domingo, 20 de dezembro de 2015

Conto de Terror 12 - Parte 1

Dr. Asmodeus


O jovem acordou com abruptamente.
Com um solavanco, ele levantou o tronco, sentando no chão gelado.
Sua respiração estava ofegante e acelerada. Ele soava como se tivesse quase morrido afogado, sendo salvo no último instante.
Suas memórias estavam turvas, fragmentadas. Seu corpo estremecia de dor toda vez que ele inspirava ou expirava. O cheiro pútrido que pairava no ar não melhorava a situação.
O rapaz olhou para frente. Uma porta de barras de ferro bloqueava a passagem, mas permitia a entrada de um pouco de luz. Ele estava, aparentemente, numa cela.
O jovem não fazia ideia de como havia chego ali.
Olha só quem acordou... Disse uma voz atrás dele.
Rapidamente, o jovem se voltou para trás. Ele, então, viu sua interlocutora.
Uma mulher estava sentada no chão com as costas apoiadas numa parede. Sob as sombras, ela permanecia como uma silhueta para o rapaz.
Já estava na dúvida se você estava vivo... Ela disse com a voz arrastada, claramente cansada.
Hm... O jovem limpou a garganta. Quem é você...? E onde estamos...?
Eu me chamo Marie... E estamos num show... Pelo menos, de acordo com Asmodeus... A mulher bufou. Aquele desgraçado...
Ah... Certo... Ele levou uma mão à cabeça. E como eu cheguei aqui?
Se você não sabe, não tem como eu saber. Você estava apagado desde antes de vir para cá?
Eu... Eu não sei.
Não se lembra de nada?
Não muito... Ele balançou a cabeça para os lados. Em seguida, ela começou a latejar. Desculpa...
Hm...
Marie se levantou, andando calmamente até o rapaz.
Ele se espantou com a visão. Com seus olhos arregalados, o rapaz viu detalhadamente Marie. Sob a luz fraca, suas roupas em frangalhos e manchadas de sangue eram difíceis de não se notar. As bandagens, agora amareladas, cobriam braços, pernas e até o topo esquerdo de sua cabeça. As poucas partes de sua pele cor de caramelo que estavam visíveis eram marcadas por cicatrizes. Esse era o caso de sua bochecha esquerda, por exemplo. A marca avermelhada seguia de seus lábios até quase sua orelha esquerda.
Com seu único olho verde descoberto, ela fitava o rapaz atentamente.
O que aconteceu com você...? O jovem indagou chocado.
O show de Asmodeus. Ela respondeu secamente. Foi isso o que aconteceu. Mas... Marie fez uma breve pausa. Quanta a você... Eu não sei dizer...
Como assim?
Olhe pra você mesmo.
Ele não questionou. Olhar de relance para seus braços foi o suficiente para fazer seu coração disparar.
Mas o quê...? Ele arfou.
Toda a superfície de seu corpo estava coberta por faixas. As suas, brancas, pareciam bem recentes.
Lentamente, o rapaz se levantou. Os músculos de suas pernas pareciam queimar com a dor.
Isso pode ter acontecido depois que o Asmodeus brincou com você. Disse Marie sem entusiasmo. Ou, então, antes mesmo de você vir para cá. Enquanto sua memória estiver assim, não temos como saber.
E esse tal de Asmodeus? Ele indagou. O que exatamente ele faz?
Basicamente, ele te tortura pelo entretenimento de uns merdas doentios.
Como assim...?
Ele te arrasta para alguma sala, digamos, privada. Lá, ele vai fazer o que as pessoas pagam para ele fazer. Arrastar a lâmina de uma faca pelo seu corpo... Cortar algumas partes... Queimar outras... Qualquer coisa que quiserem.
Hm... O jovem assustado. E isso aconteceu com você...?
É. Ela apontou para as bandagens no rosto. Ta vendo isso?
Sim...
Não ache que eu tenho um olho aqui m baixo, ok?
Ah... Ok...
Isso sem contar com o que ele fez pelo resto do meu corpo... Com a merda daquela faca... Marie estremeceu. O desgraçado riu o tempo todo... Ele tinha a droga dum sorriso no rosto enquanto passava a ponta daquela faca como se fosse a porra dum pincel, como se eu fosse uma obra de arte dele... Isso porque alguém pedia aquilo. Ela trincou os dentes. Eu ouvia a voz de alguém vindo por uma caixa de som. Algum pau no cu pervertido tava se divertindo vendo aquilo de algum lugar, tenho certeza. A voz daquele bosta me dava essa certeza... E imagino que ele deva ter pagado uma boa grana pra ver aquilo. A mulher bufou. E sabe a pior parte...?
O jovem não conseguia dizer nada. Praticamente paralisado, ele apenas ouvia o que Marie dizia.
Enquanto eu chorava e gritava amordaçada, eu ouvia a voz daquele merda mandando o Asmodeus levar a faca dele até... Ela cerrou os punhos. Até a minha...
Pare! Pediu o rapaz. Eu... Eu já entendi... Disse num tom tristonho. Não precisa dizer mais nada...
