Capítulo 11
Em meio ao caos, Elise parecia incapaz de ouvir qualquer
coisa. Sua audição estava normal, porém, a sua concentração não estava. Sua mente
parecia ter sido quebrada com as palavras do Ancião.
Após tanto esforço, ela morreria? A sacerdotisa gostaria de
se livrar daqueles que a seguravam. Com um brado imponente ela desafiaria
Ishmael. Mesmo se fosse morrer, daria o seu melhor na luta. Era melhor do que
ser executada como uma pessoa qualquer, como alguém que tivesse fugido da luta.
Porém, Elise não tinha mais forças.
Vozes confusas soavam a sua volta. Arcanos estavam
amedrontados. Seus amigos tentavam chegar ao seu socorro sem sucesso. Valentina
era arrastada para longe dali. Então, passos pesados soaram a sua frente.
Elise voltou seu olhar para o homem. Ele era alto, usava
vestes cinzentas e tinha um machado gigantesco feito de ferro negro em mãos. O
capuz escondia o rosto quase por completo, fazendo-o parecer um assassino, não
um mago. Pelo barulho dos passos, o sujeito trajava uma armadura por debaixo
dos tecidos negros. A princípio, pensou que não se tratasse de um Arcano.
Porém, logo entendeu.
—
Não me parece muito com um Sábio... —
Elise caçoou.
Ela se referia aos Arcanos pertencentes a uma casta que
poucos tinham estima. Trajando túnicas cinzentas, aqueles magos megalomaníacos
se isolavam do resto do templo. Considerando-se superiores em relação aos
demais sacerdotes, os Sábios não eram mais o mesmo de antigamente. Agora, eram
tão poderosos quanto sádicos. Sua adoração ao oculto beirava ao uso das magias
negras. Seus experimentos eram do conhecimento de poucos, sendo aprovados
completamente pelo Ancião que garantia que suas ações eram benéficas para o
templo.
Como eram pouco vistos, Elise demorou a entender que os
homens que haviam surgido no salão eram os tais Sábios. Os Arcanos que a
seguravam também usavam as mesmas vestes cinzentas. Ela não demoraria a
descobrir que eles passavam de servos de Ishmael, cães sedentos de sangue e sem
apreço a vida humana.
—
Somos capazes de muito mais do que simples experimentos. — O Sábio com o machado
afirmou, brandindo a arma com firmeza. —
Somos muito mais fortes que vocês, capazes de lutar tão bem corpo-a-corpo
quanto um guerreiro. Infelizmente, você não vivera para nos ver lutar. — Ele riu. — É uma pena.
O Arcano andou até a esquerda de Elise. Os outros Sábios a
forçaram contra o chão, deixando sua nuca exposta. Ela respirou fundo.
A lâmina fria do machado de aproximou lentamente de sua
nuca. Elise tremeu. Um calafrio percorreu toda a sua espinha. Sua respiração se
tornou mais acelerada. Seu coração palpitava mais rápido. Ela fechou os olhos.
A gigantesca arma foi levantada. O executor tinha calma. O tempo parecia não
passar. Com ambas as mãos na arma, o Arcano sorriu por debaixo da máscara.
Ishmael observava pacientemente, apreciando o momento.
—
Adeus. — Disse o
Sábio sem emoção alguma.
Um movimento rápido. Um som distinto. Lentamente, sangue
veio ao chão. Uma morte confirmada diante dos olhos de todos.
O gigantesco machado atingiu o solo, causando um estrondo.
Em seguida, o corpo do Sábio caiu. Um buraco estava em seu peito, bem em seu
coração.
O olhar de todos se voltou para a arma do Sandrealmer. Um
fino fio de fumaça saia da ponta de sua pistola. Uma expressão séria estava em
seu rosto enquanto ele mudava seu alvo, apontando agora para Ishmael em seu
trono.
—
Você é o próximo. —
Disse Viktor rispidamente.
Nenhuma voz podia ser ouvida no instante seguinte. Todos
pareciam atordoados com o som do disparo seguido da ameaça lançada pelo
Sandrealmer. Por um instante, o tempo parecia haver parado. Então, a gargalhada
maníaca do Ancião quebrou o silêncio.
—
Você tem coragem... —
Ishmael admitiu com um sorriso no rosto. —
Mas não há nada que vocês possam fazer contra um exército. — Seu olhar julgou
cautelosamente o trio composto por Viktor, Lumia e Dreadraven. — Um Sandrealmer... Mais
uma sacerdotisa traidora... —
Seus lábios pareceram se retorcer após a última afirmação. — E... — Ele pareceu surpreso.
