11.
Joshua corria contra o vento gélido. As árvores a sua
volta, negras e retorcidas, o açoitavam com seus galhos que mais pareciam
garras. Cortes apareceram em seu casaco, suas calças e até em seu rosto.
Entretanto, o rapaz apenas trincou os dentes e continuou em frente, mantendo o
mesmo ritmo.
—
Joshua! — Uma voz
familiar gritou.
O jovem olhou de onde a voz vinha e parou em seguida. De
um outro caminho em meio as árvores Cristina e Richard, ambos com malas nas
costas, vinham até ele.
—
Garoto! — Ele chamou
Joshua enquanto se aproximava junto de sua esposa. — O que aconteceu? Foi puxado pra cá de
repente?
—
Hm... — O rapaz limou
a garganta. — Sim...
Quando percebi, já estava aqui...
—
Achamos que não conseguiríamos chegar a tempo... —
Cristina disse claramente preocupada.
—
E também não sabíamos se demoraríamos para te encontrar. — Acrescentou Richard. — Por sorte, não levou nem
um minuto... Ou mais. Não sei. Tempo é um conceito abstrato aqui...
—
Por sorte, não demorou muito para acharmos o livro. — Cristina explicou. — Quando percebemos que você tinha
desaparecido, tentamos fazer tudo o mais rápido possível... E deu tudo certo
felizmente.
Joshua olhava para o rosto dos dois. Richard estava
confiante e, aparentemente, contente por ver o rapaz. Cristina, mais emocional,
parecia estar quase chorando de felicidade por ele estar vivo.
Entretanto, era difícil confiar em qualquer coisa em
Gehenna.
Joshua sabia que poderia estar sendo caçado por monstros
que ele ainda não havia visto. Será que eles poderiam se transformar em pessoas
que ele conhecia? Ou será que eles apenas teriam matado o casal e assumido suas
formas?
Joshua abaixou a cabeça e deu um passo para trás.
—
Ah... Garoto? —
Richard o chamou. —
Algo errado?
—
Hm... — Ele sentiu um
nó se formando na garganta. —
Eu... — O garoto
olhou para o casal, tentando disfarçar seu medo. —
Eu não posso confiar em vocês?
—
O quê!? — Richard
parecia ofendido.
—
Mas por quê...!? —
Cristina indagou alarmada.
Mais um grito estridente veio da mansão. O casal olhou na
direção da construção colossal. Enquanto isso, mais um calafrio percorreu a
espinha de Joshua que, agora, já suava frio.
—
Desculpem-me... — O
rapaz murmurou.
Rapidamente, ele deu as costas para os dois e voltou a
correr.
Entretanto, Joshua não deu mais do que dez passos para
frente antes de parar. O som do tiro veio rapidamente. No chão a sua frente,
agora, havia um buraco causado por uma bala.
O rapaz olhou para trás. Cristina parecia um pouco
surpresa. Richard, pó outro lado, parecia ainda mais calmo com o revólver
prateado na mão direita. Um leve fio de fumaça cinza saia do fim do cano da
arma.
—
Se eu realmente te quisesse te matar, já teria o feito. — Richard disse secamente. — Por isso, tenha certeza
de que eu sou o mesmo homem que queria te ajudar antes de vir para cá, certo?
Não sou nenhum monstro covarde que não mostra a verdadeira face.
—
Principalmente por que um monstro teria queimado só de tocar nessa arma. — Acrescentou Cristina com
um sorriso. — Armas
de prata abençoada fazem parte dos exorcismos, sabe? Dos casos mais extremos,
pelo menos...
—
Olha, sabemos que você está nervoso com... Bem, com tudo. — Ele disse ao garoto
soando, agora, um pouco mais empático. —
Mas confie em nós, ok? Você não conseguirá sair vivo daqui sozinho. E, até onde
sabemos, você planeja salvar a sua Adriana, não é?
—
Hm... — Joshua
suspirou. — É...
—
Então você vai ter que confiar em nós. —
Cristina disse docemente. —
Nós estamos nos arriscando por você, não é? —
O casal andou calmamente até o jovem. Ela, então, segurou as mãos de Joshua com
delicadeza. —
Então... Confie em nós, por favor.
Joshua não conseguia olhar nos olhos dos dois. Ele pensou
por alguns instantes de silêncio que, repentinamente, foram quebrados por mais
um grito vindo da mansão.
O ar parecia mais gelado. O rapaz tremeu mais uma vez.
Ele não conseguia parar de pensar em Adriana.
—
Certo... — Joshua
levantou a cabeça, olhou para os dois e, por fim, esboçou um sorriso. — Vamos. Eu tenho um
resgate a fazer.
