domingo, 19 de julho de 2015

Godsbane, Capítulo 3

Origem


Imagens começaram a vir até a mente de Damian. Em pouco tempo, elas pareciam reais a ponto de ele poder tocá-las.
O guerreiro viu a si mesmo. Isso é, aquele que ele via era Damian, porém, cinco anos mais jovem. Aos dezesseis anos de idade, ele não sabia o quão cruel seria seu destino.
Naquela época, Damian imaginava que todo o seu sofrimento havia sido deixado para trás há anos.
A guerra havia ceifado a vida de toda a família do guerreiro. Aos seis anos de idade, ele se viu andando por entre as ruínas de sua cidade.
O céu azul havia se tornado cinza. As plantações haviam sido queimadas. As casas foram demolidas e ainda ardiam com chamas vermelhas.
Vestindo roupas esfarrapadas, o garoto tentava não chorar. A cada passo que ele dava, Damian via um de seus amigos e parentes mortos.
Sem seus pais, o garoto de seis anos estava confuso.
Não demorou para que o menino caísse de joelhos, completamente desamparado.
Isso é, até aquele homem vir.
Um guerreiro estendeu a mão para o pobre Damian. Com um sorriso no rosto, Sebastian prometeu que ele seria salvo.
Os próximos dez anos pareceram passar rapidamente.
Criado por Sebastian e sua esposa, Caroline, Damian se tornou um guerreiro como poucos.
Agora, aos dezesseis anos de idade, o jovem poderia lutar ao lado daquele quem ele aprendeu a chamar de “pai”.
Usando uma armadura muito mais simples do que aos vinte e um anos de vida, feita de ferro e couro, Damian saia de casa. Seu rosto tinha uma expressão confiante e cheia de vida. Seus olhos brilhavam como se ele acreditasse em um futuro melhor.
Com um abraço apertado, ele se despediu de uma mulher com cabelos pretos presos em um coque, roupas simples e olhos castanhos ternos. Com pouco mais de um metro e sessenta e cinco de altura e o rosto sereno, ela não parecia ter a idade que tinha. Aos trinta e um anos de idade, aquela era Caroline, a pessoa que o chamava de filho com um sorriso no rosto.
Ao lado de Damian estava um homem. Com um metro e noventa de altura, ele trajava uma armadura similar a do jovem. Com uma espada de aço embainhada do lado esquerdo da cintura e um escudo de ferro nas costas, o sujeito já era um guerreiro experiente. O cabelo loiro curto e o cavanhaque no rosto eram acompanhados por uma cicatriz em cima da sobrancelha esquerda, outra na bochecha direita e, é claro, seus olhos azuis confiantes. Aos vinte e nove anos de idade, aquele era Sebastian.
Damian pegou sua espada. Na época, era uma arma grande e grosseira. A princípio, parecia pesada demais para o jovem. Entretanto, em batalha, ele se mostrava ser um guerreiro excepcional, sabendo usar o peso e o comprimento da arma ao seu favor em cada ataque desferido.
Com mais um abraço em cada um, Caroline disse adeus. Porém, ela pediu para que os dois prometessem voltar. Como sempre, Damian e Sebastian sorriram e, sem hesitar, prometeram voltar sãos e salvos.
As imagens se desfizeram e, rapidamente, outras surgiram.
Damian estava, agora, na frente de um templo em ruínas. Sebastian estava bem ao seu lado. Mais de trinta guerreiros estavam atrás dos dois.
Aquela não era a primeira missão de Damian. Porém, era a primeira do gênero.
Não era sempre que uma tropa do exército das Terras Verdes era mandada em uma busca como aquelas. Entretanto, a ligação daquele povo com a magia era forte e, também, antiga. Séculos, talvez milênios atrás, seus antepassados já conjuravam feitiços com maestria.
Com o tempo, porém, parte do conhecimento foi perdido. E eram assim que essas missões surgiam.
Quando alguma pista surgia, soldados das Terras Verdes iam atrás de algum artefato ou pergaminho mágico esquecido. Era algo relativamente raro. Por isso, tais missões eram confiadas somente a poucos. E Sebastian era bem respeitado a esse ponto.