Seus olhos se arregalaram enquanto o velho se inclinava para frente. — Ora, ora... O que temos
aqui...?
Dreadraven não hesitou. Viktor e Lumia não puderam o
impedir. Suas vozes nem mesmo pareciam capazes de saírem de suas gargantas. Com
um passo a frente e um olhar compenetrado para o rosto do oponente, o doutor
desafiou o Ancião.
—
Hm... — Os olhos de
Ishmael se cerraram. Ele parecia farejar o ar. Seu nariz apontava na direção de
Dreadraven. — Esse
cheiro... Essa essência... —
Seus olhos se abriram. —
Essas trevas... — Ele
disse pausadamente. —
Que criatura vil... Será mesmo humano...?
—
Eu poderia lhe perguntar o mesmo. —
Dreadraven retrucou.
O Ancião sorriu. Aquela situação era divertida para ele.
Afinal, o caos era iminente.
—
Você está prestes a começar um banho de sangue... — Ele disse quase não contendo a emoção.
—
Fico triste em saber que isso te agrada. —
Dreadraven disse com firmeza. —
Então... — Tão rápido
quanto um relâmpago atravessando os céus, um sabre embainhado surgiu nas mãos do
doutor que assumiu uma postura de combate. —
Vou fazer com que você nunca mais possa sorrir.
—
Ótimo... — O Ancião
se levantou prontamente de seu trono e abriu os braços para o inimigo, pronto
para recebê-lo. —
Venha! Mostre-me o seu pior, ser maldito!
Então, Dreadraven desapareceu. Sua forma se extinguiu em
sombras. Era como se seu corpo fosse feito de fumaça e, de repente, um vendaval
tivesse o soprado para longe.
Não havia uma pessoa que não estivesse surpresa naquele salão.
Porém, todos ficaram ainda mais espantados quando o doutor ressurgiu.
Tão rápido quanto quando desapareceu, Dreadraven surgiu.
Elise pôde ver claramente o amigo bem diante de seus olhos. Sua lâmina
decapitou um dos Sábios que a seguravam contra o chão. Enquanto a cabeça
encapuzada rolava pelo chão, o doutor preparou seu segundo ataque. Não houve
como o Arcano aturdido reagir. Antes que suas mãos pudessem se levantar, a
ponta do sabre de seu inimigo havia atingindo seu pescoço, transpassando sua
garganta e sua nuca.
—
Consegue andar? — Ele
perguntou para Elise.
A sacerdotisa estava em um estado de torpor. Seu aliado
havia acabado de salvar a sua vida como se não fosse nada. Era muito mais
poderoso do que ela havia previsto. Uma ameaça considerável se não estivessem
do mesmo lado.
—
Hm... — Elise limpou
a garganta. — Sim... — Respondeu com certo
atraso. — Consigo...
—
Ótimo. Então vá até os outros. Agora.
Ela assentiu. A sacerdotisa sabia que Dreadraven não teve a
intenção se soar tão seco, porém, ele não pôde evitar em uma situação como
aquela. Certamente o doutor não tinha mais paciência e, se não se apressasse,
ficaria com a guarda baixa contra Ishmael e seus seguidores.
Aos tropeços, Elise seguiu até seus aliados. Os Arcanos em
seu caminho pareciam desviar da sacerdotisa, quase com medo de tocá-la.
Um mau pressentimento, entretanto, assombrava a jovem maga.
Elise tinha a impressão que não chegaria até Viktor e Lumia. Isso, porém, não a
impediu de seguir em frente.
Lentamente, palmas lentas soaram pelo local. Elas vinham de
um único homem.
—
Nada mal... — Admitiu
o Ancião.
Mais uma vez, Ishmael gargalhou. Uma risada pertencente a um
homem louco, sádico, sedento por sangue. Um riso que teria demorado muito mais
se não tivesse sido interrompido.
Um grito de dor ecoou pelo salão. O olhar de todos se
voltou, então, para um Sábio que caia de joelhos no chão. Do abdômen aberto do
homem, sangue começou a escorrer. Após um segundo, ele havia caído já quase sem
vida.
—
Parece que eu tenho a atenção de todos... —
Murmurou a Lady Lockhart. A cristalina espada azul em suas mãos agora estava
manchada de vermelho. —
Então, tenho algumas coisas que eu gostaria de dizer...
Ela ofegava. Estava cansada após o duelo com Elise, é claro.
Porém, um momento de distração de seu captor foi tudo o que Valentina
precisava. O momento era o mais propício imaginável naquela situação. Livre,
agora, a Arcana sabia o que tinha que fazer.
