6.
Nina Von Brandt
Em pouco, os guardas da prisão foram derrotados. Aqueles
que não foram mortos no tiroteio foram executados logo em seguida. Isso tudo
por causa do bando de Nina.
As luzes foram acesas.
Angus Haggard e Felicia Guerra lideravam os mais de vinte
fora da lei pelos corredores do Portão do Inferno.
A mulher, que tinha vinte e oito anos e pouco menos de um
metro e setenta de altura, era a terceira no comando do bando. Seu corpo
esbelto era sinuoso. Sua pele morena era naturalmente bronzeada. Seus cabelos
negros e ondulados desciam até um pouco além de seus ombros. Seus olhos
castanhos emitiam um olhar sempre intenso. Seu rosto fino carregava uma pequena
cicatriz abaixo do olho esquerdo e um sorriso que não mostrava os dentes. Ela
vestia uma camisa branca simples e sem mangas, calças com uma estampa militar verde
e coturnos.
Em mãos, Felicia carregava o usual fuzil, arma com a qual
ela havia contado para salvar a própria pele várias vezes. Apesar de impulsiva,
Guerra sabia trabalhar muito bem em equipe e, sem objeções, ia para a linha de
frente com seus subordinados.
O homem, que era sete anos mais velho do que a
companheira, era o braço direito de Nina. Com quase dois metros e dez de altura
e um corpo largo e musculoso, Angus dava medo a praticamente qualquer um sem
esforço. A expressão sombria no rosto alvo, a espessa barba ruiva, o cabelo até
os ombros e os olhos azuis claros também ajudavam no fator intimidação. Entretanto,
sua aparência bruta escondia dos olhos de muitos o estrategista que ele
realmente era.
A metralhadora que o segundo em comando carregava parecia
um exagero. Porém, aquela era a arma perfeita para Haggard. Afinal, caso você
pudesse manejá-la, os resultados poderiam ser devastadores para quem ficasse em
seu caminho. Suas roupas eram simples: uma jaqueta negra sem camisa por baixo
que revelava o peitoral e o abdômen definido, calças com uma estampa militar
azul e coturnos como os de Felicia.
—
Bom trabalho, rapazes! —
Nina sorriu satisfeita ao ver seus homens. —
Eu sempre posso contar com vocês, não é, meus amores?
Haggard e Guerra olharam para os pés de sua líder. Ada
Blanchet estava caída no chão frio da prisão, completamente imóvel.
—
Matou essa daí com as próprias mãos, hein? —
Felicia riu baixo.
—
Não. — Von Brandt
respondeu. — Ela só
está apagada. Recuperando o fôlego, eu diria.
—
Aliás...o que alguém como ela está fazendo aqui? —
Indagou Angus. — Ela
não tem cara de prisioneira ou guarda. Ela tem cara de...
—
Riquinha mimada. —
Completou Nina. — Não
é?
Angus concordou assentindo.
—
E ela é. — A líder do
bando continuou. —
Ela queria me “entrevistar” antes de eu ser morta. Deve ser realmente
interessante para alguém que estuda psicologia, não acham?
—
Deve ser. — Respondeu
Felicia desinteressada.
—
E você a deixou viva para pegarmos uma recompensa? — Perguntou Haggard.
—
É. — Von Brandt concordou
e sorriu. — Pensei
que não faria mal faturarmos uns trocados com esse suvenir.
—
Não é uma má ideia. —
Angus concordou.
—
Demos sorte então, não é? —
Guerra sorriu. — Não
foi nem por isso que viemos para cá. Afinal, tínhamos uma donzela em perigo pra
resgatar.
—
Pois é. — Nina riu. — Mas, agora que derrubamos
uma das prisões mais seguras da região, teremos um pouco mais de respeito, não
é?
—
Realmente mostramos que não somos qualquer bando de criminosos. — Felicia sorriu.
—
Verdade. — Haggard
esboçou um sorriso. —
Mas, caso não saiamos logo daqui, talvez não vivamos para nos gabar disso, não
é?
—
É... — Von Brandt
levou o indicador ao queixo. —
Você pode estar certo. —
Ela suspirou. — Bem,
vamos embora daqui.
Rapidamente, Nina e seus subordinados saíram da prisão.
Angus carregava Ada sobre seu ombro direito. Felicia gritava com os capangas
para que eles se organizassem rapidamente nos carros.
A gangue seguiu a rodovia mais próxima até o seu esconderijo
no Vale do Sol. A cidade era longe de praticamente toda metrópole e, anos
atrás, havia sido devastada pela chamada caça às bruxas. Nenhum super humano
ousava entrar lá, dando mais espaço para os criminosos comuns.
Um casarão abandonado construído na encosta de uma
montanha. Aquele era o esconderijo do bando de Von Brandt.
Os criminosos saíram de seus carros e, em pouco tempo, já
haviam adentrado o casarão.
Nina estava feliz de estar de volta em seu lar. Aquilo
era bem visível em seu rosto sorridente.
Porém, o sorriso de Von Brandt se desfez ao ver sua
visitante na sala principal do esconderijo.
—
Olá. — Disse eu com a
aparência dela. — Estava
a sua espera.
Felicia ficou boquiaberta, confusa. Três capangas, que
estavam entrando na sala, tiveram a mesma reação. Angus parecia ter uma leve
noção do que poderia estar acontecendo. Entretanto, o segundo em comando
decidiu não fazer nada precipitado, ficando apenas parado, observando o
desenrolar da situação.
Nina inclinou a cabeça levemente para a direita ao me
observar por alguns bons segundos. Minha aparência era idêntica a dela. O
cabelo desarrumado, a roupa da prisão, as marcas de sujeira nas bochechas. Eu
não deixava passar um detalhe.