Nada de muito perigoso deveria estar à espera da tropa. O povo antigo que construiu aquele templo queria compartilhar seu conhecimento, em especial com seus sucessores. Não havia sentido protegê-lo com alguma armadilha, principalmente por que os outros povos não conseguiriam achar aquele lugar.
Não consegue mesmo sentir? Perguntou Sebastian.
Damian balançou a cabeça em uma negativa.
Sebastian bufou e disse:
Você ainda tem que melhorar nessa parte. E muito.
Eu já sou bom o suficiente com uma espada. Damian retrucou.
E é exatamente por isso que você é previsível. Sebastian afirmou. Não estou pedindo para que você invoque uma tempestade ou bolas de fogo. Muito menos peço para que você pegue uma varinha e coloque um vestido. Mas saber pressentir a magia ao seu redor pode ser muito útil. E saber usá-la pode te fortalecer, te deixar mais ágil ou até mesmo curar seus ferimentos. Você sabe muito bem disso.
Damian manteve-se em silêncio, olhando para baixo. Ele já havia tentado dominar, pelo menos, o básico de magia, mas nunca tinha sucesso.
Senhor. Um dos guerreiros se dirigiu a Sebastian. Estamos todos prontos.
Ótimo. Ele esboçou um sorriso. Vamos.
Os soldados começaram a se dirigir para a entrada do templo subterrâneo. Sebastian os liderava. Damian ficou um pouco para trás, pensativo.
Agora, mais do que nunca, a voz de um dos guerreiros era nítida em sua mente:
Tenho um mau pressentimento sobre isso. A magia esta forte no ar, densa como uma névoa.
  Besteira. Disse uma guerreira.
Você está exagerando. Acrescentou um soldado.
Damian, agora, sabia que aquilo não era exagero.
O jovem encarava a porta do templo. Ele não queria entrar. Mas ele tinha que seguir Sebastian. Ele tinha que prosseguir com a missão. E, principalmente, aquilo era um sonho que recapitulava seu passado. Não havia nada a ser feito a não ser assistir aquilo.
As imagens se desfizeram. Era chegada a hora dos momentos mais angustiantes daquela dia virem.
Damian podia ver a si mesmo se aproximando da parte mais profunda do templo. Lá, ele estava à beira do desespero. Criaturas feitas de sombras o atacavam impiedosamente. Seus membros se alongavam em armas. Uns pareciam atacar com espadas. Outros usavam lanças. Alguns atirar flechas e até conjurar feitiços.
Com poucos ataques, Damian conseguia derrotar os adversários. Porém, isso não o deixava mais confortável. Os corredores de pedra estavam iluminados por uma luz vermelha sobrenatural. O som dos gritos das criaturas o deixava tonto. Os golpes de seus adversários eram tão fortes quanto os seus. Chamas negras e longos braços afiados o atacavam. Sua armadura tinha dezenas de arranhões. Parte do peitoral havia sido destruído. Seus braços tinham queimaduras leves. O desespero estava estampado em sua face encharcada de suor.
O cenário foi ficando cada vez mais caótico. Damian percebeu que as criaturas de sombras também atacavam umas as outras. A cada instante que passava, todos pareciam ficar mais agressivos. Isso incluía o jovem guerreiro.
Seus ataques se tornavam cada vez menos precisos e desgastantes para si. Sua respiração estava ofegante. Sua visão estava ficando turva.
Damian mal conseguia pensar. Aquilo havia acontecido tão de repente.
Paredes haviam se levantado. Portas foram trancadas misteriosamente. O fogo das tochas havia se extinguido abruptamente. Tudo havia acontecido para separar os soldados uns dos outros.
Porém, o desespero não havia sido o suficiente para derrubar Damian. Ele seguia em frente, derrotando toda criatura que surgia em seu caminho.
Entretanto, o jovem guerreiro não sabia para onde ele estava indo. Ele seguia praticamente cambaleando pelos corredores, apoiando-se nas paredes, torcendo para que o mundo a sua volta parasse de girar.
Damian não sabia quanto tempo havia se passado. Porém, agora, ele havia chego a uma sala diferente das outras.
