Antes que ele pudesse perceber, Marcos já estava em
Dimas.
O sol se punha no horizonte. O calor estava no limite do
suportável. A água do cantil de Marcos havia chego ao fim há mais de uma hora.
Entretanto, nada disso importava agora. O mercenário tirou o papel que receberá
ontem e o leu mais uma vez. O endereço, bem como pontos de referência, estavam
escritos nele. Montado em sua moto, não demoraria para ele chegar até a base de
Capo.
Minutos se passaram, não mais de vinte. Marcos estacionou
sua moto num beco. A luz da lua mal iluminava o lugar imerso nas sombras.
Entretanto, a porta de metal cinzenta se destacava dos tijolos escuros.
O mercenário respirou fundo. Ele se armou completamente.
O fuzil e a escopeta estavam em suas costas. O revólver e a pistola automática
estavam em seus bolsos, juntamente com mais uns punhados de munição.
Antes de se dirigir à porta, porém, Marcos se voltou para
a entrada do beco. Ele havia ouvido passos. Um homem vinha até ele.
O sujeito vestia trapos amarelados, tinha a pele coberta
por sujeira, fedia a bebida barata e tinha a barba e o cabelo compridos e
desgrenhados. Não passava de um morador de rua. Provavelmente, morava naquele
beco. Por isso, o mercenário não se importou com ele.
—
Não faça isso. — O
mendigo disso para Marcos instantes antes de ele bater na porta. — Nada de bom vai sair daí.
—
Sério? — Ele se
voltou para o estranho. —
E como você sabe disso?
—
Por que um homem mau mora aí.
—
Eu sei. E eu estou aqui para tirar a vida dele.
—
Por quê?
—
Para me trazer paz.
—
Violência não traz paz...
—
É o que veremos.
Marcos bateu na porta. Um pequeno visor se abriu.
—
Qual a senha? — Um
homem perguntou.
Marcos respondeu prontamente.
—
Certo. — O homem
destrancou a porta. Era mais um típico marginal. Talvez um pouco maior e mais
forte que os outros, mas era isso. —
Seja bem vindo. — Ele
olhou para o mendigo no beco e apontou uma pistola da direção dele. — Saia!
O mendigo correu para longe, saindo do beco.
—
Espero que ele não tenha te irritado. —
O marginal disse. —
Ele faz muito isso.
—
Não se preocupe. —
Marcos respondeu.
—
Então... Qual o seu assunto com a gente?
—
Com vocês? Não... Com o Capo.
—
Ora... — Ele cuspiu
no chão. — Veio falar
sobre o quê?
Marcos não disse mais uma palavra. Ele simplesmente sacou
seu revólver a atirou na cabeça do marginal.
Mais capangas viriam até ele agora. Marcos tinha noção
disso. Porém, ele preferia eliminar qualquer um que pudesse o atrapalhar o
quanto antes. Se tudo desse certo, o mercenário ficaria a sós com Capo no
final.
Seguindo até o fim do corredor, o caos começou. Os
capangas de Capo vieram investigar o som do tiro. Rapidamente, Marcos sacou a
escopeta e derrubou os dois primeiros.
Em seguida, a tempestade de balas teve início. Marcos se
protegia atrás de qualquer coisa, de caixotes de madeira a barris de metal,
evitando ser atingido e, ao mesmo tempo, atirando incansavelmente.
Rajadas do fuzil derrubavam inimigos rapidamente. Balas
de revólver acertavam quem tentava se esconder. Tiros de escopeta abriam um
buraco no peito daqueles que chegavam muito perto.
Não se passaram mais de cinco minutos. Mais de trinta
corpos estavam estirados no chão, jogados sobre uma poça do próprio sangue.
Marcos respirava pesadamente enquanto andava por entre os cadáveres. Agora, ele
segurava apenas o seu revólver. Aquela era a única arma que ainda tinha
munição. Duas balas. Uma para a cabeça e outra para o peito de Capo. Uma bala
pra cada pessoa que o desgraçado havia tirado dele.
O mercenário estava praticamente intacto, pelo menos,
para um conflito como aquele. A maioria dos tiros pegou de raspão nele,
causando mais danos a suas roupas do que ao seu corpo. A orelha esquerda fora
quase completamente dilacerada por um tiro. A panturrilha direita havia sido
perfurada por um tiro, porém, não mais sangrava. O mesmo podia ser dito sobre
seu ombro esquerdo. Esses foram os únicos ferimentos.
Com a adrenalina tomando conta de seu corpo, Marcos
continuou andando com passos rápidos e pesados, ignorando a dor que estava
sentido.
No fim do lance de escadarias havia uma sala. Havia
apenas uma porta. Marcos tinha certeza que era lá onde Capo estava.
Antes que ele pudesse chegar à porta, entretanto, uma mão
agarrou o ombro do mercenário. Ele se virou para encontrar o morador de rua de
antes.
—
Isso não vai te trazer paz. —
Ele disse a Marcos. —
Isso só vai lhe trazer dor...
O mercenário não disse nada. Ele simplesmente trincou os
dentes e agarrou a garganta do mendigo. Marcos viu o medo nos olhos do homem.
