domingo, 13 de setembro de 2015

Um Outro Mundo, Capítulo 3

3.


O desespero logo tomaria conta de Joshua.
O jovem não ousaria parar de correr. Afinal, por mais pesado que fosse, o maníaco era rápido e conseguia se aproximar de seu alvo sem dificuldades.
Felizmente, ele não era muito ágil. O rapaz conseguia se distanciar um pouco do psicopata toda vez que entrava em um beco estreito ou, simplesmente, entrava em uma rua à esquerda ou à direita.
O suor escorria pelo rosto de Joshua. Seu coração batia acelerado. Ele podia sentir a respiração pesada de seu perseguidor em sua nuca, porém, o rapaz já não sabia se só estava delirando ou se aquilo era realidade. Parar para olhar para trás para checar se aquilo era verdade não estava em seus planos.
Os músculos das pernas de Joshua já haviam estavam ardendo. Seu fôlego já estava prestes a acabar. A risada maníaca vindo de trás dele parecia lhe drenar o que restava de energia.
O fim do rapaz teria chego em breve naquele ritmo.
Entretanto, a sorte pareceu sorrir para Joshua.
O jovem entrou em uma série de ruas estreitas, impossível para um carro transitar lá. Pulando por cima de sacos de lixo reviradas no meio do caminho, virando rapidamente a cada curva que aparecia, Joshua conseguiu se distanciar do assassino.
Ao chegar num beco, o jovem avistou uma grande lixeira. O caminho estava parcialmente bloqueado com uma grade de metal. Se ele escalasse aquilo, seria possível se esconder do assassino lá.
Joshua estava receoso com e ideia. Porém, com sua respiração cansada e pernas queimando de dor, o jovem julgou que aquela seria a melhor opção.
O mais rápido que pôde, o rapaz escalou a grade a sua frente. O toque com a superfície gelada de metal fez o corpo de Joshua tremer. Entretanto, ele sabia que não poderia fraquejar agora.
Em poucos instantes, ele já havia pulado para o outro lado da grade. Suas pernas doeram ao aterrissar. Joshua suprimiu seu grito. Uma breve expressão de dor pôde ser vista em seu semblante.
Rapidamente, o jovem correu para trás da lixeira, fora do campo de visão de qualquer que olhasse para o beco.
Os passos pesados pareciam se aproximar novamente, bem como a risada maníaca.
Joshua torcia para que seu plano desse certo.
O rapaz encostou suas costas na lixeira. No mesmo instante, ele desabou, caindo sentado no chão gelado.
Joshua respirou fundo, diversas vezes. Ele nem se importava com o cheiro do lugar. A oportunidade de poder respirar com calma era tudo o que ele queria.
Os passos pesados do gigante se tornaram mais altos.
Tenho que admitir... Soou a voz do assassino. Você sabe correr bem, Coelhinho! Ele riu histericamente. Aliás, já como eu não sei o seu nome, é assim mesmo que eu vou te chamar: Coelhinho! 
O psicopata riu novamente. A cada palavra dita, ele parecia elevar mais a voz.
O coração do rapaz batia cada vez mais rápido. Ele sentia todo o seu corpo tremendo a cada batimento cardíaco.
A cada instante que se passava, o gigante se aproximava mais de onde Joshua estava escondido.
Se você não gostou do apelido, dê uma outra sugestão! Ele riu. Eu sou bem mente aberta. E também gosto de abrir a mente das outras pessoas... Se é que você me entende. O assassino gargalhou. Aí, aí...
De repente, Joshua percebeu que os passos, a respiração e até mesmo a voz do maníaco estavam se distanciando dele.
O corpo do jovem pareceu relaxar por completo.
Joshua percebeu que suava frio. Nada mais normal, uma vez que nunca havia passado por uma situação daquelas.
O rapaz julgou melhor aguardar alguns instantes antes de deixar o beco. Ele preferia que o assassino estivesse o mais longe possível antes de voltar a correr. Aproveitar a chance de descansar mais um pouco também seria benéfico.
