domingo, 26 de abril de 2015

A Queda, Capítulo 5

Alfa


Com as mãos próximas da extremidade irregular do cajado, rapidamente, o Mago atacou o oponente que estava no ar. A arma, que emanava chamas, acertou a lateral esquerda da face do Lobo Alfa em um golpe horizontal vindo da direita para a esquerda. O impacto lançou a criatura pouco mais de um metro para trás. Entretanto, o golpe parecia não ter afetado o animal. Rosnando e exibindo ameaçadoramente as presas, o lobo parecia estar apenas irritado.
Enquanto isso, Overseer tinha três oponentes para enfrentar. Entretanto, por mais habilidoso que o líder mercenário fosse, ele sabia que não era mais o mesmo de outrora. Os anos haviam o enfraquecido, tirando sua agilidade, tanto física tanto mental. A experiência que ele havia ganhado com os anos, entretanto, era essencial para poder liderar aquele clã. Sua sabedoria, somada ao seu carisma e senso de justiça, o tornavam um grande líder. Overseer, bem como todos os outros que o conheciam, sabiam disso. E é exatamente por ser sábio que ele tinha que reconhecer que aquela luta podia ser desafiadora. Aqueles animais eram muito mais ágeis que ele. Felizmente, um deles estava imobilizado, com as patas congeladas no chão. As outras duas feras já não estavam em condições plenas para lutar. Isso tudo graças ao Mago. Overseer sabia que o contratante não havia feito aquilo para se exibir. Aquele não combinava como Mago. Enfraquecer as feras para ajudar o aliado, permitindo que esse aliado pudesse parecer forte nos olhos daqueles que o respeitavam. Aquilo parecia algo do feitio do Mago.
Tendo isso em mente e um sorriso no rosto, Overseer apontou sua refinada espada prateada na direção das feras a sua frente. Rosnando, os lobos aceitaram o desafio. Um deles avançou pela frente. O outro, entretanto, seguia mais rapidamente por uma trajetória curva. Overseer entendia aquela estratégia perfeitamente. As feras esperavam que ele permanecesse imóvel, pronto para um contra-ataque. E era aquilo o que o líder mercenário faria, já que não tinha chance de vencê-las sendo mais ágil. Porém, Overseer sabia o que aconteceria com ele se ele permanecesse parado. As velocidades das criaturas eram diferentes, entretanto, também eram as distâncias que elas percorriam. Assim, em determinado instante, ambas atacariam simultaneamente. Um lobo o flanquearia enquanto o outro desferiria um ataque frontal. Prevendo a estratégia de seus oponentes, então, Overseer sorriu calmamente e, o mais rapidamente possível, avançou em linha reta.
Aquilo fez com que o lobo a frente do mercenário fosse obrigado a antecipar o seu ataque, exatamente como ele previu. Com um movimento rápido, Overseer brandiu sua espada para frente, fazendo com que a fera, ao pular, fosse de encontro contra a lâmina. Assim, a arma nas mãos do mercenário entrasse na boca da criatura e, por fim, atravessasse seu crânio. Quanto à outra criatura, ela agora avançava contra Overseer, ainda pela lateral. A espada do mercenário ainda estava cravada no outro animal, mas ele sabia que aquilo não seria problema. Overseer trouxe o corpo da fera morta para perto. Com a mão esquerda, ele segurava o animal. Com a direita, a arma. O lobo avançava ferozmente contra ele. Então, em um momento, tudo acabou. A fera pulou contra o mercenário que, em um instante, conseguiu retirar a lâmina, com força, do crânio da criatura morta e, no mesmo movimento, golpear o animal que o atacaria em pleno ar, sem mesmo olhar para o lobo, decapitando-o.
Enquanto isso, o Mago ainda travava o seu duelo contra o Lobo Alfa. Desviar das investidas do animal e, em seguida, atacar com golpes rápidos com o cajado normalmente era uma estratégia eficaz, gastando o mínimo de energia possível e conseguindo, sem muito esforço, nocautear o adversário. Tais habilidades estavam muito além da maioria dos magos, conhecidos pela sua força mental, e não física. Entretanto, o Mago manipulava fogo, gelo e eletricidade com maestria. Isso, sem dúvida, o tornava membro de uma categoria rara de pessoas, tendo grande força e agilidade não só física, mas como também mental. Porém, nada parecia ser capaz de matar o Lobo Alfa.
O Mago precisava derrotar logo o seu adversário. Ele, bem como boa parte de seu povo, tinha certo conhecimento sobre animais. Para o Mago era uma hipótese plausível que, uma vez que o Lobo Alfa fosse derrotado, os demais lobos desistiriam de atacar suas presas e, então, fugiriam. Por isso, os mercenários dependeriam dele naquele momento, pois, ele tinha certeza que mais feras surgiriam enquanto o líder delas ainda estivesse de pé.
Entre esquivas e golpes com o cajado, o Mago já havia lançado de bolas de fogo a raios a correntes de ar gélidas contra o oponente. A criatura, entretanto, não parecia se abalar. Nenhum dos elementos que o Mago manejava tão bem parecia funcionar contra a fera. Era quase como se a pelagem cor de grafite do animal o tornasse imune a tudo aquilo. E, para agravar a situação, a cada segundo que se passava, o Mago ficava mais e mais cansado. A exaustão causada pelo desgaste físico, lutando com o cajado, e espiritual, usando magia, faria com que ele fosse eventualmente atingido pela criatura. Embora ofegante, o Mago não desistiria. Ele sabia como ganhar aquela luta. Porém, ele esperava não ter que chegar a fazer aquilo.