Marie olhou diretamente para os olhos do jovem a sua frente. Os dois orbes com íris cor de mel tinham um brilho que ela não via fazia anos.
Seus olhos... Marie murmurou. São gentis...
Hm... Ele pareceu um pouco confuso. E o que isso...?
Não sei como você veio parar aqui. Ela disse rapidamente. Não faz sentido. Todos os que caem aqui são da escória da humanidade, sabe? Pessoas cheias de inimigos ou que, então, se sumirem do mundo não vão fazer falta. Você não faz ideia de quantos ladrões, prostitutas e assassinos estão aqui... Pessoas que vivem cercadas de ódio e violência... Marie balançou a cabeça para os lados. Não sei como alguém inocente como você foi parar nesse inferno...
E eu muito menos... O rapaz bufou.
Sem dizer nada, Marie foi até um canto da sala. De lá, ela voltou com um pedaço de pão e uma garrafa de água que estava pela metade.
Tome. Ela ordenou. Você vai precisar.
O rapaz pegou o pão e a água. Sua boca estava seca. Seu estômago, roncando. Sem questionar Marie, ele deu uma mordida no pão seco e deu um gole na garrafa em seguida.
Vamos ter que pegar mais depois. Ela disse.
Mais? Ele indagou enquanto mastigava um pedaço de pão. Onde?
Lá fora. Marie apontou para a porta da cela. No meio do caos.
Caos?
É. É lá onde a maioria dos capturados ronda.
Por quê?
Porque lá é onde todos são jogados para sobreviver como animais selvagens. Também faz parte do show. Tem câmeras em todos os cantos. Nada transmitido para emissoras de TV, sabe? Uma casta especial de merdas vê essa porra doentia como se fosse um reality show. Ela bufou. Nós só estamos aqui dentro, seguros, porque eu peguei a chave para essa cela. Depois conto esse rolo. Só saiba que, trancados aqui, podemos dormir com tranquilidade.
Você que me trouxe pra cá?
Sim. Depois que te achei jogado, inconsciente, aqui por perto.
Entendi... Bem... Obrigado.
Não agradeça ainda. Apesar do tom sério, ela esboçou um sorriso. Temos que sair daqui ainda. Vai ser útil ter alguém ao meu lado.
Eu posso ajudar. O jovem disse determinado. Mas... O que você quis dizer com sobreviver lá fora? O tal de Asmodeus caça tantos de nós ao mesmo tempo?
Não. Mas, sabe, esse lugar não é bom pra sanidade. Muitos acabam surtando, atacando uns aos outros... Comendo uns aos outros... E raramente da maneira divertida.
Mas... Ele engoliu em seco, incrédulo. Você não disse que tem comida lá fora? Pão e água?
Sim. Até outras coisas. Até armas e remédios. Mas são poucos. Os Executores não trazem o suficiente para todos. Isso, é claro, também faz parte do show.
Ah... Executores? Quem... Quem são esses?
Funcionários do Asmodeus. Não sei quantos são ao todo porque todos se parecem. São uns monstros de mais de dois metros de altura. E eles também carregam alguma arma exageradamente grande. Ela fez uma breve pausa. Eles fazem as entregas de suprimentos e matam qualquer um que fique no caminho deles. Também levam as pessoas para as salas de tortura e as trazem para cá, conosco, nesse inferno.
Então... Eles entram e saem desse lugar a bel prazer? Ele tomou um grande gole de água.
Praticamente... Marie sorriu. Acho que você pensou na mesma coisa que eu.
Não parece muito prático lutar contra eles... Mas... Talvez... Possamos roubar alguma chave, não? Deve ter uma porta em algum lugar para sair daqui.
Tem sim. Sei onde fica. Mas precisamos dessa chave. Ela suspirou. Espero que você seja rápido e consiga me ajudar...
Hm... Também espero, mas... O rapaz olhou para a garrafa praticamente vazia em sua mão. Vou precisar de mais água.
Sem problema.
E algum analgésico cairia bem também.
Hm... Talvez achemos algum nos suprimentos. Mas eu nunca vi...
O rapaz andou até a porta da cela. De lá, ele apenas podia ver a parede cinzenta do outro lado do corredor. O cheiro pútrido do lugar já não o incomodava tanto mais. Calmamente, ele deu mais uma mordida no pão
Ei... Marie apoiou uma mão no ombro dele. Vamos sair daqui vivos se seguirmos o plano. Não se desespere, ok?
Edgar... Ele murmurou.
Oi...?
Edgar. Ele se voltou para ela com um sorriso sincero por entre as ataduras. Acho que esse é o meu nome...
Edgar... Ela sorriu de volta. Gostei do nome. Agora... Ela colocou uma chave na fechadura e destrancou a porta. Vamos?
Edgar assentiu. A porta foi aberta. Os dois saíram da segurança da sala e adentraram o princípio do caos. 

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