—
Ishamael! — Valentina
bradou. Era como se suas energias houvessem voltado por alguns instantes. — Eu não esperava que as
coisas fossem chegar a esse ponto, mas as suas tendências nefastas nos fizeram
chegar aqui. Aqui e agora, num dos lugares que deveriam ser os mais sagrados de
Windlands, num templo onde a paz deveria ser semeada e, a justiça, seguida com
rigor... Um banho de sangue vai, de fato, acontecer. — Ela respirou fundo e, então, deu um passo a
frente. Seus olhos não mais se concentravam na figura do Ancião. — Quem não quiser se
envolver mais com isso, fuja. Agora, nesse exato momento. Eu não os julgarei.
Muito menos permitirei que outros os julguem. Porém... Para os que ficarem
aqui, vocês serão divididos em dois grupos... Haverão aqueles que ficarão ao
lado de Ishmael, seja por apoiá-lo ou por temê-lo... E haverão aqueles que
ficaram contra ele, do lado da chamada traidora, do lado dos forasteiros... Que
também é o meu lado.
Uma agitação começou no salão. O que começaram com murmúrios
logo se tornou um caos de vozes, um debate acalorado entre aliados que estavam
prestes a matar uns aos outros.
—
Enfim... — A voz de
Ishmael soou alta, silenciando as demais. —
Valentina... — Seu
olhar se voltou para o da mageknight. — Você finalmente arrumou
coragem para me desafiar... Já era hora. —
Ele sorriu. — Faremos
como você deseja... Nos dividiremos em dois lados e nos digladiaremos, tingindo
todo esse salão de vermelho!
A mensagem foi entendida por todos. Rapidamente, os Arcanos
foram se dividindo.
Alguns saíram às pressas do salão. Esses poucos não foram
impedidos.
O restante se dividiu em dois grupos. Ao norte do salão,
estava o Ancião e aqueles que o seguiam. Ao sul, Valentina mantinha seus olhos
fixos no adversário enquanto seus aliados seguiam para trás dela.
—
Elise! — Exclamou
Lumia.
Após um abraço apertado, as amigas conseguiram respirar
aliviadas. Era a calmaria antes da tempestade, porém, elas não desperdiçariam
um momento de paz, não importava o quão breve fosse.
—
Você tem que sair. —
Disse Lumia. Ela estava tão agitada quanto estava preocupada com a amiga. — Agora... Antes que o
Ancião perca a paciência e...
—
Eu vou lutar. — Elise
afirmou determinada.
—
O quê...? Mas... Você tem que se recuperar...
—
Eu não posso abandonar vocês agora. E tenho um pouco de energia de sobra, igual
a Valentina... Além do mais, não posso fugir. Isso é tudo culpa minha, não é
mesmo?
—
Não... É claro que...
—
É verdade... —
Concordou Viktor, interrompendo a aliada. —
Você, minha cara Elise, foi o estopim de uma revolução... Nada mal...
Ele sorriu para Elise que, imediatamente, retribuiu o gesto.
—
Aliás, boa luta agora pouco. —
Ele elogiou. — Ainda
sobraram alguns raios?
—
Acho que sim. — A
sacerdotisa suspirou. —
Vamos ver na hora.
—
Elise... — Murmurou
Lumia.
As amigas se entreolharam. Lumia fitava a miga com olhos
trites, preocupados. É claro que Elise não poderia usar todo o seu potencial.
Não era certo que fosse sobreviver à luta. Porém, a sacerdotisa tinha que
tentar. Se ela havia começado aquela revolução, ela também a terminaria.
—
Não se preocupe. — A
determinação de Elise estava expressa em seu olhar. — Tudo vai dar certo no final.
A sacerdotisa não havia dito nenhum argumento forte,
entretanto, a maneira que ela disse serviu para acalmar Lumia, mesmo que só um
pouco.
—
Bem... — O
Sandrealmer esboçou um sorriso. —
Acho que não podemos mais fugir agora... —
Disse ele enquanto recarregava sua arma. —
É uma pena.
De repente, veio o silêncio quase absoluto.
A cena parecia haver se congelado. Lumia, Elise e Viktor
estavam no meio de um mar de Arcanos. A frente deles, Valentina e Dreadraven murmuravam
algo um para o outro. Com as armas sacadas, eles analisavam as forças inimigas.
A maioria dos Arcanos comuns estava do lado deles. Porém, como era de se
esperar, todos os Sábios estavam ao lado de Ishmael. Eles tinham a vantagem
numérica, mas seria o suficiente para prevalecer sobre a força combinada dos
adversários?
