros teasers. Algo mais conciso... Porém, não pretendo decepcionar.
Apenas aguardem pelo que virá.
Até mais!

domingo, 16 de outubro de 2016

Poema 1 - Parte 2

Mais tarde, um pensamento invadiu minha mente
Uma memória turva, dada como esquecida
Algo que deveria ter sido apagado eternamente
Do que sobrou de minha alma há muito enegrecida

Voltei para o quarto da garota na noite seguinte
Algo que não era nem um pouco de meu agrado
Imagine, aparecer lá como um reles pedinte
Desejando saber algo sobre o meu passado

Uma vez de volta àquele lugar
Encarei aquele rosto delicado e serene
Tentando ao máximo me lembrar
De uma memória que deveria ser perene

Não demorou para que ela os olhos abrisse
Avistando a grande sombra ao seu lado
E se para vocês, leitores, eu mentisse
Diria que a garotinha havia gritado

Inferno, aquilo estava me irritando
Muito, muito mais do que eu queria
Por sua vida ela deveria estar chorando
Entretanto, para mim gentilmente sorria

Com os olhos pesados, a menina bocejou
Despedindo-se com um rápido aceno de mão
Prontamente a cabeça no travesseiro deitou
Não se importando com o monstro aqui em questão

No entanto, eu não parti
Haviam assuntos sérios ali a serem resolvidos
Então, por lá permaneci
Vagando atento, longe dos olhos e ouvidos

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Capítulo 68 (Fim de A Conflagração)

