domingo, 1 de novembro de 2015

Conto 15

A Seleção


Nossa organização não é muito tradicional, sabe?
Temos que agir nas sombras por causa de nossos procedimentos considerados antiéticos. A definição de ética, entretanto, é algo que pode ser discutido. Mas creio que seja melhor não perder tempo com trivialidades.
O que você precisa saber sobre a nossa organização é que ela é uma das melhores do ramo, se não a melhor. E, sinceramente, não é de todo mal se misturar às trevas, sabe? Apenas os melhores conseguem chegar até nós. E o que fazemos com eles? Selecionamos apenas alguns, obtendo o crème de la crème e mantendo a alta qualidade de nossos profissionais. E como fazemos isso? Ora...
Nós os submetemos a uma série de testes, mas é claro.
Mas nada como provas de múltipla escolha, certamente que não. Afinal, se os candidatos já chegaram até nós, eles já demonstraram sua inteligência.
Também não me refiro a simples testes físicos. Afinal, os candidatos não sobreviveriam o caminho até o local da seleção se não estivessem em boa forma.
Para a nossa organização, o teste principal é psicológico.
Algo bem simples, na verdade.
Após uma avaliação psicológica, colocamos um candidato com uma pessoa selecionada especialmente para ela ou ela.
A parte “especial” dessa então ordinária pessoa é que ela sabe atuar, sabe? Seguindo seu papel, ela irá fazer o nosso candidato se sentir sensibilizado, com medo de puxar o gatilho e acabar com a vida dela.
Ah é, essa é a parte principal do teste: matar alguém. Para isso, cada candidato recebe uma arma com apenas uma bala
Cada detalhe é importante nessa hora. O tempo que o candidato demora a matar a pessoa, aonde exatamente ele atirou, se ele, ou ela, tremeu antes e, principalmente, depois do tiro ser disparado.
Um de nossos membros analisa toda a cena do outro lado de um vidro a prova de balas, em uma sala desconhecida pelo candidato.
Outro detalhe que vale a pena ser mencionado é o passado do ator ou da atriz. Sabe... Todos são funcionários de outras organizações como a nossa. Eles pensam que, se nos ajudaram, eles serão libertados ou, então, receberão uma vaga fácil em nossa companhia. Eles também pensam que a bala da arma apontada contra eles é de festim. Isso mostra o quanto eles sabem.
Entretanto, nem todos os atores morrem no final. Pelo menos, não a princípio. Afinal, nem todos os candidatos, por mais inteligentes, fortes e determinados que sejam, conseguem matar alguém cuja personalidade lembre um amigo, um familiar ou, até mesmo, o próprio candidato.
Existem também aqueles que não conseguem viver com a culpa. Nem todos tremem antes de atirarem, entretanto, após o gatilho ser puxado e eles verem sua vítima morta, desfigurada por uma bala e criando uma poça de sangue no chão, a situação é outra. O arrependimento é, então, ouvido na voz chorosa do candidato que fracassou e caiu de joelhos no chão. Alguns, inclusive, tentavam tirar a própria vida e falhavam miseravelmente.
Mas, é claro, existem os assassinatos natos. Muitos matam sem demonstrar emoção. O restante parecia se divertir ao puxar o gatilho e ver um buraco se formar na cabeça de seus vítimas.
Entretanto, houve um caso especial nessa última seleção.
Um jovem, que não havia nem completado seus dezoito anos de vida, nos surpreendeu.
Com sua fala gentil e charmosa, ele acalmou a atriz a frente dele, fazendo-a parar de chorar e, é claro, surpreendendo-a. Afinal, a mulher não esperava zelo vindo de um estranho.
O jovem, então, aproximou-se dela, como se fosse a abraçar e, com um movimento rápido, quebrou o pescoço dela.
Tamanha frieza em matar com as próprias mãos era rara, principalmente depois de demonstrar tamanha compaixão.
É claro que ele seria aprovado. Porém, tínhamos que perguntar o porquê de ele ter escolhido matar a mulher com as próprias mãos.
Ora... Ele sorriu gentilmente e olhou para a pistola em sua mão. Eu tinha apenas uma bala. Resolvi guardá-la para uma emergência. Afinal, não sabia o que ainda estava por vir no teste de vocês.
Não havia mais testes. Entretanto, o jovem não tinha como saber e, sabiamente, resolvi se prevenir.
Ele tinha todas as qualidades que sonhávamos ter em nossos recrutas. Aliás, ele tinha mais do que precisávamos.

Após alguns anos, não foi surpresa que aquele garoto se tornou o nosso líder.

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