Também viu a vida deixar o corpo dele enquanto ele puxava o gatilho.
Com um tiro na cabeça, Marcos havia adicionado mais uma
morte a sua conta daquele dia, apesar de não ser a intenção dele. Entretanto, a
raiva havia o tomado. Ele não pensaria na morte de um inocente que nem valia
uma recompensa. Não pensaria por conta própria, pelo menos.
Havia, ainda, uma bala no revólver do mercenário. Mesmo
assim, aquilo já era mais do que o suficiente.
Marcos chutou a porta. Surpreendentemente, ela estava
aberta.
Dentro da sala, um homem loiro, de olhos verdes, trajando
um terno caro estava sentado em frente a uma mesa. Ele sorria largamente para o
visitante.
—
Então você finalmente chegou. —
Capo parecia alegre. —
Eu esperava por esse dia.
Marcos apontou o revólver para a cabeça do mafioso.
—
Nem pense em puxar esse gatilho. —
Ele riu baixo sem tirar os olhos do rosto do mercenário. — Não agora, pelo menos...
—
Você acha que tem o direito de falar algo!? —
A mão de Marcos tremia enquanto segurava o revólver. — Hein!?
—
Ora... Tenho muita coisa pra explicar. Caso contrário, essa vingança seria
muito vazia, não acha?
—
Eu só tenho que te matar. Aí eu serei vingado. Você não precisa falar nada.
—
E quem disse que eu estou me referindo a sua vingança?
—
Ah... — Marcos
parecia confuso. —
Como assim?
—
Estou me referindo a minha vingança.
—
Como!?
—
Você ouviu bem... Minha vingança.
Afinal, eu que fui traído por um amigo e a mulher que eu amava. E você foi o
fruto dessa traição. —
Ele sorriu amargamente. —
Aposto que você não sabia dessa parte, não é?
—
Ah... — Marcos não
conseguiu falar nada por alguns instantes. —
Mas, no fim, você os matou! Você teve a sua vingança! E ainda arruinou a minha
vida! Agora, é a minha vez! Eu vou ter a minha vingança! Eu...!
—
E quem disse que eu matei os seus pais? —
Capo disse rispidamente.
—
Hm...
—
Você não os viu sendo mortos. —
Ele riu. — Aliás,
você viu um deles sendo morto. O outro você apenas o ajudou a tirar a própria
vida.
—
Do que você está falando!?
—
Ora, ora... Eu não matei os seus pais. E nem você. Eu apenas os separei. Mas
você acharam que vocês estavam sozinhos no mundo. Então, cada um seguiu um
rumo. Mas vocês se viram posteriormente. Pelo menos, você viu os seus pais.
Você apenas não os reconheceu... —
Capo abriu uma gaveta da mesa e tirou três papéis de lá. Ele escolheu uma das
folhas e a entregou para Marcos. —
Veja. Eis o seu pai. Essa é a foto mais recente que consegui.
O mercenário se aproximou de Capo para pegar a folha. Ele
não abaixou seu revólver nem por um instante. Pelo menos, até olhar a imagem.
Marcos ficou boquiaberto por um instante. Em seguida, ele
trincou os dentes. A foto era de um homem com barba e cabelos grandes e
desgrenhados. Era o morador de rua que ele havia acabado de tirar a vida.
—
Você realmente quer que eu acredite nisso!? —
O mercenário bradou. —
Como...!?
—
Bem, já esperava essa reação. —
Capo o interrompeu. —
É difícil de acreditar que ele ficou louco e acabou nas ruas. E é por isso
mesmo que eu tenho que te mostrar essas outras duas folhas. — Ele separou uma das
folhas. — Pegue. Veja
sua mãe. A mulher que eu amei...
Marcos não conseguiu dizer nada. Aquilo não era mais uma
brincadeira de mau gosto. Praticamente tremendo, ele tirou os olhos da foto de
Josephine.
—
A propósito... Fui eu que gravei os nomes falsos no seu medalhão de prata. — Capo sorriu. — Afinal, você não poderia
saber o nome verdadeiro dela para isso dar certo, não é? — Ele jogou a última folha
no chão, bem aos pés de Marcos. —
Essa foto é dela... Foi tirada a poucas horas.
O mercenário soltou o revólver. Em seguida, foi ele que
caiu de joelhos. Josephine estava morta, em algum canto, com os pulsos
cortados.
—
Imagino que você tenha mostrado a foto para ela. —
Disse Capo. — Assim,
você só ajudou me ajudou. Afinal, não demorou muito para que ela tirasse a
própria vida após perceber que foi pra cama com o próprio filho. — Ele riu escandalosamente.
— Você não acha,
jovem Édipo?
Marcos gritou, tentando negar tudo. Ele colocou a cabeça
junto aos joelhos e desejou que tudo aquilo fosse apenas um pesadelo. Mas a
risada de Capo não desaparecia.
Sentindo um gosto amargo impregnado em sua boca, Marcos
levantou o rosto e pegou seu revólver de volta.
Capo sorriu enquanto viu o mercenário atirando na própria cabeça.
Agora, o mafioso havia completado a sua vingança.
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