Sorrindo, o casal assentiu.
Rapidamente, os três correram até a mansão, atravessando
o portão de barras de metal negro e seguindo, agora uma pequena trilha de terra
por entre um jardim repleto de flores púrpuras e pretas. O perfume do local era
extremamente doce, quase nauseante. Entretanto, estava longe do cheiro pútrido que
o rapaz imaginara.
Vários pensamentos rondavam a mente de Joshua.
Entretanto, ele tentava não pensar. Perder o foco não era uma opção.
Agora, em frente à gigantesca porta de carvalho da
mansão, um mau pressentimento atingiu Joshua. Entretanto, aquilo não o impediu
de tocar a maçaneta prateada que, instantaneamente, girou.
—
Fantástico... —
Murmurou Richard enquanto a porta se abria.
A frente do trio, a escuridão os aguardava.
— Vamos. — Joshua disse determinado.
Os
três entraram na mansão. Cristina sacou uma lanterna de sua mala. Mesmo assim,
pouco era visível. Pelo eco que seus passos produziam, entretanto, era possível
determinar que a sala onde estavam era de um tamanho considerável. Fora isso, apenas
a umidade e o cheiro de mofo poderiam ser notados.
Entretanto,
mais um grito de Adriana veio ecoando pela sala e, e um instante, todo o local
havia sido iluminado, quase como se o próprio estivesse emitindo cor.
Agora,
o trio olhava boquiaberto para o lugar que mais parecia ser o interior de um
templo antigo. As paredes, chão, teto e colunas de sustentação pareciam ser feitos
de mármore.
Entretanto,
o lugar estava em ruínas. Detritos bloqueavam todas as passagens laterais e,
também, acumulavam-se no piso, aleatoriamente, criando praticamente um
labirinto de entulho. Partes das paredes e teto haviam caído há muito tempo.
Algumas das próprias colunas não estavam mais inteiras. Com rachaduras marcando
toda a paisagem, a sala parecia que iria se desfazer a qualquer instante.
No
final do salão, o caminho se estreitava. Havia apenas uma passagem lá: uma
porta aberta que seguia até uma escadaria. De lá, mais um grito de Adriana
veio.
— Bem... — Richard respirou fundo, segurando o revólver
em sua mão com força. — Creio que
todos já sabemos por onde devemos ir...
Tentando
manter a calma, o trio caminhou pelo labirinto de detritos. Richard seguia na
frente, seguido por Cristina e, por fim, Joshua.
O
rapaz ficou ainda mais nervoso de repente. Ele não mais ouvia os gritos de
Adriana. Era estranho, mas, no final, os berros agoniados dela era o que dava certeza
a Joshua que ela ainda estava viva.
Será
que Adriana não havia resistido? Será que ela havia, enfim, morrido?
Joshua
não queria pensar naquilo. Ele não queria que sua amada sofresse, mas ele
também não queria que todo seu esforço fosse em vão.
— Eu ainda estou
com um mau pressentimento... — Cristina
murmurou.
Joshua
percebeu que, agora, eles já haviam atravessado o labirinto. O trio estava em
frente à passagem que levava à escadaria.
— Pessoalmente,
eu estou com um mau pressentimento desde que viemos aqui... — Richard trincou os dentes. — Mas...
Ele
parou de falar. A atenção de todos se voltou para os passos que vinham de cima
deles, como se alguém, ou algo, extremamente pesado caminhasse no andar
superior. Estranhamente, não havia um andar superior, ao menos, não antes do teto
que parecia ter mais de cinco metros de altura.
— De onde isso
está vindo...? — Joshua
indagou.
De
repente, os três perceberam ao mesmo tempo. Havia um buraco acima deles,
praticamente rente ao teto. De lá, uma forma cinzenta pulou.
Rapidamente,
o gigante aterrissou entre o trio e a porta aberta, causando um pequeno tremor.
Antes
que eles pudessem reagir, Behemoth sacou a arma que estava pendurada com
algumas cordas em suas costas.
Com
um golpe certeiro, o maníaco atacou com o que mais parecia ser um martelo de
guerra medieval, esmagando a cabeça de Richard e parte da parede atrás dele.
Cristina
olhava praticamente paralisada na direção de seu, agora, falecido marido.
Joshua,
entretanto, não conseguia tirar os olhos do monstro e a arma que ele carregava,
tão cinzenta e brutal quanto o próprio dono.
— Olá,
Coelhinho... — Behemoth abriu
um largo sorriso. — Eu disse que
ia trazer um martelo pra próxima vez que nos encontrássemos, não foi?
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