O salão era gigantesco. O teto estava a quase cinco metros do chão. E, do outro lado da sala, havia uma porta aberta. Nela, uma criatura diferente das anteriores entrou.
Ela era bem mais alta que as anteriores, com quase dois metros de altura. Sua forma era mais sólida do que a das outras. Seus músculos eram bem definidos. A cabeça parecia uma caveira com longos chifres pontiagudos nas laterais. O braço esquerdo tinha uma longa placa presa a ele, como um escudo. O direito se estendia por mais um metro, tocando o chão, tendo uma extremidade afiada como uma espada.
A criatura rugiu e avançou contra Damian. Com um brado, o jovem correu contra o oponente.
A lâmina do monstro desceu contra a cabeça do guerreiro. Rapidamente, ele bloqueou o ataque com sua espada na horizontal. Ferozmente, a criatura repetiu os ataques.
Uma. Duas. Três vezes mais o monstro atacou Damian. O jovem nada fez a não ser bloquear os golpes. Ele estava esperando uma brecha para contra atacar. Afinal, seu oponente era muito mais rápido que ele. Desferir ataques desesperadamente não funcionaria agora.
A espada da criatura veio, agora, da esquerda para a direita. Em seguida, da direita para esquerda. Damian apenas recuava, desviando dos ataques.
A criatura rugiu. Rapidamente, ela atacou de cima para baixo com sua espada. Com um giro veloz para a esquerda, Damian esquivou do golpe.
Desta vez, porém, o monstro foi imprudente. Seu ataque o deixou desprotegido.
O jovem guerreiro não perdeu a oportunidade. Com um rápido golpe da esquerda para a direita, ele atingiu o monstro.
Damian sentiu sua espada atravessar a pele da criatura que era dura como metal. Sua lâmina deixou uma marca escarlate no monstro por onde sangue começou a verter.
Um rugido ainda mais pavoroso que o de antes. Com isso, a criatura avançou novamente.
Como antes, o monstro optou por atacar de cima para baixo. Damian usou a mesma defesa para bloquear o golpe.
O jovem olhou de relance para seu adversário. A criatura parecia estar ficando cansada. Sangue ainda vertia por sua ferida.
Damian percebeu que, caso as coisas continuassem daquele jeito, ele poderia vencer.
O monstro atacou novamente da mesma maneira. Damian defendeu, sentindo seus braços doerem. Porém, ele viu uma nova oportunidade.
Com a espada ainda bloqueando o ataque anterior de seu inimigo, o jovem resolveu golpear monstro de outra forma.
Com toda a força que ele tinha, Damian chutou o abdômen da criatura, diretamente na ferida que ele havia causado.
O monstro rugiu e caiu ajoelhado.
Rapidamente, o guerreiro atacou. Sua lâmina desceu contra a cabeça da criatura.
Em um instante, o braço esquerdo do monstro surgiu na frente da espada de Damian, bloqueando o ataque.
O guerreiro olhou rapidamente para o braço direito de seu oponente. A criatura iria golpeá-lo com sua lâmina.
Damian trincou os dentes e, em seguida, bradou.
O mais rápido que ele pôde, o jovem guerreiro atacou. Seu joelho direito atingiu o queixo do monstro, atordoando-o e fazendo-o perder o equilíbrio, caindo para trás.
Damian respirou fundo.
A sua frente, a criatura estava caída com o corpo estirado no chão.
O guerreiro sabia que só tinha uma oportunidade. Afinal, ele não teria mais forças para um próximo ataque.
Com toda a força que ele pode reunir, Damian gritou e atacou.
Sua espada atravessou o abdômen da criatura, fincando-a no chão.
A respiração do guerreiro estava ofegante. Trêmulo, Damian se apoiou em sua espada.
Aos poucos, as trevas do monstro foram se dissipando.
A vista cansada do guerreiro não conseguia enxergar direito o que acontecia.
Suas pálpebras pesavam.
A criatura foi se desfazendo, deixando, no lugar, um homem.
O guerreiro não queria acreditar em seus olhos.

Atônito, Damian viu sua espada cravada no peito de Sebastian.

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