—
Eu mal posso acreditar que você realmente deixou que alguns fugissem... — Admitiu Valentina. Seu
olhar estava vidrado no adversário.
—
Não veja como um ato de misericórdia. —
O Ancião retrucou. —
Os que fugiram eram os que mais tinham medo. Esse medo será espalhado a partir
deles para os outros. Quanto mais medo sentirem, mais cegamente me
obedecerão...
—
Você me enoja...
Ishmael não disse mais nenhuma palavra. Com uma rapidez
assombrosa, invocou e arremessou uma bola de fogo contra um Arcano adversário.
Seu alvo não era ninguém em especial, apenas um mago amedrontado que parecia
desatento. As chamas brancas queimaram sua pele enquanto ele dava seus últimos
gritos. As pessoas ao entorno dele se assustaram. Sabiam, também, que não
podiam ajudar contra um feitiço do Ancião. Ninguém era forte o suficiente.
Em pouco mais do que cinco segundos, o mago havia sido
carbonizado. As chamas haviam devorado sua carne e suas roupas sem dificuldade,
deixando apenas seu esqueleto frágil e enegrecido para trás.
—
E agora...? — Ishmael
sorriu. — Sente ainda
mais nojo?
A resposta da Lady Lockhart veio com um brado. Era como o
som de uma corneta anunciando o início da guerra.
Valentina queria avançar com toda a sua força contra
Ishmael. Superar seus feitiços, mostrar que era, agora, a Arcana mais poderosa.
Queria humilhar o oponente, fazer com que ele sentisse medo, que se
arrependesse de tudo o que houvesse feito antes de ceifar sua vida. Entretanto,
não seria tão fácil. Um batalhão de magos estava no meio do caminho. Cansada do
jeito que estava, ela teria que esperar aquele muro ruir, derrubando tijolo por
tijolo junto de seus aliados.
Entretanto, alguém não teria que esperar a barreira humana
vir abaixo.
O tempo pareceu passar lentamente. Valentina viu o rastro
fino de sombras serpenteando pelo ar. Antes mesmo que ela pudesse lançar um
raio ou, então, atacar um inimigo com sua espada, Dreadraven havia chego até o
Ancião.
Seu sabre negro desferiu um ataque capaz de vencer qualquer
duelo de esgrimistas: rápido o suficiente para evitar uma reação de um ser
humano normal. Porém, com aquele sorriso maníaco no rosto, era claro que
Ishmael não era normal.
Uma barreira branca se formou em volta do Ancião. O domo de
luz aguentou o impacto do golpe sem problemas.
Dreadraven não desistiria tão fácil. Rapidamente, ele se
deslocava para diferentes pontos da barreira, desferindo ataques de todos os
ângulos, com os pés firmes no solo ou mesmo em pleno ar. Porém, nada parecia
adiantar.
Ishmael, que parecia se divertir a princípio, logo ficou
entediado. Com um movimento de sua mão, seu domo de luz se desfez, explodindo e
arremessando o doutor para o alto. Com a guarda baixa, Dreadraven nada pôde
fazer contra o raio ofuscante que veio em seguida.
A corrente elétrica percorreu todo o seu corpo, da ponta dos
dedos dos pés aos das mãos, fazendo-o convulsionar por um segundo, paralisando-o
no instante seguinte.
Entretanto, ele não gritou. Era quase como se ele não
tivesse sentido dor. O murmúrio irritado que ele emitiu por debaixo da máscara
foi causado pela frustração: de não ter conseguido desviar do golpe e,
principalmente, por ter subestimado Ishmael.
Caindo bem em frente a um Sábio, Dreadraven percebeu que
deveria mudar a sua estratégia. Ele agachou, desviando do golpe da clava do
inimigo, e contra-atacou com seu sabre, rasgando a garganta do Arcano. Talvez
fosse melhor ele se unir aos outros, enfraquecendo as forças inimigas antes de
derrotar o adversário mais poderoso. Ele apostaria na força de seus números.
No meio do caos, Valentina lutava com o que restava de suas
energias. Variando entre magias de fogo, relâmpago e golpes de espada, ela
derrubava seus inimigos um a um. Porém, era exatamente isso que a frustrava.
Sob condições normais, ela estaria derrubando dois, três, talvez mais
adversários por vez. Um único feitiço bastaria. A Lady Lockhart, com o suor
escorrendo pelo rosto e seus passos ficando cada vez mais lentos, temia cometer
algum erro estúpido do qual ela não poderia se redimir.
