4.
Samuel Ambrose
Saint
Henry, uma semana depois da contratação de Brina.
Essa
cidade é muito mais modesta que a glamorosa Saint Paul. Porém, sua grande
população superava a da última. E, com isso, vinham os problemas.
A
criminalidade era alarmante em certos bairros de Saint Henry. Assaltos e até
sequestros não eram nada fora do normal nos bairros ricos. Na periferia,
assassinatos e estupros eram relatados praticamente diariamente.
A
população já havia se acostumado com aquilo. Como Saint Henry não havia
segregado sua população de super humanos, bem como a parcela mais carente de
seus cidadãos, para cidade em suas proximidades, tais crimes pareciam
inevitáveis. Afinal, impedir criminosos comuns já não era uma tarefa fácil.
Impedir super humanos, então, era tido como impossível.
Entretanto,
havia alguém que conseguia enfrentar os super criminosos e, ainda por cima,
tentava mudar a imagem dos super humanos. E esse homem não estava sozinho nessa
luta.
Mas
isso é conversa para outro dia. O assunto de hoje é outro.
Samuel
Ambrose estava na cidade a negócios. Ele tinha uma ótima intuição para
investimentos. Isso foi ótimo para o
ex-boxeador que, após a aposentadoria, conseguiu se tornar ainda mais rico.
Ambrose
havia acabado de retornar de um prédio que tinha, pelo menos, quarenta andares.
O exterior era coberto por vidros que refletiam o céu azul celeste da cidade.
Aquela era a sede de uma das maiores empresas alimentícias da região. Se eles
haviam chego ao lugar onde estavam, era por causa da ajuda de Samuel.
Calmamente,
usando seu terno preto e óculos escuros, Samuel abriu a porta de seu carro
esportivo prateado. O automóvel era simplesmente invejável. O design era uma
obra de arte. A carroceria era feita de fibra de carbono. Os vidros cristalinos
eram blindados, bem como o resto do veículo. Os próprios pneus pareciam ter
custado uma fortuna. Mas Ambrose sabia que valia a pena. Afinal, aquilo não era
um mero meio de transporte: aquilo era praticamente uma fortaleza quando ele
estava lá dentro. E, como provado no passado, era muito útil para fugas.
Samuel
adorava aquele carro. Ele devia sua vida a ele.
Ao
entrar nele, Ambrose conseguiu relaxar completamente. Ele trancou a porta do
carro, colocou a chama na ignição, ouviu o ronco do motor e, antes que ele começasse
a dirigir, ele ouviu:
—
Que coincidência te ver aqui.
Ele se voltou para o banco de trás, claramente assustado.
Entretanto, ao me ver, ele se acalmou e riu.
Ambrose, como já deve ter ficado claro, é um dos cinco
humanos que eu resolvi observar. Entretanto, ele foi o primeiro que eu resolvi
entrar em contato. Mesmo antes de se envolver com os outros quatro, ele já era
o que mais me despertava interesse. Ele era um verdadeiro guerreiro, e não digo
isso apenas pela carreira dele como lutador profissional de boxe. Eu me refiro
ao espírito dele de ir atrás de algo melhor e conseguir. E isso sem a
influência de terceiros.
—
Ora... Resolveu mudar um pouco o visual? —
Samuel me perguntou.
Eu ri como ri da outra vez. Era bom ver que Ambrose se
sentia mais confortável na minha presença. Ou eu deveria dizer, na presença
dele mesmo?
Como não tinha uma forma fixa, eu assumia qualquer uma
que eu quisesse. Por isso, eu tomava a forma daquele com quem eu conversava. Eu
personificava qualquer um com perfeição. Isso incluía a voz da pessoa.
Naquele momento, eu trajava o mesmo terno e óculos
escuros de Samuel. Em uma outra vez, copiei a camisa regata branca e as
bermudas azuis dele. Ambrose havia ficado um pouco irritado por eu ter
atrapalhado seu final de semana na praia.
—
Então, o que te traz até mim, Nemo? —
Indagou Samuel.