Para compensar o corpo quase morto, a mente de Joshua nunca pareceu estar mais ativa.
Ele tentava assimilar tudo o que havia acontecido, do gato preto à aparente dona do animal, da jovem morta diante de seus olhos ao maníaco que o perseguia.
O rapaz tentou se lembrar de outras vezes que sentiu um medo que parecia o consumir.
Ele se lembrou de quando havia se perdido dos pais em um parque de diversões quanto tinha seis anos, de quando acabou tendo que brigar com um colega de classe muito mais forte que ele aos treze anos, de quando fora vítima de um programa de pegadinhas e foi perseguido por um “fantasma” aos dezenove anos.
Parando para pensar nisso agora, Joshua teve que rir. Todas essas foram situações ridículas. Pelo menos, quando comparadas com a que ele passava agora.
Como de costume, ele se lembrou de Adriana. O medo que o rapaz sentiu ao perceber que teria que viver sem ela há pouco tempo atrás.
O último pensamento o deixou mais triste do que qualquer outra coisa.
Entretanto, quando o tópico era medo, uma imagem tinha que surgir em sua mente: seu vizinho.
Joshua já tivera vizinhos estranhos, bem como praticamente qualquer outra pessoa. Entretanto, o senhor Estmund era diferente. Ele, que talvez já tivesse um século de vida, estava sempre elegante, apoiado em sua fiel bengala de carvalho. Vestido sempre formalmente, o velho tinha uma aura fria. Seus olhos eram a pior parte. Eles encaravam Joshua, sem vida, como se estivesse tentado analisar o jovem.
O mal estar fez com que o corpo do rapaz treme-se.
Realmente, quando ele encontrava o vizinho no corredor do prédio, uma sensação de medo comparável com a atual o atingia.
Joshua passou mais alguns instantes sentado. Ele queria sair logo do lugar, entretanto, caso fosse necessário correr, o rapaz precisaria que suas pernas não o falhassem.
De repente, um som veio da parede ao seu lado. Três toques rápidos. Alguém parecia estar batendo nela como em uma porta.
Joshua, obviamente, estranhou o som vindo da parede de tijolos.
Após algumas sequencias de três batidas, simplesmente, os sons pararam.
O jovem resolveu se levantar.
Ele não sabia o que era aquilo, porém, Joshua não se sentia mais confortável lá.
Subir na lixeira para, então, pular para a grade parecia a rota de saída mais prática.
Joshua respirou fundo e torceu para que suas pernas aguentassem.
Rapidamente, o rapaz subiu em cima da lixeira.
No mesmo instante, a parede ao seu lado se quebrou.
Tijolos escuros foram lançados para frente. Uma nuvem de poeira se levantou. Uma risada histérica soou.
Onde está o meu Coelhinho!? O assassino perguntou animado.
Ao ver a silhueta monstruosa do maníaco por entre a nuvem de poeira, Joshua se voltou para frente. O mais rápido possível, ele pulou sobre a grade de metal e caiu, de joelhos, do outro lado.
O rapaz se levantou, ignorando a dor nas pernas e voltou a correr.
Entretanto, não demorou muito para que a parede atrás dele se quebrasse.
Joshua não precisava olhar para trás para saber que o maníaco estava, mais uma vez, próximo dele.
Corra, Coelhinho! Corra! O gigante gargalhou.
Novamente, o jovem corria do psicopata. Novamente, o rapaz contava com todas as curvas que aparecessem para tentar se distanciar de seu predador.
Entretanto, havia algo diferente desta vez.
A névoa densa parecia cada vez alta e espessa, dificultando a visibilidade, envolvendo o rapaz.
Agora, Joshua mal conseguia ver um metro a sua frente.
O pensamento que ele poderia correr contra uma parede ou, então, cair em um buraco passou pela mente do jovem. Porém, não foi isso o que aconteceu.
Após alguns instantes, que pareceram horas para Joshua, a névoa se dissipou.
