Capítulo 5
A criatura avançou, desferindo um ataque rápido.
Com um passo largo para trás, Damian conseguiu se esquivar
do primeiro golpe. Porém, mais vieram em seguida.
Na esquerda para direita, de cima para baixo, traçando
diagonais. A espada do monstro parecia dançar pelo ar através da névoa dourada.
Com medo estampado no rosto suado, Damian não conseguia
fazer nada a não ser desviar dos golpes. Não demorou muito para que suas costas
atingissem a parede atrás dele.
O caminho havia mudado. Agora, não havia mais saída. Era
como uma armadilha. Sua única alternativa era lutar, coisa que ele, em pânico,
parecia incapaz de fazer.
—
Não consegue mais se lembrar do que eu disse? —
A voz perguntou calmamente dentro da mente do rapaz.
O tempo parecia correr vagarosamente. O monstro em sua
frente mal parecia uma estátua perfeita, tendo até mesmo as suas chamas
paralisadas.
—
Ou você estava simplesmente não prestando atenção? — A voz continuou.
Damian não conseguia responder. Seus lábios não se mexiam.
Nada nele se mexia. Nem respirando ele estava.
—
Não tema, eu disse... —
A voz parecia irritada agora. —
Não tema absolutamente nada. Se você teme que alguma coisa possa te ferir,
fira-a antes que ela tenha a chance de te fazer mal... — As palavras se tornaram mais altas e graves,
cravando-se na mente do rapaz. —
Mate-a antes que ela te mate. Mate não apenas para sobreviver... Mate para viver.
Seja o mais forte. Faça esse mundo se curvar perante a você. Mostre que é capaz
disso... Mostre para mim que você é capaz disso.
Então, o tempo voltou a correr normalmente.
O monstro, que avançava para atacar, foi obrigado a levantar
o escudo.
Damian atacou rapidamente. A força de seu golpe
desequilibrou o monstro, derrubando-o sobre os próprios joelhos.
A criatura rugiu. O guerreiro trincou os dentes. O medo que
havia em sua face havia sumido. No seu lugar veio uma determinação descomunal,
uma vontade quase selvagem de matar seu inimigo.
Mais três golpes de Damian. Seu oponente nada pôde fazer a
não ser defender os ataques rápidos como raios.
Para a próxima espada, o guerreiro usou mais força. Com as
mãos apertando o cabo da arma o mais forte que podia, Damian atacou soltava um
urro.
A força do golpe arremessou a criatura para trás. Com as
costas no chão, o ser vil gritou de dor enquanto o guerreiro cravava a espada
de aço em seu peito.
Impotente, a criatura soltou sua espada e tentou levar suas
garras até a arma de Damian. Em vão.
Antes que o monstro pudesse agarrar a espada, o guerreiro a
arrancou de seu peito. Com um último grito, a criatura morreu.
Sangue não verteu do corpo recém morto. Suas chamas, porém,
soltaram-se da carcaça, flutuando lentamente para o alto, dispersando-se névoa
dourada que parecia, agora, um pouco mais escura.
—
Muito bom. — A voz
disse. —Mas não pense
em parar agora. Afinal, existem mais desses por aí...
Damian sorriu, não exatamente como se estivesse feliz,
apenas contente com o desafio. Seus olhos, antes repletos por medo, agora
pareciam brilhar com sua vontade de lutar. Suas mãos, antes trêmulas, agora
seguravam sua espada com uma determinação inabalável.
Correndo pelos corredores cinzentos, Damian não mais
pensava. Ele ia à procura dos monstros. Pouco após o primeiro confronto, o
rapaz já havia decidido que ele não seria a presa naquele labirinto. Nos que
viriam, ele faria qualquer um ter certeza de quem era o predador naquele
inferno.
Um. Dois. Até três de uma vez. Não importava quantos eram. Como
lobos famintos, as criaturas iam até o rapaz. Brandindo sua espada, ele os
saudava.
Machados, espadas, martelos de guerra. Não importava as
armas que manejassem. Não importava se fosse maiores que o guerreiro. Não
importava nem mesmo que conseguissem o surpreender. Damian não soltava sua
espada mesmo as garras de um dos monstros envolta de seu pescoço. O jovem
reagia sem sentir medo, derrotando força com velocidade e velocidade com força.