No meio de tantos raios e bolas de fogo colidindo, Viktor
conseguia sobreviver. Qualquer adversário que fosse descuidado ao ponto de se
aproximar demais dele estaria morto. Seus golpes de espada eram mais que o
suficiente. Quando conseguia tempo, derrubava um Sábio com um único disparo bem
dado e, então, corria para recarregar sua arma. Os cristais que havia
conseguido com Gustav também eram bem úteis. Qualquer feitiço originado delas,
de ventanias jatos concentrados de água, era bem mais poderoso dos que os dos
Arcanos que enfrentava. Entretanto, tentava economizá-las. Afinal, o Sandrealmer
ainda pretendia guardar algumas para mais tarde.
Lumia e Zephyr lutavam lado a lado como antes. Juntamente
com os outros Arcanos, eles se digladiavam, lançando chamas e criando barreiras
incansavelmente. De pouco em pouco, eles conseguiam diminuir o contingente
inimigo.
Elise parecia observar a situação com o tempo em um estado
de torpor, quase se arrependendo de ter permanecido no salão. Ela havia sido
deixada para trás quando o caos começou. Sem conseguir correr após o brado de
Valentina, a sacerdotisa parecia analisar o campo de batalha, procurando por
algo que não estava ali.
Enquanto os dois exércitos iam se enfraquecendo, Elise
percebeu a ausência de uma figura importante. Viktor, Dreadraven, Lumia e
Valentina lutavam dando o seu melhor. Ishmael, porém, nada fazia. Foi então
que ela percebeu.
O ser magro, alto e de túnica branca sorria. Seus olhos
brilhavam como chamas intensas mesmo do outro lado do salão. Em suas mãos,
raios pareciam se concentrar enquanto se moviam desordenadamente. Estes, porém,
não eram brancos como os de um Arcano: vermelhos intensos como sangue eles
brilhavam, magia negra sem dúvida.
—
Protejam-se! — Elise
berrou.
Foi tudo o que ela pôde fazer. Porém, não foi o suficiente.
No meio do caos do campo de batalha, suas palavras não foram ouvidas.
A sacerdotisa ergueu uma barreira de luz à própria volta.
Era o que ela podia fazer com a força que remanescente.
Então, uma tempestade começou.
Um segundo depois ela já havia cessado. Porém, os danos já
haviam sido causados.
Raios escarlates voaram pela sala. Tudo o que se movia havia
sido acertado. Ishmael não poupou ninguém, nem mesmo seus subordinados.
Corpos haviam sido arremessados contra as paredes, quebrando
pedras e ossos igualmente. Alguns Arcanos tinham o corpo em chamas, começando a
espalhar o cheiro de carniça queimada pelo ar. No chão, era difícil saber quem
estava inconsciente ou simplesmente morto.
Com sua barreira destruída, Elise caiu de joelhos. Seu corpo
estava ileso, porém, o mesmo não podia ser dito sobre seu espírito. Suas
esperanças haviam acabado de ser despedaçadas. Queria poder fugir dali. Queria
estar junto de Lily e de seus amigos de novo. Queria poder respirar aliviada e sorrir.
A risada maníaca de Ishmael soou, trazendo Elise de volta a
realidade. Seus olhos encontraram os do Ancião.
—
Acabou. — Ele anunciou.
Andando lentamente por entre um mar de corpos, Ishmael
gargalhava.
—
Foi interessante. — O
Arcano continuou a falar. —
Eu me perguntava se eu teria força para isso... Acabar com a vida todos se
fosse preciso... Ou se eu simplesmente achasse que valeria a pena. — Ele abriu um largo
sorriso e parou de andar, ficando a pouco mais de um metro da sacerdotisa. — Obrigado por isso,
traidora...
Elise não conseguiu dizer mais nada. Não esboçou nenhuma
reação. Afinal, o que poderia fazer? Não tinha mais forças para nada. Mesmo que
tivesse, nunca poderia enfrentar Ishmael de igual para igual. Agora, nem mesmo
conseguia olhar o carrasco nos olhos e aceitar a morte com dignidade.
—
Não se preocupe. —
Disse o Ancião friamente. —
Logo mandarei sua amada para junto de você...
Nesse instante, Elise olhou para cima, bem nos olhos de
Ishmael. Ele estava pura e simplesmente feliz, satisfeito com toda a situação,
ansioso para poder fazer aquilo de novo.
Com as mãos envoltas por raios escarlates, o Ancião
gargalhou uma última vez para Elise.
—
Adeus...
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