O rapaz, mesmo correndo para fugir de um psicopata, acabou percebendo as mudanças.
Os prédios a sua volta não tinham mais janelas, portas ou qualquer outro detalhe. Era como se todos eles tivessem se unido em uma grande muralha escura. Os postes de luz também haviam desaparecido. Entretanto, as ruas continuavam iluminadas, quase como se a luz brilhasse mais intensamente.
Enquanto fugia de seu perseguidor, Joshua percebeu que ele não tinha mais escolha. A rua era contínua. Sempre que uma curva aparecia, era apenas um único caminho disponível.
Um mau pressentimento o atingiu. A sensação de que ele estava sendo guiado para algum lugar era inquietante.
Joshua estava ofegante novamente. Suas pernas, e até mesmo seu abdômen, ardiam. Seu cabelo estava encharcado de suor. Apesar do frio, o rapaz parecia não aguentar o calor que sentia após tanto correr.
O jovem queria tanto poder parar de correr que se arrependeu do desejo.
Não demorou muito para que Joshua se deparasse com o fim de seu caminho.
Ele não queria acreditar. Depois de tanto fugir. Depois de tanto sentir tanto medo. Depois de quase morrer múltiplas vezes aquele era o fim de Joshua.
O jovem não pôde evitar ficar irritado.
Ora, ora... A voz já familiar veio de trás dele. Parece que o Coelhinho não tem mais pra onde fugir...
Joshua olhou para trás.
 O maníaco tinha um largo sorriso no rosto. Ele ria baixo enquanto andava lentamente na direção do jovem. Junto ao seu cinto, estava apenas uma das facas prateadas. A outra lâmina estava na mão direita do maníaco.
Fazia tempo que ninguém fugia de mim por tanto tempo... O gigante murmurou. Por isso, parabéns, Coelhinho... Ele gargalhou. Mas, agora, chegou o seu fim...
O rapaz olhou para o assassino. Com um largo sorriso aterrorizante no rosto, ele mirou sua faca contra o peito de Joshua e, em um instante, arremessou-a.
A lâmina prateada atravessou o ar rapidamente, brilhando sob a luz da lua.
Entretanto, Joshua não havia desistido de viver. Pelo menos, não ainda.
Rapidamente, o jovem se jogou para a direita, caindo de joelhos enquanto a faca se cravava na parede de tijolos.
Sem escapatória e ainda se recusa a morrer? O psicopata gargalhou. Eu gosto do seu jeito, Coelhinho! É uma pena ter que te matar, mas...
O gigante parou de falar ao ver que, rapidamente, sua presa havia se levantado e se dirigido até a faca na parede.
Com um puxão brusco, Joshua retirou a lâmina da parede e a apontou contra seu perseguidor.
O gigante não conseguiu fazer nada a não ser olhar para o alto e começar a gargalhar.
Achando que pode me enfrentar? Ele sorriu. Coelhinho, como eu te adoro! Que pena que eu tenho que te matar, não é?
Antes que Joshua pudesse dizer ou fazer qualquer coisa, o maníaco sacou a segunda faca e a arremessou.
O rapaz estava pronto para ter que desviar da lâmina. Entretanto, ele não teve que fazer isso, já que a faca arremessada pelo gigante se cravou bem diante de seus pés.
Você quer lutar, Coelhinho? Ele indagou. Então se prepare!
Um pouco receoso, Joshua retirou a faca do chão com força.
Armado com duas facas agora, o jovem olhou para o adversário. A montanha de músculos cinzentos sorria para ele.
Agora! O assassino bradou.
Com isso, o gigante correu na direção de Joshua, praticamente rosnando como um animal.
O jovem começou a tremer. O medo iria o dominar.
O tempo parecia passar vagarosamente na mente de Joshua. Ele apertou os cabos das facas em suas mãos com firmeza. Ele, que raramente esteve em uma briga a vida toda, teria que tirar a vida de um homem, se aquilo realmente fosse humano, para poder viver.