Imbatível, o guerreiro andava triunfante pelo labirinto
cinzento, brandindo inquietamente sua espada, esperando um novo adversário.
Após algum tempo, os monstros não mais vinham. Damian não sabia dizer se haviam
fugido ou se, talvez, estavam todos mortos.
Entretanto, o rapaz não questionava isso. Nem mesmo
questionava a voz que não falava com ele há algum tempo. Ele apenas vagava
pelos corredores preenchidos pela névoa escarlate à espera de uma nova presa.
De repente, então, veio um novo som. Era o de algo, como um
baú, sendo destrancado.
Damian se voltou para trás, na direção do ruído,
deparando-se com uma nova parede. Nessa, entretanto, havia um portão. Seus
ornamentos, bem como as inscrições nela, eram feitas de ouro.
Mas nada daquilo importava para o rapaz. Ele havia ouvido o
som de antes. Se o portão estivesse destrancado, Damian apenas precisava
abri-lo.
O guerreiro colocou a espada nas costas e, então, empurrou
as duas pesadas portas.
Enquanto elas se abriam lentamente, causando estrondos
enquanto se movia, a névoa se infiltrava na sala escura, iluminando o ambiente
com sua luz vermelha.
Damian adentrou, então, em um salão tão vasto quanto uma
sala do trono. Cada superfície do lugar era constituída pelos tijolos e
ladrilhos cinzentos de antes. O teto era pelo menos duas vezes mais alto do que
no resto do labirinto. Haviam tochas nas paredes, porém, estavam apagadas.
O lugar estaria vazio. Isso é, se não fosse uma presença no
centro da sala.
Por entre a névoa, uma estátua parecia se mover. Ilusória,
ela ia de um canto ao outro da sala, desaparecendo quando encoberta pela névoa
densa, surgindo em um ponto mais visível da sala.
— Ali
está o último. — A
voz disse, quebrando o silêncio.
Damian sacou sua espada, segurando seu cabo com firmeza.
Não era difícil de se acreditar que o objeto fosse algum
tipo de disfarce da criatura. Porém, enfrentar algo que se movia daquele jeito
poderia ser um problema. O monstro poderia atacar vindo de qualquer lado.
—
Não tema... — Damian
murmurou. — Não tema
absolutamente nada...
O guerreiro repetiu as palavras que a voz havia proferido.
Como um mantra, ele repetiu a frase em sua cabeça, andando alerta na direção da
estátua, pronto para atacar a qualquer instante.
A cada passo dado, Damian podia perceber que a estátua se
movia cada vez menos, limitando a distância para onde se movia a cada instante.
Não demorou muito para que o rapaz percebesse o truque e,
rapidamente, andar calmamente até a estátua.
A névoa parecia refletir a imagem no centro da sala. Ora
maior, ora menor, ora mais perto, ora mais longe. A ilusão se movia
incessantemente enquanto o objeto permanecia no lugar.
—
Era só isso? — Damian
conteve o riso.
A estátua, que trajava uma armadura negra que a fazia
parecer um Demônio feito de metal, continuava imóvel. A aparência intimidadora
com garras, presas e espinhos espalhados pela carapaça de aço não surtia efeito
sobre Damian. Se aquilo era um teste de coragem, o rapaz o venceria sem
problemas.
—
Acabe com ele! — A
voz ordenou.
—
Se assim deseja... —
O jovem murmurou.
Com a espada em mãos, Damian atacou. O som de metal se
chocando contra metal ecoou pelo salão.
O golpe desferido pelo guerreiro deveria ter quebrado a
estátua, fazendo com que seus pedaços desmoronassem juntos com as peças da
armadura. Porém, não foi isso o que ocorreu.
Damian foi surpreendido. A estátua havia bloqueado o seu
ataque. Em suas mãos revestidas de aço negro, uma espada brutal havia surgido,
defendendo-o do golpe do guerreiro.
Uma rajada de vento gélido varreu a sala. As tochas se
acenderam em seguida, dissipando a névoa escarlate e iluminando o lugar com
chamas verdes. O ar, entretanto, continuou tão pesado quanto estava, denso como
uma neblina.