A tribo a qual o Mago pertencia tinha muitos costumes e tradições consideradas, no mínimo, estranhas para o resto do mundo. O contato com a natureza e o talento natural de manejar alguns elementos com magia era, sem dúvida, algo fora do normal para aquelas que eram de outros povos. Entretanto, talvez o que causasse mais estranhamento para os forasteiros fosse o que os membros da tribo não faziam. Afinal, eles eram extremamente poderosos. A manipulação de magia somada ao conhecimento do inimaginável eram ferramentas poderosas. Assim, eles poderiam se firmar, sem muitos problemas, como os governantes do mundo. No entanto, eles se contentavam em manter pequenos grupos pacíficos espalhados pelo mundo, sem construir castelos e exércitos como os outros faziam. Isso tudo por causa dos ensinamentos que eram passados de geração em geração. Assim sendo, eles tinham certas proibições. Portanto, essa era a justificativa, por mais que não muito profunda, para eles, por exemplo, não usaram os cristais e, na maioria dos casos, evitarem matar outros seres vivos. Naquela situação, o Mago não deveria matar o Lobo Alfa. Afinal, ele era apenas um animal. Caso não fosse se alimentar da carne do animal ou usar sua pele para algo útil, o Mago deveria apenas o nocautear o lobo. Entretanto, o jeito não letal não estava funcionando. Se o Mago não matasse a criatura, ele seria morto por ela. Após respirar fundo, o homem em frente à fera refletiu sobre aquilo. Uma vez que ele já estava desrespeitando algumas regras de seu povo, como entrar naquelas ruínas e se aliar a mercenários que usavam discriminadamente os cristais, o Mago concluiu que matar aquele lobo seria algo quase trivial. Assim, ele avançou contra a fera.
O cajado nas mãos do Mago brilhava. O tom vermelho da arma bruxuleava. O Lobo Alfa rosnava, preparando-se para contra-atacar. Entretanto, a fera não tinha como imaginar a magnitude do próximo ataque que estava por vir. Ao apontar o cajado na direção da criatura, chamas surgiram. Entretanto, não foi um simples ataque. A magia era contínua. Ininterruptamente, chamas surgiam e se dissipavam da extremidade irregular do cajado. O fogo, como previsto, não causava danos à fera. Entretanto, o calor gerado pela magia incomodava o animal, fazendo-o recuar lentamente. E era exatamente isso o que o Mago queria. Mudando seu cajado para o normal, ele atacou. O primeiro golpe veio da esquerda para a direita, acertando o lado direito da face da fera. Em seguida, com um movimento rápido, o Mago atacou com o movimento oposto o outro lado da face da criatura. Aqueles dois golpes foram o suficiente para aturdir ligeiramente o Lobo Alfa. Assim, o Mago conseguiu uma brecha para mais um ataque. Virando de costas, tornando-se extremamente exposto por alguns instantes, ele atacou a fera com a extremidade regular do cajado. Como uma estocada, ele acertou a criatura exatamente entre os olhos. Agora, a criatura estava claramente desorientada. O Mago se voltou, novamente, para frente. Com um salto frontal, ele aterrissou com a extremidade regular do cajado no topo da cabeça do Lobo Alfa, batendo-a contra o chão. O Mago não tinha mais como recuar agora. Com o pé direito, ele pisou em cima da cabeça do Lobo Alfa, segurando-o contra o piso metálico. Enquanto o animal rosnava, tentando se levantar, o Mago girou o cajado no ar enquanto a arma mudava de cor. O poder do gelo emanava agora da haste em suas mãos. O Mago, agora, segurava alto o cajado. A extremidade irregular apontava para baixo. O centro da arma estava bem diante de seus olhos, cerca de três centímetros de distância de seu nariz. Então, em um instante, o Mago atacou para baixo. Em uma fração de segundos, uma lâmina, afiada como a de uma adaga, surgiu na extremidade irregular do cajado. Assim, a arma se tornou uma lança, com uma ponta feita de gelo, e, então, cravou-se na nuca do Lobo Alfa.
Enfim, a criatura foi morta.
O Mago respirou fundo, acalmando-se, e, por fim, ele olhou a sua volta.
Os mercenários já haviam derrotado vários daqueles animais e, entretanto, mais pareciam surgir. Entretanto, tudo acabou naquele momento.
No momento em que o Lobo Alfa morreu, ele emitiu um último som. Parecia um uivo baixo e grave. Porém, aquele ruído silencioso parecia ter se espalhado pelo campo de batalha.
Em um instante, todos os lobos remanescentes tiveram a sua atenção voltada para o seu líder caído. Era como se fosse uma última ordem do Lobo Alfa. E seus subordinados a obedeceram. Rapidamente, eles se dispersaram, fugindo do local, correndo para ruas e becos.
Naquele momento, todos os mercenários se entreolharam. E seguida, seus olhos se voltaram na direção do Mago. Ninguém precisava dizer nada. Estavam todos cansados naquele instante e, ao mesmo tempo aliviados. Todos haviam sobrevivido. Ninguém estava ferido. Aquilo já era motivo suficiente para celebrarem. Então, Overseer disse, em alto e bom som:
Nada mal. Nada mal mesmo... Ele riu baixo. Eu diria que merecemos uma pausa.

Ninguém questionou. Ao ouvirem aquelas palavras, o corpo de todos os dez parecia ter amolecido. No segundo seguinte, todos estavam sentados ou deitados no chão. Alguns resolveram se apoiar em alguma parede. O chão gélido de metal azulado parecia, de repente, extremamente confortável.

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