O maníaco abaixou o tronco enquanto se aproximava de Joshua. O jovem logo pensou em atacar as costas, ou talvez até a nuca, do inimigo.
Entretanto, o ombro direito do maníaco acertou a cintura do jovem.
O impacto fez com que Joshua derrubasse as lâminas antes que pudesse atacar.
O golpe jogou o rapaz contra a parede que, como se fosse feita de vidro, quebrou-se no instante do impacto.
Após o ataque, o gigante ainda segurava Joshua pela cintura, carregando-o enquanto corria em direção ao buraco que havia aberto, gargalhando animado.
A cabeça de Joshua estava girando. Ele não sabia o que havia ao seu redor. Entretanto, após alguns instantes, ele percebeu que não havia nada: a sala era como um grande cômodo vazio imerso nas sombras.
Ao perceber isso, o jovem caiu de costas no chão, emitindo um grito baixo de dor.
O maníaco riu. Joshua se levantou para olhar para ele.
O Gigante estava parado, a pouco mais de dois metros do rapaz, com os braços cruzados.
Olha... Me diverti muito hoje, sabe, Coelhinho? Ele sorriu largamente. Por isso, quero que você viva até a próxima vez que nos encontrarmos, ok? Quero me divertir mais com você antes de te matar, Coelhinho...
Com uma risada baixa e grave, o assassino deu meia volta e, calmamente, andou para fora da sala escura, afastando-se de Joshua.
O rapaz respirou aliviado. Lentamente, ele se levantou. Seu corpo inteiro doía, mas ele não pensou nisso.
Joshua havia conseguido escapar do maníaco, mesmo que por um tempo limitado.
Agora, sua preocupação era como sair daquele lugar.
O jovem não pretendia voltar por onde o gigante havia saído. Assim, ele resolveu olhar em volta, na escuridão.
Surpreendentemente, não foi difícil achar uma saída.
Atrás de onde ele estava, há alguns metros de distância, uma luz amarela brilhava.
Receoso, porém, sem muita alternativa, ele seguiu pelas sombras.
A cada passo que ele dava, seu corpo doía mais. Porém, o frio ia diminuindo, bem como a escuridão que ia se dissipando.
Em alguns instantes, Joshua chegou até uma parede translúcida, praticamente impossível de ser vista. A luz amarela passava facilmente por ela.
Lentamente, ele levou a mão esquerda até a parede. Entretanto, ele não a conseguiu tocar. Seus dedos a atravessaram como se não houvesse nada lá.
Convencido de que realmente não havia uma parede em seu caminho, Joshua deu um passo largo.
Rapidamente, o jovem se viu na sala iluminada pela luz amarela. Parecia o subsolo de algum lugar, com paredes cinzentas rachadas, cheio de sacolas de lixo em um canto e uma escadaria não muito longe de onde ele estava.
Joshua olhou para trás. Na passagem por onde ele tinha atravessado havia, agora, uma parede.
Novamente, o jovem iria questionar sua sanidade. Entretanto, alguém aparecia para esclarecer as coisas.
Creio que você tenha muitas dúvidas sobre o que acabou de acontecer. Disse uma voz profunda.
Joshua sabia que já tinha ouvido a voz. Porém, seu interlocutor havia falado com ele tão poucas vezes que era normal ele não reconhecer a voz de imediato.
O jovem se virou e sentiu medo.
Na escadaria, um homem de quase um metro e noventa, vestido um terno cinza, encarava Joshua. Sua pele era cor de café. Seus dedos, ossudos, pareciam garras apoiados numa bengala de carvalho. Sua cabeça era calva. Sua barba grisalha era bem aparada. As rugas no rosto eram esperadas dada a idade avançada. Seus olhos pretos e mortos, sem brilho algum, pareciam ver além de onde o rapaz estava.

Se ainda conseguir andar, venha. Disse o senhor Estmund. Quero explicar isso o mais rápido possível.

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