O monstro grunhiu. De dentro de seu elmo, chamas cor
esmeralda brilhavam pela sua boca e olhos antes vazios.
Cada um deu um passo para trás, ambos brandindo suas
espadas. A criatura rosnou, o que fez com que o fogo verde saísse de sua boca
como se fosse sua saliva. Damian, diante do desafio, sorriu. Seus olhos
brilhavam com o desejo de lutar.
Palavras
não eram trocadas naquela luta. Fora alguns urros e gritos antes de atacar, os
dois nem abriam a boca.
O
som de metal contra metal ecoava a cada instante no salão. Para cada ataque
desferido por Damian, o monstro sabia o movimento certo para se esquivar ou se
defender. Entretanto, o inverso também ocorria. Nenhum dos dois deixava a
guarda aberta por tempo o suficiente para um finalizar o outro.
Algo
foi se mostrando muito claro durante a luta que parecia se estender por
minutos: eles eram equivalentes. Damian era tão forte quanto o monstro. O mesmo
podia ser dito sobre sua agilidade e raciocínio durante o combate. Até mesmo
suas técnicas eram as mesmas.
O
duelo seria vencido pela resistência, pela força de vontade do vencedor. E
assim foi.
Golpe
após golpe, esquiva após esquiva, bloqueio após bloqueio. Damian estava
claramente cansado. Sua respiração estava ofegante. Seu rosto, suado. Seu corpo
se movimentava cada vez mais devagar sob o peso da armadura. Seus braços doíam.
Carregar a espada já estava se mostrando ser um grande esforço. Atacar, então,
fazia com que seus músculos ardessem.
O
monstro, porém, entretanto, não estava diferente.
Damian
não conseguia dizer se oponente estava cansado por expressões faciais, é claro.
Porém, seus movimentos também estavam mais lentos, fracos e desleixados. Até
mesmo suas chamas verdes pareciam menos intensas do que antes.
O
combate não tinha mais a mesma intensidade para quem assistia. Porém, para quem
estava se desgastando com a luta, o sentimento era outro: o tempo investido
naquele duelo era algo que faria a vitória ter um gosto ainda melhor.
Então,
finalmente, o inevitável aconteceu: com um golpe mais forte do que o monstro
poderia prever, Damian atacou. Uma espada foi contra a outra. A da criatura foi
lançada para longe de suas garras.
Um
surto de energia atingiu o guerreiro. Com um sorriso e um brilho nos olhos,
Damian desferiu seu último ataque.
A
espada atravessou a carapaça do monstro, transpassando o centro de seu torso,
como se não fosse nada. Com seu último suspiro, a criatura tentou dizer alguma coisa
que acabou não saindo de sua garganta.
Então,
o cenário mudou.
As
chamas das tochas se tornaram vermelhas, comuns. O ar parecia mais leve, de
volta ao normal. E o monstro em frente a Damian também havia mudado, de volta a
sua forma original.
— Não... — Murmurou o guerreiro, incrédulo.
Ele
soltou a espada. O corpo caiu imóvel no
chão.
O
elmo estava sobre sua cabeça e o visor estava abaixado, porém, Damian
reconheceria aquela armadura e espada bem polidas, brilhantes como prata, em
qualquer lugar.
— Sebastian... — Ele mal conseguia dizer seu nome. — Como...?
— Muito bem... — Disse uma voz grave que Damian já estava tão
bem acostumado. Dessa vez, porém, ela não vinha de dentro de sua cabeça.
O
guerreiro se voltou para a direita, na direção da voz. Lá, uma nova criatura
havia surgido.
O
monstro tinha, pelo menos, o dobro da altura de Damian. Seu corpo era um
esqueleto humanoide monocolor, negro como carvão. Entretanto, haviam várias diferenças
em relação ao de um humano. Chifres como
o de um bode saiam do topo de seu crânio espesso. Placas, que mais pareciam ser
de aço, cobriam o peitoral, braços e pernas como uma armadura. Asas gigantescas,
constituídas apenas de ossos pretos, cobriam as costas da criatura como uma
capa.
Envolto
por chamas verdes, o Demônio sorriu.
— Eu sabia que
você conseguiria... — Ele gargalhou.
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