Aquele foi o nome que eu escolhi para os humanos me
chamarem. Eu havia estudado um pouco de latim e achei o nome interessante.
—
Precisava de alguém pra conversar. —
Respondi. — Olhe...
Eu trazia um jornal comigo. Mostrei-o para Samuel.
Rapidamente, ele o pegou, desdobrou-o e leu por cima a notícia em destaque. Ela
falava sobre o aumento da criminalidade. Mas importante, ela apresentava
fragmentos de uma coletiva de imprensa com o prefeito da cidade sobre o
assunto.
Ambrose bufou, dobrou o jornal e disse:
—
O prefeito dessa cidade é um idiota. Foi eleito com base em sua popularidade e
carisma. O povo que o escolheu, agora eles têm que arcar com as conseqüências
de seus atos impensados.
—
Vai me dizer que eles tinham uma opção melhor? —
Perguntei.
Samuel suspirou e respondeu:
—
Dentre as opções que eles tinham? Não, não acho. Mas não seria muito difícil
achar alguém mais preparado que os candidatos anteriores. Porém... Política não
é um jogo honesto. Pelo menos, não em relação a ideais, inteligência,
comprometimento e integridade. Não nos
dias de hoje...
—
Nossa... — Eu ri
brevemente. — Vocês,
humanos, vão acabar destruindo a vocês mesmos antes de acabarem com esse
planeta.
—
Quem sabe? Talvez pudéssemos salvar o mundo assim.
—
É, sem dúvida, uma possibilidade...
Eu soltei mais uma risada. Antes que Ambrose pudesse
perguntar o porquê, peguei um outro jornal e o entreguei para ele.
Mais uma vez, Samuel leu rapidamente a notícia que eu
havia escolhido. Ele sorriu, ainda com o jornal em mãos, e disse:
—
Você adora estar certo, não?
—
Tanto quanto qualquer ser humano. —
Respondi sorrindo.
A notícia era sobre uma entrevista com um apresentador de
um programa de tevê. Um sujeito relativamente conhecido, popular por seu humor
satírico e, na maioria das vezes, fácil de se entender. Porém, quando ele
precisava falar sério, ele falava. E essa entrevista foi uma dessas situações.
Samuel ficou surpreendido ao ver que o tal apresentador
tinha exatamente a mesma opinião que ele sobre as últimas eleições. As palavras
dele eram praticamente iguais às que Ambrose havia acabado de dizer. E é claro
que eu sabia disso. Por isso, sorri largamente.
—
Estamos, de fato, em tempos estranhos... —
Samuel murmurou.
—
Tempos em que palhaços são mais sábios que políticos. — Completei a frase. — Exatamente como eu te disse na primeira vez
que nos falamos.
—
E você veio aqui só para se gabar disso? —
Ele riu. — Não parece
algo que um ser de uma raça evoluída faria.
—
Eu apenas achei que seria interessante lhe mostrar essa notícia. — Eu disse. — Nada mais do que isso.
—
Certo... Só isso?
—
Não. Na verdade, tenho algo a dizer sobre aquela mulher.
—
Ah... — Ambrose
parecia interessado. —
Diga-me.
—
Acho que vou começar a acompanhá-la de perto.
Samuel ficou em silêncio por alguns instantes. Enfim, ele
perguntou:
—
Ela é tão interessante assim?
—
Creio que sim. —
Respondi calmamente. —
O passado dela é... Bem, sofrido.
—
E isso a afetou profundamente.
—
Sim. E isso a deixou forte...e fraca ao mesmo tempo. Vale a pena investigar.
—
Você acha que ela pode vir a se tornar uma aliada para mim? Ou, quem sabe, uma
adversária?
—
Isso eu não tenho como saber...ainda. Mas não espere que eu vá te contar. Quero
que você descubra por você mesmo, está certo?
Ambrose sorriu, ansioso e pensativo. Por fim, ele
respondeu:
—
Certo. Eu irei vê-la...em breve. Quando ela estiver livre.
Eu assenti.
Rapidamente, deixei o carro, teleportando-me para longe,
em direção a Nina Von Brandt.
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