Eu sorri para Von Brandt. Ela sorriu de volta. Então, a
assassina começou a rir e, antes que qualquer um de seus capangas pudesse
perceber, Nina sacou uma pistola e atirou contra mim.
Eu a vi apontando a arma contra mim. Eu poderia ter
desviado. Mas achei melhor não.
O projétil foi de encontro com o meu pescoço, logo abaixo
de meu queixo. A bala se amassou com o impacto, causando nenhum dano a mim, e
caindo no chão rapidamente.
O que havia acabado de acontecer havia causado certo
espanto aos subordinados de Nina. Mas, é claro, sua líder permanecia com um
sorriso no rosto.
Guerra, Haggard e os três capangas sacaram suas armas.
Como estavam dentro de seu esconderijo, os criminosos carregavam com si apenas
facas e pistolas. A exceção era a terceira em comando. Ela e seu fuzil eram
praticamente inseparáveis.
O mais rápido que pude, corri pela sala. Antes que eles
pudessem puxar os gatilhos, suas armas já estavam desmontadas no chão.
Os cinco olhavam estupefatos do chão para mim. Não pude
conter um sorriso. Nem Nina.
—
Muda de aparência, é extremamente rápido, resistente... — Ela começou a falar. — Aparentemente teleporta. Afinal, não sei
mais como você poderia ter chego aqui antes de nós. E acho que não seria
loucura dizer que você já estava me observando antes. — Von Brandt riu escandalosamente. — Ah, e aposto que você nos
observou o caminho todo enquanto nos seguia, não é, senhor Ser De Uma Raça
Superior?
—
Como? — Felicia
parecia realmente surpresa com o que sua líder havia dito.
—
Então... Eles realmente existem... É isso? —
Angus parecia um pouco cético.
Eu ri contidamente.
—
Você está certa, Nina. —
Admiti. — Você é tão
perspicaz quanto eu achei que seria. Tão perspicaz quanto ele disse que você
seria...
Houve um instante de silêncio na sala. O ar parecia mais
gelado. Eu mal podia ouvir a respiração dos capangas de Von Brandt.
—
“Ele”? — Ela exibiu
um sorriso sinistro. —
E quem seria esse seu amigo?
—
Alguém que gostaria de encontrá-la. —
Respondi. — Quando
você estiver pronta, é claro.
—
Certo... — Nina tinha
os olhos fixos em mim. —
Só espero que ele não tenha privilégios por te conhecer antes.
—
Eu duvido muito. Não pretendo me envolver nos assuntos de vocês. Apenas
observar.
—
Observar bem de perto, pelo visto.
—
Sim. — Não hesitei em
concordar.
Mais um momento em que o tempo parecia não passar tomou
conta daquela sala.
—
E você pode me dizer algo sobre esse seu amigo? —
Nina indagou.
—
Ele é bem conhecido. —
Respondi. — Quando
você o ver, já terá algumas respostas.
—
Ok... — Ela pareceu
pensativa. — Então me
responda apenas uma coisa.
—
O que seria?
—
Ele será um aliado ou um inimigo meu?
Eu sorri e respondi:
—
Isso dependerá apenas de você, não é?
Von Brandt riu baixo.
—
Certo, certo... — Ela
olhou pra si mesma. —
Bem... Eu tenho que tomar um banho, me trocar... Afinal, eu não fico bem de
laranja, não é? — A
assassina sorriu e olhou para os seus subordinados. — E vocês poderiam fazer o mesmo, não?
Os três capangas se entreolharam. Nina começou a rir.
—
Acredito que foi apenas uma sugestão... —
Murmurou Haggard.
—
Mas eu tomaria um banho agora sem problemas. —
Disse Guerra. Em seguida, ela se voltou para Angus. — Você poderia a começar as negociações com os
pais da refém, chefe?
—
Claro. — Ele
respondeu. — Eu nem
ia te pedir para fazer isso.
—
Sério?
—
É. Você provavelmente estragaria tudo em um piscar de olhos.
Felicia exibiu um sorriso amarelo.
—
Muito engraçado. — A
terceira em comando disse e, em seguida, deu um soco fraco no braço de Angus. — Já volto, grandão. — Rapidamente, ela olhou
para mim. — E você?
Vai continuar por aqui?
—
Creio que sim. —
Respondi.
—
Ta. Só pra saber...
Após dizer aquelas
palavras, Guerra deixou a sala.
Haggard se voltou, então, para os três capangas e disse:
—
Bem, hora de conseguir um dinheiro com um sequestro. — Ele bateu as palmas das mãos com força. — Vamos!
Sem contrariarem, eles seguiram o chefe pra fora da sala.
Eu me vi sozinho com Nina. Ela sorriu de maneira
simpática.
—
Podemos nos falar depois. —
Von Brandt disse. —
Agora... Banho.
Ela começou a andar em direção à porta quando eu disse:
—
Você seria uma ótima atriz.
Ela se virou e respondeu lisonjeada:
—
Obrigada.
Nina continuou a andar.
Eu me referia ao que ela havia dito para Ada Blanchet.
Tudo o que ela havia contado sobre a sua infância havia sido uma grande e
convincente mentira.
Poucos sabiam sobre a verdadeira origem de Nina. E ela
queria que continuasse assim.
Eu não pretendia interferir na vida dela. Então, não
tinha por que eu revelar aquele segredo a ninguém.
Em breve, eu visitaria mais uma pessoa. Alguém que, na
verdade, eu já havia começado a observar.
Eu não precisava contar para aqueles que eu acompanhava
toda a verdade, não é mesmo?
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