The Birth
O Nascimento

Ao chegar ao salão em frente à sala do trono, Tristan não encontrou ninguém.
“Estranho...onde estão os guardas?”.
Cuidadosamente, o guerreiro abriu a porta em sua frente e adentrou a sala do trono.
“Ah...”.
A sala estava completamente vazia. Entretanto, murmúrios soavam além do trono. Tristan respirou fundo e invocou sua espada. Lentamente, ele andou na direção dos sons.
“Espero não ter que lutar. Não me resta forças para tanto...”.
Um vulto surgiu à frente do trono. Rapidamente, o guerreiro das Trevas apontou a espada contra o ser desconhecido. Em um segundo, a imagem ficou clara.
Tristan! O Demônio o chamou alegremente, tendo acabado de surgir das sombras. Ao olhar para o amigo apontando uma espada em sua direção, sua expressão mudou, estando, agora, repleta pela dúvida. Ah...pra que a espada?
Bem... O guerreiro abaixou a arma. Esqueça. Ele suspirou. O que está acontecendo aqui? Para onde todos foram?
Quanto a isso...bem, digamos que algo interessante está prestes a acontecer. Astaroth sorriu. Venha. Ele apontou para a parede atrás do trono. É por aqui.
Em um instante, o Demônio desapareceu nas sombras. Tristan andou calmamente até a parede atrás do trono.
“Bem...eu nem sabia que havia uma sala além desta...”.
Ao se transformar em Trevas, Tristan atravessou a parede.
“Nossa...”.
Ao chegar ao outro lado, o guerreiro se viu em uma sala gigantesca. Ele estava em pleno ar, a mais de vinte metros de altura em relação ao solo. As paredes eram feitas de ônix e alabastro. A distância do teto e do chão, ambos circulares, era de mais de trinta metros. Milhares de tochas, com fogo verde intenso, iluminavam o lugar. No chão, mais de uma dúzia de pessoas estavam reunidas em trono de um objeto. Uma luz púrpura era irradiada do local.
“Mas...o que será isso...?”.
Rapidamente, Tristan desceu até ao pequeno grupo de pessoas. Ao aterrissar, o guerreiro reconheceu alguns rostos, como o de Shadowing, Nidhogg, Maeve e o de Astaroth. Havia outros Demônios e seguidores das Trevas que Tristan não conhecia. Ele também pôde ver, agora, que a luz púrpura vinha do objeto que, por sua vez, era um vaso completamente negro.
Então...o que está acontecendo aqui? Perguntou Tristan.
Ora...aí está você! Shadowing sorriu. Por um instante, eu achei que você perderia o nascimento do seu aprendiz.
Meu aprendiz...? Rapidamente, o guerreiro olhou para o Lorde das Trevas. O deus olhava fixamente para o vaso. O sorriso e o brilho no olhar de Nidhogg expressavam extrema alegria e expectativa. Ah...certo...o meu aprendiz. O filho do Lorde das Trevas. Ele olhou seriamente para Shadowing. Quando vocês pretendiam me contar sobre isso?
Agora. Astaroth gargalhou.
Bem...não exatamente agora, mas...é...agora. Shadowing limpou a garganta. Aconteceram tantas coisas nesses últimos tempos que Nidhogg julgou não ser uma prioridade...pelo menos, para você.
Ah...certo. Tristan suspirou. Bem...creio que sim. Mas...quando as coisas chegarem a esse ponto? Pelo que eu entendi, o filho do Nidhogg está prestes a nascer.
É. Concordou Astaroth. O Nidhogg disse que o filho dele chegou nesse estágio...bem, acho que quando nós fomos atacar a base da Tiamat.
Sim. Shadowing confirmou. Muitas coisas aconteceram desde então. Principalmente com você, Tristan.
É... O guerreiro das Trevas suspirou. Tem razão...
E a luta? Indagou Astaroth. Como foi? Matou o Maximillian?
Não... Tristan esboçou um sorriso. Não foi preciso. No fim...ele voltou ao normal.
Mas...ele continua sendo uma ameaça. Alertou Shadowing.
Ele perdeu os poderes. O guerreiro suspirou. E não faz mais parte da Tiamat.
Então...acabou? Perguntou Astaroth. A Tiamat...?
Ela ainda será um problema. Tristan se adiantou em responder. Mas...sem Maximillian...não serão tão problemáticos assim. Eu sei disso.
Ah...certo. O Demônio de olhos verdes sorriu. Bem...talvez possamos descansar um pouco agora, não é?
Seria ótimo. Concordou Shadowing.
É... Tristan sorriu. Ele olhou para Nidhogg. Poucos metros a frente dele, o Lorde das Trevas mantinha a mesma expressão. Bem...eu já volto...
O guerreiro andou calmamente até Nidhogg. Olhando por cima do ombro, o Lorde das Trevas percebeu Tristan se aproximando dele.
Vejo que a missão foi um sucesso. Disse o deus.
Sim. Concordou Tristan.
Depois eu quero um relatório detalhado, mas...agora...
Eu sei. Acabaram de me contar.
Espero que você não esteja irritado com o aviso em cima da hora.
Na verdade, não. Sinceramente, não me restaram muitas energias depois da luta contra o Maximillian. Então...é...eu estou cansado demais para me irritar.
Ora...isso é ótimo. Nidhogg olhou diretamente para o rosto de Tristan, desviando o olhar do vaso. É...com certeza, você está bem cansado. Ele voltou a olhar para frente. Descanse depois que você cumprimentar o meu querido filho, certo?
Certo...
Você não me parece muito animado...
Eu já disse...eu só estou um pouco cansado...
Certo... Nidhogg voltou a olhar para Tristan. Enfim, eu tenho algo muito interessante para te contar sobre o meu filho.
O que é?
Uma parte sua está nele.
Ah... A expressão no rosto de Tristan era de confusão. Como assim?
A energia dele provém de várias fontes. Uma delas são as almas que eu consegui, principalmente, por meio de acordos. Ele sorriu. Entendeu?
Então...a minha alma...faz parte dele?
Sim. Como a de várias outras pessoas. Legal, não é?
É...creio que sim...
De repente, a luz púrpura se tornou mais intensa. O vaso começou a balançar freneticamente. Rachaduras apareceram na superfície negra. Chiados começaram a vir do objeto. Todos os que estavam reunidos estavam apreensivos, com os olhos arregalados. Em um instante, a luz púrpura, como chamas, organizou-se ao redor do vaso, formando a imagem de um dragão, o símbolo das Trevas. O vaso tremeu ainda mais. Em um segundo, ele se desfez, liberando um líquido escuro. Rapidamente, as luzes púrpuras envolveram a matéria desconhecida. Aos poucos, o líquido foi mudando de consistência. As luzes começaram a moldar a matéria, assumindo a forma de um humano ajoelhado. Em seguida, rachaduras apareceram por toda a superfície do corpo do homem. Em uma fração de segundos, a matéria negra se quebrou, revelando um jovem, com aparência de pouco menos de vinte anos, envolvido por trevas. O cabelo prateado era liso e se estendia até a nuca. As íris de seus olhos eram azuis como o mar. A pele parecia ser feita de alabastro. As feições eram delicadas como as de um Anjo. O jovem olhou para frente. Nidhogg sorriu largamente e andou até o seu filho, abraçando-o.
Bem vindo ao mundo, meu filho. O Lorde das Trevas disse claramente para todos ouvirem.

