terça-feira, 29 de setembro de 2015

Um Outro Mundo, Capítulo 7

7.


Se Estmund havia dito alguma coisa, o rapaz não tinha ouvido.
Joshua agora corria até as escadarias, sem pensar direito, com o coração batendo acelerado.
A ideia de pegar o elevador foi logo descartada. O rapaz não aguentaria ficar parado, esperando o elevador chegar ele e, depois, ao térreo.
Seus passos rápidos e desajeitados ecoavam pelos corredores do prédio.
Degrau após degrau, lance de escada após lance de escada, o jovem chegou ao saguão.
Joshua acelerou o passo. Na saída do prédio, ele trombou com uma senhora, também moradora do prédio. Ele nem percebeu se ela havia caído ou não e também não pararia para verificar. Tudo que o rapaz poderia fazer era esperar que ela estivesse bem.
Entretanto, por mais desfocado que Joshua pudesse estar com o mundo a sua volta, ignorar o tempo a sua volta era impossível.
Chovia torrencialmente. Os ventos, fortes e gélidos, pareciam vir de todas as direções, uma de cada vez. Os raios traziam cor ao céu cinzento, coberto de nuvens. Os sons das buzinas e dos carros correndo nas ruas pareciam não existir quando comparados aos trovões incessantes.
Entretanto, nada disso fez com que o ritmo de Joshua diminuísse.
O caminho era uma cainhada tranquila de praticamente trinta minutos. Se fosse possível, o rapaz chegaria até a casa de Adriana em cinco minutos.
Correndo por entre as pessoas com guarda-chuvas e desviando de postes e latas de lixo, ele deveria estar parecendo um louco fugindo de algo. Porém, o jovem não se importava, afinal, ele nem tinha tempo para pensar nessas coisas.
O som das poças espalhando água sob os pés do rapaz a cada cinco passos ou menos já havia se tornado algo normal. Seus tênis, já encharcados, começavam a incomodar o rapaz. Seus pés começavam a doer. Sua respiração estava se tornando ofegante. O jovem estava longe de estar completamente recuperado após tudo o que havia passado.
Além disso, Joshua já havia sido quase atropelado, pelo menos, seis vezes. Uma das vezes ele deslizou por cima do capô de um carro. É claro que os motoristas o xingaram por ter se atirado no meio do trânsito com o sinal verde, mas Joshua nem percebeu. Ele apenas sabia que não tinha tempo a perder. Afinal, qualquer nova preocupação era insignificante no momento.
Ofegante e sem saber quanto tempo havia se passado, Joshua chegou até a rua de Adriana.
Involuntariamente, seu corpo relaxou.
O coração do rapaz começou a bater mais rápido.
Seu corpo mais parecia um estorvo no momento. E foi pensando assim que ele, cambaleando, quase se arrastando, seguiu até a casa no fim da rua.
Trincando os dentes, tentando ignorar toda a dor que se acumulou em seu corpo, Joshua chegou até a porta da humilde casa de Adriana.
Centenas de memórias poderiam ter vindo a sua mente. Entretanto, ele não conseguiria se lembrar delas agora nem se ele quisesse. Sua mente estava tão funcional quanto o seu corpo.
Apoiado contra a porta, Joshua apertou a campainha.
Uma, duas, três vezes.
Sem resposta.
Ele apertou mais uma vez. Agora, sem soltar o dedo da campainha.
O som agudo se prolongou por dez segundos.
Ainda assim, não houve resposta.
Exasperado, Joshua socou a porta.
Uma, duas vezes. Na terceira, ele bateu com mais força.
Sem resposta.
Em seguida, ele se jogou contra a porta, batendo o ombro com força contra a superfície de madeira.
Joshua soltou um grito de raiva.
Mais uma vez, o jovem se jogou contra a porta.
O som que veio a seguir não era esperado.
Ao invés de uma resposta, Joshua ouviu o som da porta de madeira cedendo, soltando-se de suas dobradiças enferrujadas e caindo para dentro da casa com o rapaz em cima dela.
O rapaz respirou apressadamente, recuperando-se do susto.
Rapidamente, Joshua se levantou e olhou para o interior da casa.
O lugar fora herdado por Adriana após a morte de uma de suas avós. Não muito grande, velha, com algumas rachaduras, precisando de algumas demãos de tinta, mas, apesar disso tudo, era lá o lar de Adriana e, até pouco tempo atrás, de Joshua também.
Naquele dia cinzento, sem sua amada, o jovem poderia jurar que o lugar estava com uma aparência ainda mais decadente.
Joshua acendeu o interruptor do corredor. As luzes funcionavam perfeitamente. Aquilo o relaxou um pouco.
Adriana! O jovem gritou. Querida...!
Como antes, não houve resposta. Entretanto, isso não impediu Joshua de continuar chamando por sua amada enquanto vasculhava a casa.
Em pouco tempo, o rapaz já estava suando frio, com o corpo tenso, perdendo as esperanças.
A cada chamada não respondida, a cada cômodo vazio vasculhado, a cada passo dado, a cada instante que se passava Joshua ficava com mais medo. Afinal, durante todo o tempo passado na procura de Adriana, ele sabia que o pior já poderia ter acontecido. Entretanto, ele continuou negando a hipótese, esperando a encontrar de alguma forma.
Eventualmente, porém, Joshua teria que ceder.
Após o que pareceu uma eternidade, o rapaz caiu sentado no corredor da casa, não muito longe da porta que viera abaixo, com as costas numa parede. Ele levou as mãos ao rosto, fazendo com que o grito de frustração que veio a seguir fosse abafado.
Joshua não tinha mais como negar. Adriana se foi. E ele não pôde fazer nada.
Me desculpe... Ele murmurou, começando a chorar. Eu não pude fazer nada...
Mas que cena patética... Uma voz zombou com certo nojo.
Joshua ficou paralisado por um segundo. A voz feminina lhe era familiar. Por um instante, ele chegou a pensar que era Adriana. Mas não poderia ser. Não com aquele jeito de falar.
Lentamente, o rapaz abaixou as mãos e olhou para frente.
Diante dele estava uma mulher pálida, extremamente magra, um pouco mais baixa que ele, vestida no que mais parecia ser um vestido de noiva completamente negro. Sob o véu, belo seu rosto era bem visível, principalmente seus lábios cor de carmim e olhos cor íris escarlates.
Não sei como sobreviveu àquele inferno na Terra... A mulher falava, com certo desinteresse, enquanto ajeitava os cabelos castanhos escuros que caíam sobre os ombros. Mas você pode me contar os detalhes no caminho.
Ah... Joshua parecia estar tonto de tão confuso. E você...?
Antes que o jovem pudesse terminar sua pergunta, uma foice surgiu nas mãos da mulher.
Com um movimento rápido, a ceifadora apontou a lâmina prateada contra o pescoço de Joshua, a milímetros da pele dele, e disse:
Sou uma amiga de Estmund. É tudo o que vou te contar. Por ora, pelo menos... Ela sorriu sem mostrar os dentes, porém, mantendo-se ameaçadora. Agora... Venha. Sem mais um pio até eu lhe conceder a permissão, entendeu?

O rapaz assentiu. A ceifadora afastou sua foice do pescoço dele. Rapidamente, Joshua se levantou e a seguiu porta afora. 

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