Bem vindo, Mephisto...

domingo, 9 de outubro de 2016

Poema 1 - Parte 1

O Bicho Papão


Minhas negras garras alcançaram a janela aberta
Puxaram-me para dentro do quarto, sem fazer barulho
Colocando-me bem diante de minha doce descoberta
Sob os lençóis, lá estava o ingênuo embrulho

Dormindo gentilmente a garota estava
Sem alguma preocupação, sem algum tormento
Sem ouvir o meu riso grave que soava
Por antecipação ao que eu faria sem arrependimento

Com passos leves, eu me aproximei dela
De quem seria meu próximo joguete
Daquela criança tão meiga e singela
Que seria o meu próximo banquete

Porém, algum ruído devo ter feito
Pois aqueles olhos se abriram de repente
E logo me olharam com aquele jeito
Como se sua morte fosse iminente

Entretanto, a garota acabou por não gritar
O que era, para dizer o mínimo, estranho
Afinal, ela não podia simplesmente se controlar
Diante de um monstro daquele tamanho

Em silêncio, a pequena me observava
Com olhos vidrados, cada vez com menos medo
Pois algo em mim sem dúvida a cativava
O que trouxe à minha boca um gosto azedo  

Com um rugido, desisti de minha caçada
Partindo daquela casa rosnando enfurecido
Em direção àquela escuridão desgraçada

De uma noite que eu desejei ter esquecido

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Capítulo 67

The Defeat of The Great Warrior
A Derrota do Grande Guerreiro

Ótimo... Maximillian murmurou. Agora...termine o serviço.
Tristan olhou para baixo, diretamente nos olhos do Escolhido do Deus da Terra.
Não. O guerreiro retrucou com simplicidade.
Ah... Maximillian, confuso, hesitou por um segundo. O que você disse?
Eu não vou te matar, velho. Levante-se e continue vivendo. Tristan sorriu. Talvez, um dia, você possa me derrotar.
Maximillian trincou os dentes.
Você fala como se você soubesse de tudo. Ele resmungou. O que você realmente sabe sobre a vida!?
Tristan puxou Maximillian, bruscamente, pela gola da camisa esfarrapada e o encarou no fundo dos olhos.
Eu sei que, quando você recebe uma segunda chance para viver dignamente, você a aceita. Ele disse seriamente. Talvez, um dia, você entenda isso.
Em um instante, Tristan se transformou em trevas, juntamente com Maximillian, podendo, assim, atravessar a cratera. Ao chegar do outro lado, o guerreiro empurrou o Escolhido do Deus da Terra, fazendo-o perder o equilíbrio e cair ajoelhado.
Você... Maximillian fraquejou. Eu vou...
Com dificuldade, o líder da Tiamat se levantou. Ele arfava excessivamente. Tristan suspirou.
“Por quê? Por que ele insiste nisso...?”.
Maximillian estendeu sua mão direita. Lentamente, rochas começaram a se erguer, levitando até o Escolhido do Deus da Terra. O esforço lhe causou dor, fazendo com que ele gritasse e as pedras caíssem.
Pare... Pediu Tristan calmamente. Por favor...pare...
Novamente, Maximillian estendeu sua mão. As pedras levitaram novamente. Desta vez, porém, elas começaram a se aglomerar, formando uma maça. Ele respirou fundo. A cor de seu rosto havia praticamente desaparecido. Vagarosamente, praticamente se arrastando, o líder da Tiamat avançou contra Tristan.
“Por que ele continua...?”.
Ao chegar a menos de um metro do guerreiro das Trevas, Maximillian parou de andar. O líder da Tiamat nem conseguia mais olhar para frente. Aos poucos, ele estendeu a maça o mais alto que ele podia. Antes que ele atacasse, porém, a arma se desfez em poeira.
Mas...como...? O Escolhido do Deus da Terra balbuciou. Eu...
Antes que ele pudesse terminar de falar, o próprio Maximillian gritou e se ajoelhou. Sua aura âmbar parecia vazar para fora de seu corpo. Atrás dele, Alexander estava parado, com a mão direita estendida para seu Escolhido. Todo o poder de Maximillian estava sendo absorvido pelo Deus da Terra.
“O quê...?”.
A minha paciência já acabou com você, Maximillian. Alexander declarou, em um tom sério, enquanto terminava de drenar os poderes do homem a sua frente. Então, saiba que, a partir deste momento, você não é nem mais o meu Escolhido nem mais o líder da Tiamat.
Mas...por quê? Maximillian indagou com dificuldade.
Eu não vou negar que você fez um bom trabalho criando e fortalecendo a Tiamat. Disse o Deus da Terra. Mas, agora, você é obsoleto. A Tiamat não precisa mais de você. Vlad, Lycan e eu já havíamos chegado a esse consenso. A única razão pelo qual o mantínhamos conosco era a sua força. Durante esses anos, você evoluiu no uso de magias da Terra. Isto, somado a sua exímia habilidade em combate físico, nos motivou a manter você por perto. Entretanto, aqui está você, derrotado, patético. Graças às suas decisões, perdemos muitas oportunidades recentemente. Você, por exemplo, havia poupado a vida do Escolhido do Lorde das Trevas que, hoje, conseguiu te derrotar. Porém, nada se compara a poupar a vida de Nidhogg. Nós poderíamos ter matado o Lorde das Trevas caso tivéssemos lutado todos juntos. Mas, de acordo com o que você disse, não era o momento certo e, ainda, que poderíamos derrotá-lo depois, sem problemas. Mas, como foi provado aqui, você nem consegue derrotar o Escolhido dele Alexander bufou. Bem...espero ter me justificado. Ele olhou para Tristan. Você o derrotou, guerreiro das Trevas. Agora...decida o futuro deste ser lamentável. O Deus da Terra tornou a olhar para Maximillian. Sem dizer nada, Alexander apenas bufou e se voltou para trás. Lycan e Vlad me aguardam...bem como a Tiamat...e o seu novo líder. Adeus.
O chão se abriu. Uma escadaria para o subsolo surgiu. Maximillian observou, sem reação, enquanto Alexander descia os degraus.
“Maximillian...”.
O solo se restaurou. O homem a frente de Tristan ainda estava ajoelhado, olhando para o nada.
Acabou. O guerreiro das Trevas disse. Quanto antes você entender, melhor.
Com um solavanco, Maximillian se levantou rapidamente e se voltou para Tristan.
Por favor... O ex-Escolhido arfou. Mate-me logo. Eu lhe imploro...
Com o dorso da mão direita, Tristan acertou um tapa na face de Maximillian, derrubando-o instantaneamente. No chão, o ex-líder da Tiamat olhou, com o rosto tomado pela surpresa, para o guerreiro.
Eu espero não ter que fazer isso novamente. Tristan disse. Agora, pare de ser um estorvo para o resto do mundo e se levante. Use as suas pernas. Use os seus braços. Use a sua cabeça. Viva.
Mas... Maximillian suspirou. Por quê?
Se você não tem nenhum motivo para viver...encontre um então.
Você fala como se fosse fácil. Ele tentou se levantar. Com dificuldade, Maximillian conseguiu se erguer sobre os seus joelhos. Porém, permaneceu ajoelhado. Você fala como...
Pare de ser fraco! Tristan urrou. Esse não é o Maximillian que eu conheci! O General Maximillian nunca desistiria de viver! O General Maximillian não precisava de nenhum poder para fazer o que ele quisesse! O General Maximillian me guiou depois que os meus pais morreram! O General Maximillian era forte! A aura de Tristan começou a brilhar intensamente. Mesmo depois de perder tudo... ele continuou vivendo! Ele teve a sua força reconhecida por um deus! Ele se tornou seu Escolhido! Ele juntou milhões de pessoas para criar uma organização que poderia derrotar deuses! Ele era praticamente invencível! E você... O guerreiro bufou. Você é simplesmente patético. Ele cerrou os punhos. Se, por algum acaso, alguma pequena parte de Maximillian resta dentro de você...eu espero que ela tenha me ouvido. Eu espero que...você volte a sua grandeza.
Lágrimas começaram a escorrer dos olhos do ex-General. Ele levou as mãos aos olhos, escondendo o rosto. Tristan respirou fundo e virou as costas para o homem. O guerreiro olhou para o céu. A noite estava chegando.
Tristan. Maximillian o chamou. Sua voz, apesar de um pouco rouca, parecia mais forte. Eu...fui um tolo...um fraco. Eu não tenho nem como sentir raiva de Alexander. A culpa foi toda minha. O meu prórpio poder e ambição me cegaram. Graças a isso, eu fiz muitas escolhas erradas. Mas...eu não vou ficar me lamentando. Eu tenho uma promessa para te fazer. Ele respirou fundo. Antes de eu morrer...meu nome será imortalizado na história. Um tirano morrerá pelas minhas mãos. Talvez seja Leviathan, talvez seja Nidhogg, talvez seja outro. Não imprta. Eu voltarei a minha velha glória. Eu farei isso...nem que, desta vez, eu esteja sozinho. Ele encheu os pulmões com todo o ar possível. Eu voltarei a ser Maximillian!
Tristan olhou sobre o ombro direito, diretamente para o ex-General. O guerreiro sorriu.
“Nada mal...”.
Veremos. Tristan riu. Veremos...
Dito isso, o guerreiro se despediu de Maximillian. Transformando-se em trevas, Tristan voltou à cidade de Nidhogg.

“Maximillian...eu espero ansiosamente ouvir sobre você no futuro...”.

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Anúncio 37

Esse anúncio vai ser bom.
Sábado, agora, poderei receber um prêmio pelo meu conto "A LUZ NO FIM DO TÚNEL".
Ganhando ou não, o reconhecimento de ter um dos cinco melhores contos da coletânea de Fantasia da Andross, o Etéreo, já é algo pra eu poder me gabar um pouco.
Caso eu seja o vencedor, esperem que eu conte mais sobre meu feito.
Por ora, é só isso mesmo.
Até mais!